A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga os ataques do dia 8 de janeiro foi retomada nesta terça-feira (11) com o depoimento do tenente-coronel do Exército Mauro César Barbosa Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro durante seu mandato.
Apesar de afirmar que permaneceria em silêncio durante a CPMI, ele argumentou que não participava das atividades relacionadas à administração pública, nem questionava Bolsonaro sobre o que era discutido em reuniões e encontros com autoridades dos poderes Executivo, Judiciário e Legislativo.
“Na prática, a função do ajudante de ordem consistia, basicamente, em um serviço de secretariado executivo do ex-presidente”, explicou Cid.
Segundo ele, embora próximo ao ex-presidente, apenas recepcionava os convidados e os direcionava ao local desejado, ficando do lado de fora das salas de reunião.
Ingerência política
Cid ainda garantiu que, em 2019, assumiu a chefia da Ajudância de Ordem da Presidência da República por indicação do Comando do Exército e que sua nomeação não teve nenhuma ingerência política.
Também elencou tarefas de que foi incumbido durante os quatro anos em que serviu ao ex-mandatário.
“Execução da agenda; recepção e encaminhamento de pessoas para reuniões; atendimento de ligações e recebimento de correspondências; impressão de documentos; recebimento e entrega de presentes e auxiliar nas atividades particulares e privadas do ex-presidente – almoços, viagens, finanças pessoais etc”, citou o militar.
A sessão estava prevista para a última terça-feira (4), mas foi adiada devido ao calendário de votações na Câmara dos Deputados, cuja comissão é composta tanto de deputados quanto de senadores.
Assista ao vivo
Por decisão da ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), em pedido de habeas corpus da defesa do investigado, Cid era obrigado a comparecer à comissão, mas com o direito de ficar em silêncio diante de perguntas que possam incriminá-lo. Além disso, pode ser acompanhado por advogado.
Cid é apontado como um dos articuladores de uma conspiração para reverter o resultado eleitoral do ano passado, inclusive com planos de uma intervenção no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). De acordo com investigações da Polícia Federal, mensagens capturadas com autorização judicial após apreensão do celular de Cid evidenciam que ele reuniu documentos para dar suporte jurídico à execução de um golpe de Estado.
O ex-ajudante de ordens está detido desde 3 de maio, acusado de ter fraudado cartões de vacinação contra a Covid-19, incluindo o de Bolsonaro e parentes do ex-presidente. Em seu telefone celular, peritos da Polícia Federal (PF) encontraram mensagens que ele trocou com outros militares e que, segundo deputados federais e senadores que integram a chamada CPMI do 8 de janeiro, reforçam a tese de que o grupo tramava um golpe.
Relatório de investigação produzido pela Polícia Federal informa que as mensagens mostram Cid reunindo documentos para dar suporte jurídico à execução de um golpe de Estado. Nelas, o militar teria compartilhado um documento com instruções para declaração de Estado de Sítio diante de "decisões inconstitucionais do STF".
“O investigado compilou estudos que tratam da atuação das Forças Armadas para Garantia dos Poderes Constitucionais e GLO. Os documentos tratam da possibilidade do emprego das Forças Armadas, em caráter excepcional, destinado a assegurar o funcionamento independente e harmônico dos Poderes da União, por meio de determinação do Presidente da República”, diz o relatório.
Mensagens defendiam suspensão de direitos constitucionais
As mensagens de teor considerado golpista foram tornadas públicas pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF. Elas indicam que os proponentes da intervenção defendiam a suspensão temporária de direitos constitucionais; o possível afastamento de ministros do TSE e a convocação de um novo pleito para escolha do futuro presidente.
Entre os interlocutores de Cid estava o coronel Jean Lawand Junior, que já depôs à CPMI e nega as acusações. Cid também já deveria ter se apresentado perante a comissão, mas como a reunião do colegiado do último dia 4 teve que ser adiada devido a votações na Câmara dos Deputados, a data do depoimento acabou sendo transferida para esta terça.
Atos de 8 de janeiro
Instalada no fim de maio, a CPMI foi criada para investigar os atos antidemocráticos de 8 de janeiro deste ano, quando grupos invadiram e depredaram as dependências do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e a sede do STF, destruindo o patrimônio público e agredindo policiais e jornalistas.
Composta por 32 parlamentares, sendo 16 senadores e 16 deputados federais titulares e seus respectivos suplentes, a comissão terá 180 dias para investigar os atos de ação e omissão ocorridos nas sedes dos três Poderes e que culminaram na prisão de mais de 300 pessoas, entre eles o ex-secretário de segurança pública do Distrito Federal e ex-ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Bolsonaro, Anderson Torres.