Comissão de Anistia aprova pedido de perdão inédito por violações da ditadura contra indígenas

Órgão pediu desculpa formal aos povos krenak e guarani-kaiowá em nome do Estado brasileiro

De forma inédita, a Comissão de Anistia aprovou, nesta terça-feira (2), um pedido de reparação coletiva por violações aos direitos de comunidades indígenas durante a ditadura militar (1964-1985). Os requerimentos dos povos krenak e guarani-kaiowá tornaram-se os primeiros a serem julgados nesse sentido pelo órgão.

Os membros do colegiado consentiram um pedido de desculpas formal em nome do Estado brasileiro, reconhecendo as consequências da ação e omissão estatal contra membros das etnias krenak e guarani-kaiowá. Na sessão, o órgão também aprovou uma série de recomendações a serem implementadas por órgãos públicos a fim de evitar que os fatos se repitam.

No ano passado, o conselho aprovou mudanças no regimento interno, possibilitando a apresentação de requerimentos coletivos de anistia, como as situações julgadas nesta segunda-feira (2). Nesses casos, o reconhecimento dos pedidos de anistia não prevê reparação econômica.

Ao final de cada análise no julgamento, a presidente do órgão, a advogada Enéa de Stutz e Almeida, ajoelhou-se diante de representantes das comunidades para reafirmar o resultado. “Debatemos muito e concluímos, com a ajuda de muita gente para além do conselho da comissão, que, em relação aos povos indígenas, por exemplo, não faz muito sentido o requerimento individual. O que faz sentido para essas comunidades é exatamente a reparação coletiva”, explicou.

VIOLAÇÕES NA DITADURA

Vinculada ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, a Comissão de Anistia é responsável por analisar os processos de anistia motivados por perseguição política estatal entre setembro de 1946 e outubro de 1988.

Nos requerimentos apresentados à comissão, o Ministério Público Federal (MPF) sustenta que, entre 1957 e 1980, os povos indígenas em geral, e não só as comunidades krenak e guarani-kaiowá, foram alvo da intervenção governamental e empresarial em seus territórios, o que resultou em mortes, violações à integridade física e profunda desintegração de seus modos de vida tradicionais.

Em 2014, a Comissão Nacional da Verdade concluiu o relatório sobre seus dois anos e sete meses de investigações sobre violações de direitos humanos cometidas durante o período da última ditadura civil-militar brasileira, apontando que ao menos 8.350 indígenas foram assassinados e tantos outros sofreram violências e abusos de toda ordem.

Além disso, já em 1968, um extenso documento, o chamado Relatório Figueiredo, elaborado a pedido do extinto Ministério do Interior, do governo militar, apontava uma série de crimes bárbaros cometidos contra os povos indígenas.