Câmara de Fortaleza limita acesso de jornalistas ao plenário após discurso de Ronivaldo Maia

De acordo com os funcionários da Casa, a limitação de acesso foi a pedido do próprio vereador. O parlamentar nega

Jornalistas do Diário do Nordeste, do O Povo e do blog do Edison Silva tiveram o exercício profissional limitado, na manhã desta quinta-feira (28), na Câmara Municipal de Fortaleza.

Após o discurso do vereador Ronivaldo Maia (PT), que retornava à Casa pela primeira vez após ser acusado e preso por tentativa de feminicídio, o acesso de repórteres ao plenário foi impedido por servidores do Legislativo Municipal. De acordo com os funcionários da Casa, a mudança de procedimento foi a pedido do próprio vereador. O parlamentar, no entanto, nega. 

O acesso da imprensa a esse espaço, geralmente, não é limitado, mesmo em momentos quando a circulação de pessoas no local é reduzida, como na pandemia da Covid-19. Habitualmente, os jornalistas têm acesso livre ao plenário e realizam entrevistas com os parlamentares. 

Nesta quinta-feira (28), após o bloqueio de acesso da imprensa, veículos de comunicação ligados ao poder público ainda assim puderam circular pelo plenário.

Conforme o regimento interno da Casa, é função do presidente da Câmara, no caso, o vereador Antônio Henrique (PDT), “determinar lugar reservado aos representantes credenciados da imprensa”. 

No artigo 101 do mesmo documento, é definido que, o acesso ao Plenário, durante as sessões, admite “vereadores, ex-vereadores, servidores em serviço, convidados, e assessores''. 

Episódio

Antes da chegada de Ronivaldo, jornalistas circularam livremente nas dependências da Câmara, como tradicionalmente ocorre. Os profissionais têm uma sala reservada para acompanhar as sessões, mas também têm acesso ao plenário sem qualquer restrição. Conforme os servidores que impediram o acesso, o bloqueio ocorreu porque Ronivaldo Maia não queria ser interrogado sobre as denúncias que pesam contra ele. 

Após a decisão de limitar o acesso, a circulação dos profissionais ficou restrita à sala de imprensa – onde se tem visão do plenário, mas sem acesso direto aos parlamentares – e aos corredores da Câmara.

Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa do vereador Ronivaldo Maia disse, por meio de nota, que ficou surpresa com a acusação de que teria pedido a limitação do trabalho dos jornalistas. 

“Além de negarmos a autoria, consideramos essa situação absurda e sem precedentes. Um mandato de vereador não tem nem o direito, nem o poder de barrar a imprensa no parlamento, que é a casa do povo. Além disso, hoje foi a primeira vez em que o vereador se pronunciou e se defendeu sobre sua situação; e os jornalistas foram informados justamente para cobrir”, concluiu a nota. 

Imprensa

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado do Ceará (Sindjorce) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) repudiaram a postura adotada pela Câmara de Fortaleza. 

“Entre os direitos fundamentais dos jornalistas está a liberdade de exercício da profissão sem qualquer tipo de constrangimento, interno ou externo, que vise obstruir, direta ou indiretamente, a livre divulgação de informação”
Fenaj e Sindjorce

De acordo com o Sindicato e a Federação, casos dessa natureza, que  configuram obstrução ao trabalho da imprensa, são registrados no Relatório da Violência Contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa, elaborado pela Fenaj.

“E o Ceará tem registrado número recorde de violações este ano. As entidades esperam que a Casa legislativa tome as medidas cabíveis para reparar as violações ao exercício profissional dos jornalistas e que situações como essa não voltem a acontecer”, acrescentam. 

Por fim, o Sindjorce e a Fenaj ressaltam que impedir o livre exercício do jornalismo é um atentado contra o direito humano fundamental da sociedade de ser informada. “Práticas de impedimento ao trabalho dos operários e das operárias da notícia são características de regimes totalitários e deve ser amplamente combatido por todos os segmentos sociais. O jornalismo é um bem público essencial à democracia”, conclui.

A Associação Cearense de Imprensa (ACI) e a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) criticaram o episódio envolvendo os três veículos de comunicação no parlamento municipal. Em nota, as entidades reafirmam a defesa do livre exercício profissional dos jornalistas e comunicadores e se manifesta contrária ao impedimento de repórteres de entrar ou permanecer no plenário da Câmara Municipal de Fortaleza, por ocasião de pronunciamento realizado pelo vereador Ronivaldo Maia.

"Na condição de homem público e diante de um fato grave, pelo qual tem obrigações de responder à sociedade, não cabe ao vereador e à sua assessoria atitudes que cerceiem a liberdade de exercício da profissão, com medidas que buscam impedir a livre circulação das informações. É necessário que o parlamentar esteja aberto ao crivo da imprensa e a ser entrevistado pelos profissionais que cobrem o Poder Legislativo municipal", diz a entidade. 

"Entendemos como necessário que a Câmara Municipal de Fortaleza aja no sentido de assegurar aos jornalistas seu livre exercício profissional, inviabilizando a continuidade de medidas que apenas aumentam os casos de violência contra os profissionais que exercem sua missão"
ACI e ABI

A assessoria de imprensa da presidência da Câmara Municipal de Fortaleza foi procurada pelo Diário do Nordeste às 11 horas desta quinta para comentar o assunto, mas não respondeu até a publicação dessa matéria.