Ao ser eleito em novembro de 2020 para a Prefeitura de Maracanaú, Roberto Pessoa (PSDB) consolidou a força de seu grupo político no município da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Após dois mandatos à frente do Executivo da cidade, entre 2005 e 2012, elegeu o sucessor, Firmo Camurça (PSDB), e agora volta ao cargo de prefeito com um desafio: gerir uma das maiores cidades do Estado em meio à pandemia de Covid-19, com desafios não apenas na Saúde como também na Economia. Para isso, propõe a revitalização do polo industrial do município e convênios para diminuição de custos da gestão.
Série "O traçado da gestão" entrevista prefeitos dos maiores municípios cearenses fora de Fortaleza.
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Próximo ao fim do primeiro mês de governo, ele detalha, em entrevista exclusiva ao Sistema Verdes Mares, como será feita a revitalização do Distrito Industrial de Maracanaú, que está no centro das prioridades da nova gestão. A diminuição do número de terrenos disponíveis para a instalação de novas indústrias é desafio, para o qual Roberto Pessoa apresenta como solução a implementação de imposto progressivo em áreas subutilizadas. “Quero é mais emprego, mas tenho que fazer isso porque não tenho mais terreno para construir”, explica.
O prefeito também diz que pretende ampliar o destaque de Maracanaú para comércio e serviços. Com tal meta, pretende investir na ligação com cidades vizinhas, para atrair potenciais compradores para o município. Com o agravamento da crise econômica, e as consequentes dificuldades para garantir recursos para as prefeituras, a saída, aponta ele, é usar do trânsito político que tem para buscar recursos em Brasília. “No município, o dinheiro que tem é para pagar o custeio da máquina. Então, tem que ir atrás de dinheiro”, defende.
Confira a entrevista:
O senhor esteve à frente da Prefeitura de Maracanaú durante dois mandatos (2005-2012). O que faltou fazer naqueles governos que o senhor pretende trazer para esta administração?
Tanto Firmo (Camurça, ex-prefeito de Maracanaú) como eu demos muita ênfase às obras físicas. Estrutura rodoviária, prédios escolares, tudo isso, que é importante. (Mas) Nós vamos dar ênfase à pessoa. Para a criança, principalmente. Todo mundo diz que a criança é o futuro do Brasil, mas não vejo os governantes trabalharem nesse futuro. Então, vou fazer minha parte. Vou fazer creches de tempo integral e universalizar para todos. Também vou fazer um convênio com as igrejas evangélicas e católicas ou outras igrejas, para aproveitarem o seu espaço físico - porque toda igreja tem seu puxadinho, tem uma sala - para fazer creche e cursos profissionalizantes.
Eu quero movimentar a sociedade através das igrejas, porque 95% das pessoas têm a sua religião, frequentam os templos. É aproveitar a ociosidade desses prédios religiosos que podem ficar a serviço da comunidade. Todo pastor e todo padre é um líder. Quero aproveitar essa liderança para fazer um trabalho bem comunitário, competente e com resultado para sociedade.
Como seriam feitas essas parcerias com as igrejas?
Seriam convênios. Nós vamos usar essa essa infraestrutura, porque não vamos construir creches, porque (se for construir) acaba o mandato e não termino nenhuma creche, por causa da burocracia hoje, com licitação, com construtora que ganha licitação e não faz a obra... E também, infelizmente, muitas escolas particulares fecharam com a pandemia. Eu vou alugar essas escolas para poder fazer as creches, desde que naquela região esteja faltando creche.
Em Maracanaú, nós temos uma cobertura de 100% da faixa etária de 0 a 4 anos, só que vou entregar com tempo integral. Com isso, vamos gastar a mais com essa modalidade um total de R$ 30 milhões por ano com custeio. Queremos aproveitar os espaços para poder ser rápido e mais barato.
Além disso, nós temos seis ADLs (Áreas de Desenvolvimento Local), que são regiões de Maracanaú que reúnem bairros. Em cada uma delas, quero construir uma creche modelo, que no futuro pode ser disseminada no restante. Nós já temos duas que funcionam muito bem e construiremos mais seis.
Várias vezes no seu programa de governo aparece a proposta de simplificação e desburocratização do processo de abertura de novas empresas. Como isso será feito? Já tem um projeto a ser enviado para o Legislativo sobre isso?
Vou criar um núcleo para dar um alvará em 24 horas, porque o empresário quer rapidez. O empresário fica onde é bem tratado. Nós temos incentivo fiscal, mas vamos dar rapidez. O empresário é tudo para Maracanaú, porque ele gera imposto e gera emprego. E quem está empregado, compra em Maracanaú. É uma cadeia econômica.
A pessoa que fornece o alvará sanitário, o responsável da Secretaria de Finanças e do Meio Ambiente, todos irão ficar na mesma sala. Alguém chega lá, eles examinam. Pode dar provisório? Dá provisório. Nós temos que tratar bem quem quer investir na cidade. Maracanaú é a cidade da indústria, mas eu quero transformar em serviços e comércio também.
Vamos também fazer estradas para ligar com Maranguape, para facilitar para os nossos bons vizinhos virem comprar em Maracanaú. Vem também muita gente do Conjunto Ceará e do Conjunto José Walter comprar em Maracanaú. Nós estamos facilitando (o acesso) com avenidas e linhas de ônibus para essas pessoas conhecerem e comprarem em Maracanaú.
Quais as outras propostas para o setor produtivo?
Nós vamos revitalizar o Distrito Industrial de Maracanaú. Temos energia lá, não tem variação na rede elétrica, portanto, não queima motores e o empresário gosta disso, porque precisa de pouca manutenção nos equipamentos elétricos. Nós temos água bruta, que é a matéria-prima de muitas indústrias. Então, o preço da água cai. Temos água tratada, estamos perto de algumas das principais rodovias do Estado, perto do Porto do Mucuripe e do Porto do Pecém. Só não vai para lá quem não quer.
O grande problema de Maracanaú é que estamos ficando com poucos terrenos. Poucos e caros. Quando fui prefeito pela primeira vez, desapropriei muito e coloquei muita indústria lá. Agora, vou ter que ser mais criativo. (Para) empresas que têm muitos hectares de terra sem usar, nós vamos cobrar IPTU crescente. (No) Primeiro ano, 100% de aumento, no segundo ano mais 50%. Ou ele aumenta a fábrica ou vende, porque o empresário está no filé do Distrito.
Apesar de eu não querer imposto, quero é mais emprego. Mas tenho que fazer isso porque não tenho mais terreno para construir. (...) Como parte da revitalização, nós queremos construir um heliponto, fazer arborização. Eu vou tentar fazer, se a lei me permitir, pequenos conjuntos habitacionais para os trabalhadores morarem lá, ficando próximos às indústrias que não poluem. Temos cerca de 30 indústrias que faliram. Vamos procurar o Banco do Nordeste e procurar soluções. Não pode é se acabar.
O seu plano de governo é extenso e o senhor já mencionou reformas e construções. Tudo isso exige recursos para a Prefeitura. Como o senhor pretende atrair investimentos para a cidade?
Para obras físicas, nós temos um financiamento do BIRD (Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento) de US$ 36 milhões, que corresponde a R$ 160 milhões. Esse recurso vai ser usado para fazer grandes avenidas, interligando bairros e rodovias - tanto a CE 65 como a CE 60 e o Anel Viário - para dar mais rapidez ao fluxo e conforto àqueles que transitam em Maracanaú. Este dinheiro já está com financiamento.
Temos também R$ 80 milhões de royalties de petróleo que estão (em disputa na) Justiça. Nós já ganhamos, por três a zero, na segunda instância. Agora vai para o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Acredito que será rápido e, daqui a seis ou oito meses, nós teremos disponíveis R$ 80 milhões para mobilidade urbana - calçamento, asfalto, drenagem. Então, Maracanaú não vai precisar de dinheiro próprio para as obras físicas, mas vai precisar de recursos para custeio. Por exemplo, um programa de creche custa R$ 30 milhões a mais por ano. O que não irei gastar em obras físicas, vou gastar na questão social.
Em 2021, chegou ao fim o auxílio emergencial, que vinha sendo fonte de renda de parcela da população brasileira. Existe alguma outra medida para minimizar a dificuldade da população mais vulnerável em Maracanaú?
Vou implantar, não sei se daqui a dois ou três meses, porque ainda precisa de muito estudo, passagem urbana de graça para pessoas (cadastradas) no Bolsa Família - inclusive, estudantes. Vamos colocar também ônibus para trazer estudantes para as faculdades em outros municípios, como Fortaleza e Redenção. Isso melhora a renda, porque é uma economia com passagem.
Agora, um programa aos moldes do auxílio emergencial, nós não temos. Inclusive, porque temos que saber as finanças do município. Como Maracanaú é uma cidade que tem um índice de empregabilidade bem alto em relação a outros municípios, isso ajuda, porque (com) a pessoa estando empregada, naturalmente as questões sociais diminuem. Não é que acaba, mas diminui. Então, nesse item, acho que nós estamos bem. Com o emprego das pessoas e também com esses auxílios que nós pretendemos fazer.
Um dos principais desafios que os gestores têm citado nesse início de gestão são os impactos da pandemia de Covid-19. Quais são os principais planos que o senhor pretende adotar para a área de Saúde pensando o combate à pandemia?
Eu fiz uma viagem, ainda como prefeito eleito, no mês de dezembro, a São Paulo. Tivemos uma audiência com o governador João Dória (PSDB) e também fui ao Instituto Butantan. Assinamos o convênio para adquirir oito mil doses de vacina (CoronaVac, produzida em parceria com o laboratório chinês Sinovac), porque temos quatro mil profissionais de saúde em Maracanaú - entre rede pública e privada - que são prioridade para a vacinação. (...) Nós nos antecipamos para demonstrar que, pelo menos, as doses para os profissionais da saúde, nós queríamos garantir, porque são eles que estão lutando e colocando a vida em risco toda hora. E a vacina é o único remédio que tem.
O município de Maracanaú abriga um dos povos indígenas cearenses: os Pitaguary. Quais devem ser as ações da Prefeitura para este povo?
Eu pretendo criar a Secretaria de Agricultura Familiar e Programas Indígenas. Vai ser criada por projeto de lei na Câmara Municipal. A escolhida (como titular da pasta) foi Aline Vieira, que é agrônoma e foi prefeita de Boa Viagem. Eu gosto muito dos índios. Para se ter ideia, nas eleições em que fui reeleito, com 87% dos votos, (tive) 96% entre os indígenas. Só que tem muito o que fazer lá. Vamos incentivar o cultivo de mudas de árvores frutíferas, lá tem um açude lindo… Tudo temos que ver se a lei permite.
Vou conversar com a Funai para saber até onde a Prefeitura pode ir. Lá tem um morro, chamado Morro do Urubu. Tem uma vista de Fortaleza, de Maranguape, uma beleza. A minha ideia é fazer um restaurante panorâmico lá, com um bondinho e colocar mão de obra dos índios. O lugar mais bonito de Maracanaú é a terra indígena dos Pitaguary. Quero colocar um gerador de energia eólica para ter energia de graça lá. Não vai faltar nada. Criei até uma secretaria com esse objetivo.
O senhor criou uma secretaria de Assuntos Religiosos, que agora é Secretaria da Família. Num cenário em que se fala da necessidade de enxugamento dos gastos públicos, por que criar essa secretaria? Qual será o orçamento dela e que ações ficarão sob sua responsabilidade?
Essas secretarias são ‘secretarias sem pasta’, são secretarias temáticas. Quando pensei na religiosa foi porque, em Maracanaú, 35% da população é evangélica e 63% é católica. O Governo trabalha para a maioria. A minha ideia foi essa. Além disso, quero ter parceria com as igrejas evangélicas e católicas para ter cursos profissionalizantes e creches. Mas, como recebi muitas críticas, preferi recuar. Vai mudar de nome, mas vai ser a mesma coisa.
Não tem orçamento. Eu criei algumas secretarias sem orçamento. Um vai cuidar da Mulher, contra o Racismo e LGBTQI. Vai ser comandada pela Margareth Rose, que foi vereadora por três mandatos, foi presidente da Câmara e concorreu comigo pela Prefeitura de Maracanaú. Ela foi coordenadora e agora vai ser secretária para esses três segmentos importantes.
Quais outras mudanças devem ocorrer na estrutura administrativa da Prefeitura?
Uma gestão pública municipal tem seis secretarias que são as maiores, como Educação, Saúde, Infraestrutura. São pastas grandes que 90% dos recursos vão para elas. (...) Essas outras pastas que falei vão ser criadas. Vamos mandar mensagem para a Câmara, acredito que aprovem, já que a nossa base aliada é formada por 20 dos 21 vereadores.
Vão ser a de Agricultura Familiar e Programas Indígenas, a da Mulher e Diversidade, a de Ação Social, a da Família, e da Comunicação. Todas essas pessoas (que vão assumir as novas secretarias) já têm cargo como assessor, então isso vai aumentar pouco os custos, mas vai aumentar a responsabilidade. Nenhuma tem orçamento e se reportam à Secretaria de Governo. E o aumento de despesa é pouco, porque essas pessoas já fazem parte da gestão. Dei responsabilidades maiores e prestigiei esses segmentos da sociedade.
Os trabalhos legislativos começam em fevereiro. Além da proposta de criação das secretarias, quais mensagens o senhor planeja enviar para os vereadores?
A reforma administrativa. Por exemplo, tem muitos cargos para serem extintos e outros que serão criados. Coordenadoria no lugar de diretoria. É uma série de mudanças. Nós estamos tentando fazer uma reforma enxuta, porque é pouca mudança, mas temos que fazer. Porque cada gestor tem o seu estilo.
Dentre as suas propostas, existem vários acenos ao Governo Federal. O senhor coloca, por exemplo, a pretensão a aderir programas da União e mesmo instalar uma escola cívico-militar, que é algo defendido pelo presidente Bolsonaro. Como o senhor pretende estabelecer o diálogo com o Governo Federal e o presidente Jair Bolsonaro?
Institucional, puramente institucional. Por que o Bolsonaro é desse jeito, eu não vou falar com ele? Se não falar, estou cometendo um crime, porque ele pode destinar verbas para Maracanaú. Eu fui deputado federal durante quatro mandatos e tenho uma relação muito boa com partidos e com os parlamentares. Muitos desses parlamentares hoje são ministros.
Eu tenho que usar essas amizades que fiz ao longo dos anos para o bem Maracanaú. Se for o Bolsonaro, eu vou. Se for o Camilo, que é meu adversário político, eu também vou falar com ele. Maracanaú é injustiçado pelo Governo estadual. Nós produzimos de ICMS oito vezes mais do que o governo estadual devolve para a gente. Só não quero ser discriminado de novo.
Como o senhor pretende administrar essa relação com o Governo estadual?
Entregar projetos bons. Quando se entrega projetos bons, não tem desculpa. Não faz porque não quer, por perseguição política. Então, vamos entregar projetos bons, inclusive da linha do governo dele (Camilo Santana). Se ele não fizer, vai ter que explicar os motivos. Não conversei com ele, mas posso conversar a qualquer hora. Para o bem de Maracanaú, eu falo. Politicamente, não.
E o senhor já foi até Brasília ou pretende ir?
Já fui e pretendo ir. De quinze em quinze dias, estou lá. É lá onde tem o dinheiro. O meu secretariado, modéstia à parte, é bom. Por que? Para que eu possa ir até Brasília, trabalhar atrás de dinheiro. No município, o dinheiro que tem é para pagar o custeio da máquina. Então, tem que ir atrás de dinheiro.
Em relação à oposição, o deputado federal Capitão Wagner (Pros) disse recentemente que as lideranças anteriores da oposição não articularam um grupo coeso e que agora pretende fazer isso. Como essa oposição está se articulando para 2022? Qual o papel do senhor nesse processo?
Sou prefeito de Maracanaú. Vou cuidar do meu povo. Sou político também, na hora H, o político entra. Na época certa, depois das convenções (partidárias). Eu tenho tanto problema pra tomar conta, tanto problema.