A pobreza menstrual, problema que afeta milhares de brasileiras e milhões de pessoas em todo o mundo, está chamando atenção das autoridades cearenses que se mobilizam em busca de soluções para o problema que afeta principalmente a população mais pobre.
O tema, que suscita debate no mundo inteiro, ganhou mais espaço no debate público cearense no início deste mês, após a publicação da coluna “Menstruação: esse é o nosso sangue”, da advogada Jeritza Gurgel, no Diário do Nordeste.
O texto aborda a problemática que consiste na escassez produtos de higiene pessoal, como absorventes e sabonetes, além da ausência de condições básicas sanitárias para praticar a higiene menstrual e atinge pessoas em situação de vulnerabilidade social, dificultando cuidados durante o ciclo biológico de sangramento.
A temática despertou a atenção de parlamentares na Câmara Municipal de Fortaleza, na Assembleia Legislativa e também da Ordem dos Advogados do Brasil Secção Ceará (OAB-CE).
A instituição, inclusive, enviou ofício à Assembleia solicitando a elaboração de projetos parlamentares para a disponibilização gratuita de absorventes menstruais em equipamentos públicos e a diminuição da tributação sobre esses produtos no Estado.
O documento assinado pelo presidente da OAB-CE, Erinaldo Dantas, pela vice-presidente da Ordem, Ana Vládia Martins, e por Christiane do Vale, chefe da Comissão da Mulher Advogada.
O documento foi entregue ao presidente da Casa Legislativa, Deputado Evandro Leitão (PDT) no início deste mês.
Repercussão do tema
A pobreza menstrual é um problema que vem ganhando repercussão nos últimos anos à medida que mulheres cis e homens trans - corpos que menstruam - ocupam espaços para reivindicar suas lutas.
Quando temáticas como essa chegam à política institucional têm a chance de serem trabalhadas de forma mais ampla e alcançar mais pessoas.
Parlamentares cearenses submeteram, pelo menos, nove propostas abordando o tema na Câmara Municipal e na Assembleia.
A vereadora Larissa Gaspar (PT), autora do Projeto de Indicação nº 329/2020, que cria o programa “Menstruação Sem Tabu”, lamenta a situação de pobreza menstrual no Brasil.
“Muitas mulheres e meninas não tem condições financeiras de comprar o absorventenem de manter uma estrutura de higiene pra cuidados. Muitas vezes, essas pessoas usam miolo de pão, folhas de plantas, tecidos inadequados, que causam até infecções, problemas de saúde”.
A preocupação é compartilhada pela deputada estadual Augusta Brito (PCdoB) que, recentemente, aprovou um projeto que cria a Política de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Paism), com a distribuição de insumos e absorventes em equipamentos públicos de saúde e de ensino.
"A pobreza menstrual não se trata só da possibilidade de poder comprar o absorvente. É bem mais ampla, envolve questões como o saneamento básico e a falta de informação. Essa discussão tem que estar dentro das escolas e quebrar o tabu de falar".
Carência de serviços médicos
O problema caracteriza-se, também, pela carência de serviços médicos, pela falta de informação sobre o tema, pela ausência de saneamento básico e pela dificuldade de acesso a produtos de higiene íntima (como sabonetes, papeis higiênicos, além de absorventes).
Isso consta no relatório do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) divulgado em 28 de maio, Dia Internacional da Dignidade Menstrual.
A temática envolve, inclusive, vários dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU a serem cumpridos até 2030, com os quais a Assembleia Legislativa e a OAB-CE querem se comprometer.
O relatório aponta uma "negligência" do Poder Público sobre essa questão. "[Esses] problemas evitáveis, decorrentes da falta de manejo adequado da menstruação, seriam facilmente prevenidos com os devidos investimentos em infraestrutura e acesso aos produtos menstruais", diz o documento.
Além disso, os órgãos da ONU ainda mostram que há pouca base de dados, no Brasil, especificamente sobre a saúde ginecológica de adolescentes e adultos.
Apesar disso, as seguintes informações podem ser relacionadas ao problema da pobreza menstrual e ajudar a atendê-lo:
Com um ciclo menstrual com duração de cinco dias a uma semana, uma menina pode gastar de R$10 a R$15 por mês apenas com absorventes.
das meninas negras não têm acesso à rede de esgoto em suas residências
Entre as meninas brancas, 24% sofrem desse problema.
- O total de meninas que vivem em casas sem acesso à rede de esgoto é 6,5 milhões;
- Já casas sem acesso à água canalizada é um problema para 900 mil meninas;
- Mais de 4 milhões de meninas não têm acesso, nas escolas, a itens de cuidados de higiene íntima básicos.
Mobilização política
Alguns projetos submetidos à Assembleia Legislativa e à Câmara Municipal tentam agir para minimizar os problemas causados.
Pelo menos nove matérias nas duas Casas propõem, além da distribuição de absorventes higiênicos, a criação de campanhas de saúde educativas sobre a menstruação, a diminuição do preço desses produtos ao consumidor final, entre outras medidas.
Confira lista dos projetos no Legislativo Cearense sobre o tema
- Projeto de Indicação nº 59/2021 (Assembleia Legislativa), de autoria de Davi de Raimundão (MDB);
- Projeto de Lei nº 242/2021 (Assembleia Legislativa), de autoria de Augusta Brito (PCdoB);
- Projeto de Indicação nº 58/2021 (aprovado – Assembleia Legislativa), de autoria de Augusta Brito (PCdoB);
- Projeto de Lei nº 268/2021 (Assembleia Legislativa), de autoria de Augusta Brito (PCdoB);
- Projeto de Indicação nº 837/2021, sem texto original (Câmara Municipal de Fortaleza), de autoria de Emanuel Acrízio (PP);
- Projeto de Indicação nº 274/2021 (Câmara Municipal de Fortaleza), de autoria de Ronivaldo Maia (PT);
- Projeto de Lei Ordinária nº 274/2021, sem texto original (Câmara Municipal de Fortaleza), de autoria de Ana Aracapé (PL);
- Projeto de Indicação nº 329/2020 (Câmara Municipal de Fortaleza), de autoria de Larissa Gaspar (PT);
- Projeto de Lei Ordinária nº 122/2020 (Câmara Municipal de Fortaleza), de autoria de Bá (PP).