Revolucionária nas ideias e na vida, em uma época em que o papel da mulher estava limitado a cuidar da família e da casa, Bárbara de Alencar foi muito além: fazendeira atuante no dia a dia, empresária à frente dos negócios e, principalmente, ativista política que lutou contra o jugo da monarquia portuguesa no Nordeste brasileiro. Marcada na história do Brasil por se dedicar a construir o ideário republicano, ela possui, entretanto, poucos registros históricos. Hoje, é reverenciada em apenas três logradouros em Fortaleza: no bairro Aldeota, está em rua, em praça e estátua.
Neste Dia Internacional da Mulher, o Diário do Nordeste inicia com a trajetória de Bárbara uma série de perfis de figuras femininas que marcaram a história do Ceará. A luta da ativista, que participou de dois levantes em favor da República, foi travada em uma época em que mulheres eram submetidas a restrições, como ler, escrever e participar de reuniões políticas, resgata o escritor Gylmar Chaves, autor do livro "A Invenção de Bárbara de Alencar".
"Primeira republicana das Américas e presa política do Brasil, foi uma mulher de vanguarda e profética no fundo do seu ser", afirma Gylmar. A pernambucana, que veio adolescente para o Cariri cearense, também foi retratada no livro "Bárbara de Alencar", da jornalista e escritora cearense Ariadne Araújo.
"Bárbara, como todas as mulheres de sua época, era fruto de uma sociedade muito conservadora, moralista, católica. Para se compreender o que isso quer dizer, por exemplo, ela não tolerava escravos amasiados nas suas fazendas. Mas, por outro lado, mostrou uma abertura a novas ideias ao apoiar um movimento revolucionário", explica. Bárbara Pereira de Alencar nasceu em 1760 na cidade de Exu. Ela é considerada a primeira presa política do País.
Aos 22 anos, se casou com o fazendeiro José Gonçalves dos Santos e foi morar no Sítio Pau-Seco, hoje Juazeiro do Norte. Teve três filhos: José Martiniano de Alencar (pai do escritor José de Alencar), Tristão Gonçalves Pereira de Alencar e Carlos José dos Santos.
"Sabemos que ela era corajosa e decidida pela leitura de seus atos, mas pouco ficou dela na história. Apenas fragmentos, uma frase aqui e outra ali - que ela era alta, passo decidido, pernas longas, exaltada, que tinha conhecimentos de botânica", lembra a escritora.
Levantes
Bárbara de Alencar foi a única mulher a participar ativamente, no Vale do Cariri, da ação revolucionária de 1817 no Nordeste, que tentou varrer as forças do Império decretando, no Crato, uma República independente. A utopia caririense havia começado no Recife em março de 1817: a insurreição de Pernambuco conseguiu perdurar por 75 dias. No Ceará, apenas sete, tempo suficiente para provocar ódio na coroa portuguesa, que passou a castigá-la.
Em 1820, conseguiu o perdão real, mas os anos de cárcere não arrefeceram o vigor revolucionário de Bárbara de Alencar. Em 1824, participou, com os filhos, da Confederação do Equador, liderada, a partir do Recife, pelo Frei do Amor Divino Caneca: os pernambucanos não aceitaram a Constituição outorgada por Dom Pedro I e irradiaram uma revolta onde hoje estão as regiões Norte e Nordeste.
A ideia de Frei Caneca era instaurar um regime federalista e republicano. Dom Pedro I contratou mercenários ingleses que conseguiram derrotar os confederados. A heroína morreu aos 72 anos, em refúgio no Piauí, em 1832. O corpo de Bárbara de Alencar foi enterrado no município cearense de Campos Sales. "Conhecer sua participação, juntamente com seus filhos, na Revolução Pernambucana de 1817, é imprescindível para se conhecer a história política do nosso País", afirma Gylmar.
Bárbara de Alencar inspirou a canção "Passeio Público", de Ednardo. Ouça:
Campanha
Com o objetivo de estimular as mulheres a narrarem e compartilharem suas próprias histórias, amplificando suas vozes sobre as conquistas, as angústias e as denúncias do dia a dia, o Sistema Verdes Mares promove, ao longo do mês de março, a campanha "O que as mulheres têm a dizer". Compartilhe sua história abaixo. O material será submetido a uma curadoria e pode se transformar em pautas jornalísticas. Ao fim do mês, este material será reunido em um caderno especial que será publicado pelo Diário do Nordeste. Nesta edição, todas as matérias serão escritas por mulheres.