O discurso de pouco mais de três minutos de Jair Bolsonaro (sem partido) nesta quinta-feira (22), na reunião da cúpula mundial do clima, reafirmou o que vinha sendo a posição do Brasil nas Relações Internacionais acerca do tema, mas também reservou algumas surpresas, como a meta de zerar o desmatamento ilegal até 2030, e sinalizou que o País depende de ajuda internacional para alcançar metas. A avaliação é de especialistas entrevistados pelo Diário do Nordeste.
A fala do presidente era esperada, uma vez que os Estados Unidos - anfitrião do evento - já havia sinalizado que, caso o Brasil não apresente provas concretas da redução desmatamento na Amazônia, por exemplo, poderá haver sanções econômicas ao País.
“É um discurso defensivo, foi de mostrar que o Brasil tem se empenhado em função de toda pressão que nós recebemos. Do outro lado, reafirmou dois pontos importantes: de que dependemos de cooperação para que se alcance as metas climáticas”, observa a professora Denilde Holzhacker, do curso de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).
Bolsonaro e Salles alinhados
Assim como já havia indicado o ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente), Bolsonaro enfatizou que, para que haja o efetivo combate ao desmatamento e a redução de gases emitidos na atmosfera, será necessária a contribuição da comunidade internacional, principalmente dos Estados Unidos. Salles já havia mencionado o valor U$ 1 bilhão para essa finalidade.
“Ele (Bolsonaro) está falando para um organizador de um encontro que tem U$ 10 bilhões para ajudar na Amazônia. A aparência que deu no discurso é que ele estava mendigando recursos, porque ele destacou que um dos obstáculos para ampliar as metas de redução do desmatamento seria a dificuldade financeira”, avalia o professor Gustavo Guerreiro, pesquisador do observatório das Nacionalidades, da Universidade Estadual do Ceará (Uece).
Estudos do instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostraram que a área de alertas de desmatamento na Amazônia em março foi 12,6% maior do que a registrada no mesmo mês de 2020. E há temores no Governo de que os dados de abril não indiquem uma reversão de tendência.
Em um dos trechos do pronunciamento que obteve mais destaque entre os especialistas, o presidente é enfático quando condiciona resultados concretos à contribuição internacional: “Devemos aprimorar a governança na Terra, valorizando a biodiversidade; esse deve ser o esforço que contemple o interesse de todos os brasileiros [...] É fundamental poder contar com a contribuição financeira de outros países”, disse.
Para Holzhacker, é importante ter e mente que a ajuda internacional “só será liberada a medida que o Brasil mostrar algum tipo de mudança efetiva na atuação ambiental. É uma estratégia do Governo em dizer que não consegue alcançar as metas por falta de recurso, e por outro lado a comunidade internacional aguarda que o Brasil demonstre a atuação”.
A professora de Relações Internacionais lembra ainda que os recursos do Fundo Amazônia - que capta recursos não reembolsáveis para ações de combate ao desmatamento na floresta -, estão parados.
“Isso ocorre exatamente porque o Governo brasileiro não tem feito as ações concretas. Vai ser um pouco parte do discurso e parte da narrativa. Vamos continuar sendo pressionados para ter ações concretas”, conclui a especialista.
Importância da cúpula
Caso continue sendo retratado como um vilão do meio ambiente, Bolsonaro tende a perder apoio dos americanos em temas-chave - como para o desejado ingresso na OCDE.
O presidente norte-americano Joe Biden também trabalha para que investimentos tanto do setor público como do privado sejam alocados levando em conta compromissos ambientais.