Movimentos buscam renovação da política em cenário de descrença

Defendendo um jeito "novo" de fazer política e independente de partidos, movimentos recrutam membros, prometendo oxigenar a política tradicional. Especialistas observam esse discurso com reservas

Renovação. Essa é a palavra do momento e já faz algum tempo. No Brasil, a política, como vem sendo feita na nossa recente democracia, já não agrada mais a um eleitorado mergulhado em descrença. Com 69% da população dizendo não ter confiança em partidos, segundo pesquisa Datafolha de 2018, recentes iniciativas da sociedade civil ditas suprapartidárias e de diferentes linhas de atuação - como a escola de formação política RenovaBR e os grupos Acredito, Movimento Brasil Livre (MBL) e Livres - apoiam candidatos de primeira viagem que, com discursos por uma "nova política", vêm mostrando o potencial eleitoral envolvido na promessa de "renovação".

As manifestações de junho de 2013 marcaram o início de um novo contexto no debate político nacional e puseram em evidência uma desconfiança já antiga dos brasileiros com seus representantes.

A partir de junho de 2013, um leque enorme de questionamentos ao sistema político brasileiro se tornaram parte da agenda política do País. Entre essas críticas se encontra, em particular, uma rejeição do sistema político-partidário institucional brasileiro", diz o pesquisador especializado nos eventos de 2013 Idelber Avelar, da Universidade de Tulane, Nova Orleans, EUA.

Para Leonardo Avritzler, professor de ciência política da UFMG, a crise do presidencialismo de coalizão, modo de organização política brasileiro, foi determinante para o surgimento desses movimentos. Segundo ele, as novas formas se fortaleceram principalmente com a atuação nas redes sociais e mostraram resultado nas recentes eleições.

Em 2018, o liberal MBL emplacou quatro vagas no legislativo, entre elas uma na Câmara federal, com Kim Kataguiri (DEM), fundador do grupo. Dos 28 apoiados pelo Acredito, três foram eleitos, incluindo os deputados federais Felipe Rigoni (PSB) e Tábata Amaral (PDT). O RenovaBR teve êxito com nove federais, sete estaduais e um senador.

Acredito

Fundado em 2017, mirando as eleições do ano seguinte, o Acredito se define como um movimento de renovação nacional suprapartidário que reúne pessoas dos mais diversos espectros ideológicos em torno de valores como sustentabilidade, estado eficiente e transparente, diversidade, liberdades individuais e economia empreendedora e competitiva.

No Legislativo, desde que os deputados Felipe Rigoni (PSB-ES) e Tabata Amaral (PDT-SP) desrespeitaram orientações dos partidos e votaram a favor da reforma da Previdência, os integrantes do Acredito são acusados de "infieis".

Segundo pesquisa do jornal O Estado de S. Paulo, Rigoni e Tabata contrariam as determinações partidárias em cerca da metade das votações.

Enquanto alguns acusam o movimento de funcionar como um partido clandestino, o Acredito diz que se propõe a combater a crise de representatividade promovendo renovação no sistema partidário.

No Ceará, o Acredito pretende apoiar três candidatos para o próximo ano, um em cada núcleo do movimento: Fortaleza, Cariri e Sobral.

MBL

Prestes a completar cinco anos e próximo do lançamento do documentário sobre sua atuação em prol do impeachment de Dilma em 2016, o MBL, que pressionou pelo cancelamento da mostra Queermuseum no Rio de Janeiro ou que apoiou Bolsonaro em 2018, já não é mais o mesmo.

Segundo o vereador de São Paulo, Fernando Holiday (DEM), um dos líderes nacionais do movimento, o MBL passou por três fases. Na primeira, ou MBL 1.0, como chamam internamente, está a origem do movimento, com as mobilizações, manifestações e passeatas em torno do impedimento da presidente.

Na segunda fase, MBL 2.0, de tendência mais conservadora, teria ocorrido uma espetacularização do debate político "de forma que os adversários acabaram se tornando inimigos", diz Holiday. Para o vereador, o movimento "pesou a mão no MBL 2.0" e os articuladores vêm agora construindo a fase 3.0, que se propõe a debater com quem discorda de suas ideias.

RenovaBR

Fundado em 2017 pelo executivo financeiro Eduardo Mufarej, em São Paulo, o RenovaBR se define como "escola de formação política" e seleciona pessoas de diferentes de orientações ideológicas que nunca ocuparam cargos eletivos para estudar gratuitamente temas como ética e liderança, organização de campanha, saúde e educação pública, planejamento urbano e ocupação do solo, entre outros.

Segundo o diretor de seleção, Rodrigo Cobra, na primeira etapa, o movimento procura por quem demonstre automotivação e capacidade de realização e que seja aberto ao diálogo. Na segunda, candidatos enviam vídeos em que falam porque querem entrar no programa e na política.

Depois de aprovados, a formação dos selecionados se dá em três eixos.

O primeiro é comunicação política, com o objetivo de ensinar esses alunos a fazer uma campanha eficiente e barata, o segundo é liderança, ensinando a pessoa que já é motivada a se tornar um líder local e o terceiro é desafios municipais, em que o intuito é mostrar para esses alunos que os problemas dos municípios devem ser resolvidos a partir de dados, fatos e evidências", afirma Rodrigo.

Atualmente, o RenovaBR assiste a um crescimento significativo. Só neste ano, mais de 30 mil pessoas se inscreveram no processo seletivo para o curso preparatório para as eleições de 2020. Dos 133 alunos preparados para as eleições de 2018, o número de interessados em concorrer em 2020 saltou para 1,4 mil. Ou seja, um salto de 10,5 vezes.