Por tantas vezes discriminados ou tidos como parte invisibilizada do país, pessoas pretas e nordestinas deram um ‘show’ de desempenho durante a Olimpíada, marcada por superações, histórias lindas, honrosas e muitas lições que nosso país deve aprender e refletir sobre quais contrapartidas podem e devem ser feitas em relação a esta população.
Deram uma overdose de alegria e orgulho como há tempos não se via, sem falar do período em que o mundo passa por sua maior crise devido à pandemia, então gratidão é pouco.
A maioria das medalhas de ouro e prata foi conquistada por pessoas pretas e mulheres que têm sua trajetória e origem nas favelas e áreas pobres do Brasil, surfando em prancha de isopor ou treinando em terrenos baldios.
A primeira retribuição seria não olhar e tratar mais estes territórios como espaços somente de falta, tragédia e carência, mas principalmente de possibilidades e potencias. Os exemplos não cabem aqui, são milhões. Estamos falando de um território que, antes da pandemia, produzia 119 bilhões em riqueza, de pessoas pretas, que hoje no país, tem 1,7 trilhões em poder de consumo.
Na política, estas populações não podem ser mais tratadas de maneira emocionada e romântica nos discursos e, em 2021 e na prática, estarem excluídas do grosso do fundo partidário e sendo sub-representação no parlamento, mesmo sendo composição da maioria da população.
Teremos o vergonhoso e constrangedor movimento por recursos para candidaturas e espaços de poder e decisão para mulheres e pessoas pretas no ambiente político.
Do ponto de vista legislativo, temos em andamento no Congresso Nacional uma comissão, que tem como relator o renomado nacional e internacionalmente jurista e intelectual Silvio Almeida, responsável por rever e pautar uma nova legislação antirracista para o país.
Nas empresas e no mundo corporativo, em geral, inclusão e diversidade têm que ir além de uma propaganda bem bolada do marketing, têm que significar representatividade com poder de mando, e isso vale para dentro e fora da empresa nos seus conselhos de administração e gestão, nos investimentos em planos de cargos e carreiras para mulheres e pessoas pretas e demais grupos excluídos, pois estamos falando não somente de responsabilidade social, mas da relação das empresas, marcas e serviços com seus clientes. Falamos sobre economia e desenvolvimento.
Existem vários pontos ainda, mas finalizo apontando para a necessidade de uma política pública, descentralizada nas regiões. Vejam, Nordeste sempre arrasta medalhas e dá show, mas vive um deserto de políticas estruturantes, política de estados, não de ocasião nem eleitoreiras, de uma infraestrutura que coloca regiões fora do eixo Rio e São Paulo no mapa do desenvolvimento esportivo, assim inverteremos a lógica que comemora ganhos e suas superações e se nega a ver que nossos homens e mulheres olímpicos não precisam passar por privações, limitações e abandonos na oitava economia mundial, pois se eles fazem o que fazem diante de um clima tão adverso, desigual e desfavorável, imaginem se realmente tivessem o apoio necessário.
Que essas vitórias, além de alegria e honra que nos trouxeram estes verdadeiros vencedores da vida, possam conduzir o país a olhar para estes lugares e pessoas e retribuir todo o empenho e amor a que eles se dedicaram.
*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.