Principal exportador de pescados do País, o Ceará enfrenta alguns entraves na captura do atum que podem ameaçar o protagonismo do Estado. Isso porque na área onde atualmente é permitida a pesca do peixe, de 12 milhas (19,3 km de mar), não há a circulação do animal, defende entidade que representa os pescadores.
O presidente da Associação de Armadores e Proprietários de Barcos do Estado do Ceará (Qualipesc), Bel Neves, explica que a área de 12 milhas que é liberada para a pesca do atum compreende o chamado mar territorial, parte do oceano que é considerada território soberano do estado.
"É preciso que haja uma correção dessa licença, porque as espécies de atum como o bonito-listrado, por exemplo, só são capturadas em águas internacionais. O que a gente solicita, hoje, é que possamos operar em águas internacionais", pontua o presidente. O limite é estabelecido pela Comissão Internacional para Conservação do Atum Atlântico (Iccat), já que o atum é um peixe migratório.
O entrave tem gerado multas para as embarcações. No ano passado, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) identificou no Ceará a pesca irregular de 490 toneladas de atum no Ceará. A principal irregularidade apontada foi a captura em área não permitida.
Bel Neves revela que as perdas para o setor com a limitação de área giram em torno de R$ 5 milhões. “A pesca do atum é concentrada em Acaraú e Itarema. São municípios que dependem fortemente da atividade, que movimenta cerca de 80% da economia dos municípios”, destaca Neves.
O presidente da Qualipesc detalha que já foi iniciado um diálogo para a articulação de uma mudança na portaria do Iccat que determina o limite de 12 milhas. “Na semana passada nós mandamos um ofício para o MPA solicitando e aguardamos que seja feita a correção”.
Preços defasados
Mas a situação não é o único problema que o setor pesqueiro de atum vem enfrentando no Ceará. Isso porque, com apenas uma indústria compradora do peixe, os preços estão muito abaixo do ideal, de acordo com Neves. “O reajuste que teve foi ano passado, este ano disseram que ia aumentar e diminuiu. Hoje, vendemos o atum em torno de R$ 8/kg”, afirma.
Ele compara o valor do quilo do produto ao preço da lata de atum em conserva vendida nos supermercados. O produto custa em torno de R$ 10, mas o conteúdo da lata não chega a 200g. “Comparado ao preço de uma latinha do supermercado, a diferença é grotesca”.
Para driblar o problema, Neves revela que o setor tem buscado novos parceiros comerciais para a compra do produto. “Nós, como associação, estamos buscando novos parceiros para escoar nossos produtos para outros mercados”. Segundo ele, algumas negociações já estão em andamento.
O secretário-executivo do Agronegócio da Secretaria do Desenvolvimento Econômico do Ceará (SDE), Silvio Carlos, também pontuou que a Pasta tem trabalhado para atração de investimentos para o Ceará, incluindo a pesca. "A SDE trabalha no apoio e na atração de empresas de qualquer setor e a pesca é um deles. O objetivo é desenvolver os municípios e gerar emprego e renda no interior".
Regularização da frota
Outra problemática enfrentada, de acordo com o presidente da Qualipesc, é a regularização da frota, composta hoje por quase 200 embarcações, entre licenciadas e não-licenciadas. “Já conseguimos um diálogo com o pessoal do Ministério, que está empenhado em resolver. Um dos nossos empenhos para 2024 é a regularização da frota para que esses barcos trabalhem e não haja prejuízo na parte de empregos”.
“Nossos barcos têm toda a estrutura tecnológica, com capacitação de mão de obra, mestres que usam sonda, GPS, rastreadores, piloto automático. É uma frota artesanal, mas o escoamento do produto é industrial porque o volume da gente é muito grande”, acrescenta Bel Neves.
A coluna procurou o MPA para um posicionamento sobre o processo de regularização das embarcações e sobre os diálogos para ampliação do limite de pesca do atum, mas ainda não houve retorno. O espaço está aberto.
O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará (Faec), Amílcar Silveira, reforçou a importância da revisão do limite de área de pesca para a manutenção do setor. “Na nossa avaliação, esse limite é um equívoco, porque o atum é encontrado acima de 200 milhas. Quem autorizou a captura de atum em 12 milhas não conhece o Estado do Ceará”, enfatizou, destacando que a limitação atual “dificulta para os pequenos”.
Silveira também comentou sobre o preço atual praticado pela única indústria que compra o pescado cearense. “Precisa, de fato, ser melhor remunerado. O pescador precisa ganhar seu dinheiro. Nós, da Faec, entramos nessa luta, já estivemos com o Ministro (da Pesca) para isso. O Ceará é quem mais captura no brasil, somos celeiro disso”.
Ele também pontou o empenho da Faec para a regularização das embarcações. “A partir de abril vamos levar capacitação com a Carreta do Agro e ajudar a regularizar quem não estiver. Os pescadores não querem estar à margem da lei, querem uma coisa correta e não burocrática, mas condizente com a realidade do campo”, finalizou Silveira.