Por iniciativa do governo federal, temos os brasileiros, pelos próximos quatro meses ou até que se consumam os R$ 1,5 bilhão destinados ao programa, uma janela para a compra de carros populares.
O mais barato deles, o Kwid Zen, da Renault, já está custando R$ 58.990, ou seja, R$ 10 mil a menos do que custava até ontem.
Esse carinho da marca francesa, que faz 13 Km com um litro de gasolina, rodando nas ruas das cidades, e até 22 Km correndo pelas estradas, é hoje, na opinião do governo, o que foi o fusquinha no século passado: um carro popular.
Mas surge a pergunta: é mesmo popular um veículo que custa tão caro?
Não se preocupe com a resposta, porque esta se esconde na intenção do governo que – buscando popularidade e, ao mesmo tempo, desejando pela enésima vez agradar à classe média e à indústria automobilística - espera, com a medida, esvaziar os pátios das montadoras.
O vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, apoiando-se na sua larga experiência política, construiu uma frase que joga a culpa pela nova crise da indústria de automóveis no colo do Banco Central:
“O programa durará quatro meses, até que os juros baixem” – foi o que ele disse aos jornalistas, ao lado do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que concordou.
Geraldo Alckmin, todo o governo e toda a torcida do Flamengo sabem que, na próxima reunião do Copom, nos dias 20 e 21 deste mês, a taxa básica de juros Selic será mantida no atual patamar de 13,75% ao ano.
Na reunião seguinte, em agosto, aí sim, o Copom iniciará uma sequência, ou um ciclo de redução da taxa de juros, que será lento.
Esta coluna disse ontem e o repete hoje: o preço dos automóveis e dos demais bens duráveis, como refrigeradores e televisores, estão caros porque a renda do brasileiro caiu, o crédito ficou difícil por causa da elevada taxa de juros e a inadimplência das famílias explodiu como consequência de tudo isso, exatamente.
E como sair dessa sinuca de bico? – indaga o curioso leitor. Sem precisar de conhecimentos teóricos sobre economia, mas diante do que se passa na realidade, é fácil apontar o culpado: o governo. Sim, o governo de hoje, o de ontem e o de anteontem.
Repete-se no governo o que se passa na vida doméstica. Se uma família gasta mais do que ganha, surge o déficit.
Como enfrentar e vencer esse prejuízo? Cortando o jantar fora de casa, a festa de 15 anos da filha ou da neta, deixando o carro na garagem e optando pelo ônibus ou pelo VLT para ir ao trabalho, substituindo o filé de boi pelo peito de frango, economias que as famílias brasileiras estão costumadas a fazer.
Medidas, porém, que o governo – qualquer governo – odeia assumir. Cortar gastos não faz parte do DNA dos governos.
Como o governo, para cobrir seu déficit, é obrigado a pedir dinheiro emprestado, o que faz o emprestador, também chamado de investidor, mas que na verdade é mesmo um agiota que fala vários idiomas? Cobra juros mais caros. Aí a dívida do país cresce, e os juros (o serviço da dívida) também crescem.
Se os gastos do governo se reduzissem, sobraria mais dinheiro para a saúde, a educação, a infraestrutura e a segurança. Como eles não se reduzem, o déficit mantém-se e é até ampliado.
O arcabouço fiscal imaginado pelo ministro Fernando Haddad e sua equipe tem o dificílimo objetivo de zerar o déficit em 2024 e de alcançar um superávit fiscal em 2025.
Essa meta é possível, desde que o presidente da República, por exemplo, comece a cortar gastos, começando por adiar sua ideia de comprar um avião Airbus A330-200, novinho, para suas viagens internacionais. Uma decisão desse porte causaria impacto muito positivo na opinião pública, principalmente junto aos que produzem, trabalham e pagam impostos.
Assim, enquanto os juros da Selic não caem e enquanto os gastos do governo não se reduzem, acompanhemos o que acontecerá hoje nas concessionárias de automóveis, ônibus e caminhões, que começarão uma campanha de marketing para desovar seus grandes estoques, aproveitando as ofertas de “carros populares” com desconto de até R$ 10 mil para carros de passeio e chegam a R$ 99,4 mil para ônibus e caminhões, descontos bancados pelo governo, que, em troca, antecipará o reinício da cobrança dos impostos federais incidentes sobre as vendas do óleo diesel.
Pelo andar da carruagem, haverá a partir desta quarta-feira uma corrida às lojas de automóveis. Mas é bom saber que que só há R$ 1,5 bilhão para bancar essa conta.
Quando esse dinheiro acabar, acabará, também, o desconto.