Bastidores da liderança: não me sinto confortável em demitir

Demitir nunca é agradável. Por mais racional que o líder seja, sempre vem à mente os prejuízos que essa decisão gerará na vida de quem será demitido.

Mas, o que fazer para demitir sem culpa? 

Esse tema é muito sensível para mim. Quando precisei fazer a primeira demissão, estava atuando no meu primeiro cargo de gestão. Chamei o liderado e, ao anunciar a demissão, caí em prantos. Para o meu espanto, ele me acalmou e disse que já esperava a demissão. Isso foi um grande aprendizado.

O líder, geralmente, tem duas grandes missões: engajar e desenvolver pessoas; e gerir processos com foco em resultados. Manter o equilíbrio entre as duas missões não é uma tarefa fácil. Quando ministro programas executivos de liderança, apresento o dilema do Mirante para exemplificar o movimento entre esses dois papéis. 

Mirante é o lugar onde se descortina paisagens, é um local elevado com vista privilegiada. O “mirante” é o local por onde os líderes devem se movimentar estrategicamente. O grande desafio está em saber o momento certo para ser hands-off (sair da microgestão para descortinar o que está acontecendo no mercado, empresa e equipe) e descer para ser hands-on (pôr a mão na massa) na medida certa.

Mas como o Dilema do Mirante afeta a demissão? 

O movimento do hands-off para o hands-on e vice-versa, feito no momento certo, dá ao líder mais propriedade para avaliar, desenvolver, acompanhar e avaliar os seus liderados. Quando o líder atua com eficácia em todos esses eixos e mantém a prática do feedback constante com elaboração de planos de desenvolvimento, garante a imparcialidade na tomada de decisão. 

Quando um executivo me apresenta esse dilema relacionado a demissão e investigo os motivos pelos quais ele não está se sentindo bem, sempre encontro algum “dever de casa” que não foi cumprido por ele. Isso aumenta o sentimento de culpa no ato da demissão. 

Se o liderado está sendo demitido e nunca recebeu um feedback franco e honesto, não tinha clareza dos resultados esperados e muito menos teve a oportunidade e apoio necessários para desenvolver seus gaps de performance, isso compromete a percepção de humanidade que esse momento requer. Afinal, quando a jornada do colaborador termina, o processo precisa ser conduzido com muito respeito. 

Chamado por algumas organizações de offboarding (processo de desligamento de colaboradores e funcionários), esse processo precisa seguir algumas etapas para que o líder se sinta mais seguro e menos desconfortável. 

Como fazer uma demissão humanizada? 

O conceito de demissão humanizada ou offboarding humanizado surgiu para tornar o processo menos doloroso e resguardar a imagem institucional da organização. É uma ação que não finaliza no momento do desligamento, mas que pode se estender para o momento pós-desligamento com a oferta de outplacement, por exemplo. 

Seja qual for a estratégia, o líder precisa cumprir suas responsabilidades para que o desligamento seja justo, transparente e respeitoso. Afinal, essa ação faz parte do Employee Experience (experiência do funcionário) com a empresa e com o líder. 

Abaixo, algumas práticas que antecedem a demissão. Ações que garantem uma gestão empática e efetiva: 

  • Adote um modelo de gestão transparente, deixando claro para o funcionário as expectativas da empresa, responsabilidades, resultados, indicadores e como ele será avaliado; 
  • Crie um ambiente seguro psicologicamente para que os funcionários consigam expor suas dificuldades sem o receio de serem rotulados ou reprimidos;
  • Planeje uma rotina de acompanhamento, avaliação e feedback. Atenção: feedbacks positivos devem ser fornecidos também; 
  • Comunique-se constantemente e seja disponível para ouvir com atenção plena; 
  • Não se limite a reuniões de resultados. Organize reuniões de planejamento, troca de experiências, capacitação, reconhecimento, celebração, apresentação de resultados etc. Essa diversidade de momentos promoverá engajamento e sentimento de pertencimento; 
  • Tenha um “diário de bordo”! Manter um registro sobre as ações da sua gestão, feedbacks dos liderados, planos de desenvolvimento etc. é imprescindível para a tomada assertiva de decisões. 

Com uma gestão efetiva, é possível fazer um desligamento humanizado. Sem isso, qualquer demissão, por mais que o líder tente agir com respeito e consideração, será vista como algo injusto e “cruel”.

Para fazer uma demissão humanizada: 

  • Revise todas as informações relativas à jornada do funcionário na empresa e se certifique de que a demissão está de acordo com as políticas da organização;
  • Informe ao RH e ao setor jurídico para que providências administrativas sejam encaminhadas; 
  • Convide o RH para participar desse momento (dependendo da política interna da empresa); 
  • Escolha um local adequado para a reunião – opte por um ambiente reservado para que as partes possam se expressar livremente sem interferências; 
  • Anuncie a demissão pessoalmente – evite o desligamento a distância ou indireto. O contato pessoal é mais respeitoso e é justo que o colaborador seja demitido pela pessoa que o acompanhou durante toda a sua jornada. 
  • Seja empático, educado e gentil – trate o colaborador com consideração, paciência e esteja aberto a responder perguntas. Abra a reunião informando que deseja conversar sobre a relação de trabalho de vocês e que não tem boas notícias.
  • Apresente o histórico (metas de desempenho anteriores) que apoia a demissão, mas evite conversa fiada. 
  • Se a empresa está demitindo sem motivo relacionado ao desempenho do funcionário, diga que a conversa está relacionada à relação de trabalho e, na sequência, informe os motivos pelos quais essa relação está sendo encerrada. Peça feedback sobre a jornada vivida por ele e se coloque à disposição para responder as suas dúvidas. Ao final, encaminhe-o para a formalização do processo, agradeça a contribuição dele e deseje sucesso no seu novo ciclo. 
  • Se a empresa está demitindo pelo desempenho ou por problema de conduta, é importante resgatar os feedbacks anteriores (apresentar dados dos acompanhamentos e resultados) e na sequência informar o encerramento da relação de trabalho. Peça feedback sobre a jornada vivida por ele e se coloque à disposição para responder as suas dúvidas. Ao final, encaminhe-o para a formalização do processo, agradeça a contribuição dele e deseje sucesso no seu novo ciclo. 
  • Atenção: Para desligar colaboradores que tiveram desvio de conduta e/ou comportamentos agressivos, elabore, com antecedência, uma estratégia com o RH e com o setor jurídico da empresa. 

Recomendações finais: 

  • Evite demitir às sextas-feiras. O início de semana é mais apropriado para dar continuidade aos trâmites formais da rescisão e permitir ao colaborador a oportunidade para fazer contatos. 
  • Evite falar frases, tais como: “entendo como você está se sentindo”, “é melhor para você” ou “você deveria ter mudado de comportamento antes”; enfim, frases que deixem o momento mais constrangedor e exponha o funcionário; 
  • Registre o que o funcionário disse na reunião. Isso poderá contribuir para que a empresa melhore seus processos, enquanto você, o seu modelo de gestão;
  • Não esqueça a entrevista de desligamento.
  • Lembre-se: você faz parte de um sistema e, desta forma, pode passar pela mesma situação do seu liderado. 

Reflexões importantes para as empresas: 

O processo de outplacement é um suporte importante para o colaborador;

Os benefícios devem estar alinhados às necessidades atuais do mercado de trabalho. 

Nesta coluna, trarei para você assuntos relacionados a carreira, liderança, coaching e tendências sobre os assuntos. Contribua deixando sua pergunta ou sugerindo um tema de sua preferência, comentando este post ou enviando mensagem para o meu instagram: @delaniasantoscoach

Será maravilhoso ter você comigo nesta jornada. Até a próxima!

*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora