Há poucos dias eu transitava entre narrativas de vidas quando escutei uma frase mais ou menos assim: “eu quero chegar nessa fase de esperança que tu tem”. Sorri de olhos e dentes, e ouvi nova entonação que também me colocava como “uma pessoa de esperança”.
Fiquei alguns minutos entre risadas e constatações, e depois segui pelo silêncio de minhas memórias, reconhecendo em tantas etapas de vida o quanto a esperança domina-me. Estou sempre à espera…
Antes, quando eu era mais nova, costumava esperar e planejar grandes momentos de vida, acontecimentos estonteantes que tantas vezes viraram relatos nos meus diários de moça.
Com o passar do tempo, mantive minhas esperas, mas passei a aguardar - além dos grandes acontecimentos de vida - pelos detalhes, miudezas que também fazem histórias dentro de nós, transformando lugares, pessoas, músicas, e tanto mais, em infinitos.
O vento que sopra entre as flores crescidas no jardim de casa; a luz brilhante do sol pouco antes de se pôr, que perpassa de forma estratégica a veneziana da sala; a chegada avassaladora ao bairro da infância para o café da tarde na calçada; o pão quente ao meu alcance, e a poucos metros de distância.
O amanhecer feito paisagem na varanda, e a própria varanda da rede que se faz traçado e textura entre as nossas memórias que vêm dos autos das infâncias. É como se as “grandes pequenezas” do dia a dia fincassem-se para sempre, feito marcas, na pele de nossas melhores lembranças.
Embora cultive e cative essas esperanças, sei o quanto é preciso coragem, entrega de vida, gasto de energia vital para manter acesa a chama de crer, desejar, almejar e lutar pelo que se acredita… Em um mundo de guerras, um país de descaminhos políticos, uma cidade em que as ruas nos mostram tantos semblantes de tristezas inúmeras. Sim, inúmeras.
É um ato de coragem focar nas esperas pelas chegadas; demorar no cheiro do café quente; morar por poucos minutos que seja no mar, muitas vezes último plano na rotina; na criança da vizinha que nasceu sorrindo de olhos fechados.
“Olha que céu bonito”, escuto em meio à escrita, e também me é motivo de para sempre habitar o mesmo lugar onde - nos alertou Mário Quintana - “vive uma louca chamada Esperança”. “É preciso dizer-lhe tudo de novo!” Será?