As férias terapeuticas e os escravos do tempo de fazer coisas

As férias nos oferecem uma oportunidade de sair da rotina mecânica, automática e nos conectarmos consigo mesmo, com os valores que norteiam nossa vida interior

As férias são momentos de darmos uma parada, de fazer uma pausa necessária para deixarmos de lado o que estávamos fazendo, para olhar para si e se dar o direito de nos divertir, de desacelerar e mudar de atividade e ritmo. O dever, o trabalho, muitas vezes nos afastam de nós mesmos, do prazer e do sentido da vida.

Quando eu perco a capacidade de ter prazer, a vida perde o seu sentido. Nos tornamos uma máquina e escravos do tempo de fazer coisas
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As férias nos oferecem uma oportunidade de sair da rotina mecânica, automática e nos conectarmos consigo mesmo, com os valores que norteiam nossa vida interior, reforçar nossa identidade e redefinir o caminho a seguir. Vejamos: Como tenho usado, organizado o meu tempo? É dedicado exclusivamente ao trabalho, aos estudos? Tenho me tornado um escravo/a do trabalho, dos estudos? Que memorias herdadas de meus avôs, me impedem de ser feliz?

Meu tempo é usado para ganhar dinheiro, buscar sobreviver ou só estudar? O que nos leva a fazer mais do que podemos e a dedicar todo o tempo a uma atividade? Além das necessidades materiais, minhas atividades seriam uma maneira de sermos amados e aceitos? Minha crença é: “sou amado pelo que faço e não pelo que sou?” E por isso, não paro de fazer coisas, por insegurança ou medo de não ser aceito e aos poucos vou esquecendo de mim mesmo?

Apesar de minha vida ser agitada, eu consigo guardar minha calma e respeitar o meu ritmo e fazer o que eu gosto? Já descobri qual é o meu ritmo, se lento ou acelerado e qual o período em que sou mais criativo e produtivo no decorrer do dia? Ele ocorre no começo da manhã, no final da tarde ou tarde da noite?  Tenho sabido aproveitar destes momentos? Tenho sido uma máquina de fazer coisas e não um ser humano que tem necessidades pessoais, intimas a serem preenchidas?

Estas perguntas são indispensáveis e necessárias. É nas pausas, nos domingos, nos feriados, nas férias que temos a oportunidade de fazê-las. Desde criança somos condicionados a ter pressa, a fazer o máximo de coisas num mínimo de tempo. Tudo é para ontem. Até no lazer ouvimos: “anda logo, menino/a”, “pare de sonhar” “se esforce para fazer”,“ seja perfeito, seja forte”. Como se, para ser aceito tenho que ser perfeito.

Não há espaço para o descanso, para a fraqueza, para falarmos e expressarmos nossos sentimentos. Sou educado, condicionado para receber ordens, para seguir o desejo dos outros, deixando de lado o meu próprio desejo. Quando paramos de fazer, de usar nossos músculos, nosso cérebro fica confuso e o coração está vazio e triste. Não se apresse em preenchê-lo com o barulho, leitura, vídeo games e redes sociais. Tudo isso nos leva a viver a vida dos outros em detrimento de vivermos nossa própria vida. 

Será no silêncio, na meditação, na reflexão que você vai deixar emergir suas verdadeiras necessidades. Enquanto você espera ser atendido em uma fila, não use o celular. Pare para se ouvir, para conversar consigo mesmo. O uso do tempo para agir fora, para fazer coisas, não levou em consideração nossa estrutura psíquica e necessidades interiores. 

Esta educação baseada em tarefas intermináveis, ameaças e constrangimentos está fadada ao nosso fracasso como ser humano. Temos respeitado essas alternâncias entre o tempo do trabalho e o tempo do silêncio, o tempo de realizar o desejo dos outros e o tempo de realizar o meu desejo, o tempo da agitação e o tempo da calma e da serenidade, fonte de equilíbrio e saúde mental, em nossa vida?

Temos incluído o silêncio, sobretudo se somos profissionais que falamos muito? Temos tido tempo para estarmos sozinhos, para nos fazer companhia, para estarmos juntos como casal, família, grupo e com Deus? Como organizamos o nosso tempo, será que reflete nossas prioridades, nossas verdadeiras necessidades? Não perca essa oportunidade para estar consigo e apreciar sua família.

Chegaram as férias escolares que termina mudando o ritmo da vida em família. Elas nos oferecem o recuo e a distância necessárias para ajustarmos nossa conduta e atitudes inerentes ao convívio familiar. Estamos aproveitando esse tempo para estarmos juntos, conversarmos, demonstrar meu interesse de pai e mãe pelo que meu filho/a está vivendo ou está sentindo? Ou continuamos cobrando, olhando para o seu desempenho escolar ou suas atividades?

Esses momentos de pausa, sejam nos finais de semana, feriados e nas férias, são oportunidades para nos colocar à escuta daquilo que habita nossas profundezas, e nos colocar à escuta do que meus filhos vivem e almejam. É o momento de a família lembrar os valores da vida. A espiritualidade tem um papel importante. Ela deve nos ajudar a rever nossos valores e o que é prioridade.

E você, como está usando esse momento de ter seus filhos todo o dia em sua casa? Está sendo umas férias terapêuticas? Ou seja, tem aproveitado para conversar mais com seus filhos, ter momentos de lazer, de conversas. Tem abraçado mais cada um de seus filhos? Tem demonstrado interesse pelo que cada um está sentindo e fazendo.? Tem dito que os ama, demonstrado seu afeto? Tem lembrado que para viver bem, precisamos cultivar valores, aprender a respeitar as diferenças, a controlar nossos impulsos, a ter que fazer escolhas em nossas vidas?

Muitas vezes concentramos nossa atenção em coisas materiais e esquecemos que a demonstração de afeto é indispensável para o desenvolvimento de cada ser humano.

Não podemos esquecer que precisamos alimentar nosso corpo físico com alimentos materiais saudáveis; alimentar nosso corpo psíquico refletindo compreendendo e clarificando o que dificulta o convívio comigo, com os outros e nos impede de ser feliz; alimentar nosso corpo espiritual com nossas orações e momentos de introspecção, meditação e silencio; alimentar nosso corpo social, aceitando e convivendo em harmonia com as diferenças de ritmos e ideias.

A meditação nos oferece o recuo e a distância necessária, para transformar nosso tempo em oportunidade de encontro e de mudança. A meditação nos convida a religar o que separamos tão frequentemente: pensamento e ação, vida interior e exterior, o espírito e o corpo, etc. Meditar, experimentar outra forma de viver o tempo, é um empreendimento essencialmente espiritual. E seu ponto de partida é o desejo de despertar do nosso ser para a vida.

A meditação procura nos despertar para a compreensão que o universo é maior do que aquilo que conhecemos e que existem regiões interiores inexploradas tão reais quanto o mundo físico e visível. A meditação nos permite descobrir que não há mudança no nosso tempo sem transformação do nosso coração e da nossa consciência. Aquilo que fazemos por hábito, sem pensar, escolher, torna-se, mais cedo ou mais tarde, fonte de insatisfação. Esses cuidados fazem a diferença entre aqueles que são felizes e os que fracassam. Faça de suas férias um momento terapêutico!