A reforma tributária em curso no Brasil representa uma das mais significativas transformações no sistema tributário desde a Constituição de 1988. No centro desse processo, as novas tecnologias surgem como ferramentas cruciais para alcançar os objetivos de simplificação, eficiência e transparência almejados. Contudo, a implementação dessas inovações demanda uma análise cuidadosa para garantir que elas, de fato, simplifiquem a vida dos contribuintes, sem onerar ainda mais o ambiente de negócios.
Um dos pilares tecnológicos dessa reforma é a introdução da escrituração fiscal pré-preenchida, que promete revolucionar a forma como as obrigações tributárias são cumpridas. A proposta é que o fisco forneça uma prévia das informações fiscais, reduzindo erros e retrabalho. Contudo, é fundamental que esses sistemas sejam disponibilizados com antecedência para testes e homologação, permitindo que os contribuintes e profissionais de contabilidade possam se adaptar e assegurar que o sistema funcione sem gerar penalidades injustas.
Outro aspecto tecnológico relevante é a implementação do Split Payment, um mecanismo que divide automaticamente o pagamento dos impostos no momento da transação. Embora essa ferramenta possa melhorar a arrecadação e combater a sonegação, estudos internacionais, como o da União Europeia de 2017, indicam que o Split Payment pode sufocar o fluxo de caixa das empresas e aumentar os custos administrativos, especialmente em um país com uma grande diversidade de realidades empresariais como o Brasil.
A experiência dos últimos anos mostra que, embora a tecnologia possa ser uma aliada poderosa, ela também pode se transformar em uma barreira quando mal implementada. Desde o advento do SPED, observamos que as promessas de simplificação nem sempre se concretizam. Em vez disso, muitos sistemas tributários tornaram-se mais complexos, com um excesso de obrigações acessórias que frequentemente se sobrepõem e geram penalidades desproporcionais.
Para que a reforma tributária cumpra seu objetivo de simplificação, é imprescindível que as tecnologias propostas sejam desenvolvidas com foco na eficiência e na redução de custos de conformidade para os contribuintes. Sistemas robustos e confiáveis, capazes de lidar com a realidade de micro e pequenas empresas, são essenciais. Além disso, a integração e a padronização das obrigações acessórias devem ser prioridade para evitar redundâncias e simplificar o cumprimento das exigências fiscais.
Em conclusão, a tecnologia tem um papel central na reforma tributária, mas seu sucesso depende de uma implementação cuidadosa e orientada para as necessidades dos contribuintes. Somente assim será possível transformar o sistema tributário brasileiro em uma ferramenta de desenvolvimento econômico, em vez de um obstáculo ao crescimento. A participação ativa dos profissionais de contabilidade nesse processo será decisiva para garantir que essas inovações cumpram seu verdadeiro propósito.
Fellipe Guerra é presidente do Conselho Regional de Contabilidade do Ceará.