Por que a previsão de crescimento da economia brasileira é cada vez menor? Entenda

As previsões do Banco Central e do FMI são de um crescimento de PIB por volta de 0,30% em 2022, uma projeção que tem caído nos últimos meses

Quando a economia sofreu o golpe da pandemia em 2020, a expectativa era de que logo que os estabelecimentos reabrissem e tudo voltasse ao “normal”, haveria um crescimento em V. Esse, contudo, não é o formato que o gráfico de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) vem tomando. 

Em 2020, o PIB teve uma queda de 4,1%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os dados de 2021 ainda não foram fechados, mas o último boletim Focus do ano emitido pelo Banco Central previu um crescimento de 4,58%, superando em décimos a perda do ano anterior. 

Para este ano, as expectativas não são otimistas e vêm caindo semana a semana. O Banco Central prevê um crescimento de 0,29% no ano no último boletim divulgado, mas, no início de 2021, se esperava uma alta de 2,5%. Para o Fundo Monetário Internacional (FMI), a economia brasileira deve crescer 0,3% em 2022. 

Diversos fatores colaboraram para que as expectativas de alta não se concretizassem: o aumento na inflação e na taxa de juros durante todo o ano passado, o avanço da pandemia com a Ômicron no início deste ano e mesmo as instabilidades políticas de um ano eleitoral. 

Para reverter o quadro, o país depende de muitas condições que podem não ocorrer. 

Expectativas quebradas 

O administrador e professor de economia e negócios internacionais da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Marcos Antonio de Andrade, explica que as expectativas de crescimento são constantemente reajustadas pelos economistas com base no andamento da economia. 

São considerados, por exemplo, o desempenho do comércio, indústria e serviços, o consumo das famílias e o poder de compra. À medida que essas variáveis vão mudando, é comum que o que estava previsto não se concretize. 

“A gente tem que entender como funciona cada um dos setores, existem períodos de sazonalidade e períodos de maiores ou menores demandas. O comércio, por exemplo, nós temos algumas datas que são extremamente importantes para o consumo. Se você faz uma expectativa desse consumo e ela não é alcançada, vai comprometer os outros meses. Um grande exemplo disso é o Carnaval, janeiro e fevereiro vai ficar abaixo do que era esperado”, explica. 

O professor de economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Mauro Rochlin, avalia que a indústria foi um dos principais setores que decepcionou em termos de crescimento. 

A nossa indústria em particular vem se mostrando muito pouco competitiva para quem olha um horizonte de dez anos. Se olhar o crescimento nos últimos 10 anos ele é muito próximo a zero. O nível de produção é muito próximo ao de 2012"
Mauro Rochlin
professor de economia da FGV

A baixa produtividade da indústria tem a ver com uma falta de matéria-prima de forma global, o que prejudica a retomada. Mas, para além do desempenho dos setores produtivos, a alta da inflação e dos juros básicos também foram fatores que puxaram para baixo as expectativas. 

O IPCA fechou 2021 com variação positiva de 10,06%, bem acima dos 3,75% que o Banco Central almejava. A pressão inflacionária fez com que a Selic subisse, saindo da mínima histórica de 2% ao ano para 9,25% ao fim do ano – e a expectativa é que a taxa termine 2022 em 11,75%. 

Para a presidente do Conselho Regional de Economia Ceará (Corecon), Silvana Parente, a pressão inflacionária e a alta dos juros são os principais fatores que levam às perspectivas pessimistas para o crescimento do PIB. 

“Os níveis do poder de consumo caíram com a pandemia. Temos números de pobreza maiores e redução de consumo, isso pressiona para baixo a demanda na inflação. Isso gera uma ambiência de cautela por parte dos investidores e dos consumidores também, que estão bem endividados. Isso tudo dificulta a retomada da economia”, acrescenta. 

Instabilidade política 

O clima de incerteza diante de um ano eleitoral também prejudica as expectativas do mercado. Mauro Rochlin aponta uma "crise institucional" que estourou no último dia 7 de setembro, o que prejudica a visão dos investidores sobre o país. 

“Isso fez com que o mercado entendesse que o discurso que o presidente representa passasse também a representar um cenário mais incerto. Isso aumentou a aversão ao risco dos investidores. O mercado passou a ver muito mal esse discurso e viu que isso representa risco para o mercado”, critica. 

A aprovação da PEC dos Precatórios no final do ano passado foi vista com maus olhos pelo mercado como uma forma de furar o teto de gastos. A possibilidade de exceder os gastos públicos e aumentar a dívida pública afasta investidores, diz o economista. 

Para Marcos Antonio, todo ano eleitoral traz um nível elevado de incerteza, principalmente quando se fala de uma disputa presidencial.  

Em um ano de eleição os governantes vão fazer movimentos para que eles possam angariar votos. Principalmente para atender anseios da população, obras públicas, campanhas publicitárias para divulgar resultados. Isso faz com que recursos que deveriam ser direcionados para a cadeia produtiva sejam desviados para esses objetivos".
Marcos Antonio de Andrade
administrador e professor de Economia e Negócios Internacionais da Universidade Presbiteriana Mackenzie

Silvana Parente considera que as expectativas podem ser alteradas a partir do segundo semestre deste ano, quando for descoberto o programa econômico do próximo presidente. 

Agravantes 

“Não existe nada ruim que não possa piorar”, pontua Rochlin. Apesar de as expectativas não serem otimistas, algumas variantes podem reduzir ainda mais a projeção de crescimento da economia brasileira. 

Uma nova onda da pandemia pode levar a um novo fechamento dos estabelecimentos e desestabilizar a cadeia internacional de logística que começa a se recuperar.  

Outro ponto que pode prejudicar as expectativas ainda baixas de crescimento é a crise hídrica. Caso não chova como esperado, pode ser necessário estender por mais tempo as bandeiras tarifárias, encarecendo a energia e aumentando os custos de toda a cadeia produtiva. 

“Outro problema relativo a crescimento econômico é uma alta na taxa de juros americanas. Se eles perceberem que a inflação está muito persistente podem aplicar uma política de juros muito severa. O mercado não está esperando isso, espera a taxa abaixo de 2% ainda. Mas algum problema pode vir daí. A gente pode ter um dólar mais caro”, diz Mauro. 

É possível reverter? 

Assim como fatores podem prejudicar a situação, o economista da FGV também considera variáveis que podem tornar o cenário mais otimista. Uma delas são as safras deste ano, que podem ter boa produtividade caso chova bem. 

“A gente não pode ter nenhuma zebra em termos de pandemia, setor de serviços tem que deslanchar, não podemos ter nenhum tipo de dúvida com relação a uma retenção do funcionamento de tudo”, analisa. 

Marcos Antonio reconhece que as variáveis que podem melhorar o desempenho da economia neste ano não estão nas mãos do governo. É difícil prever o que pode acontecer. 

“Se você perguntar para qualquer economista o que fazer para colocar a economia brasileira nos trilhos, o problema é que não tem vontade política, estrutura política ou jurídica para fazer isso. Hoje quem controla o que o Brasil vai ser ou deixar de ser não é o presidente, é o congresso”, destaca. 

Ceará na contramão 

Conforme a presidente do Corecon, as perspectivas para o estado são mais promissoras do que para o restante do país. O desempenho cearense tem se mostrado acima da média nacional em indicadores como o IBCR. 

“Governo do estado tem investimentos públicos positivos, equilíbrio das contas fiscais, parceria entre governo estadual e setor privado. Isso em um nível estadual se torna um pouco mais favorável, fazendo que os indicadores para o Ceará sejam melhores do que os do Brasil em termos de crescimento”, observa.