No mesmo ano em que foi lançada a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), três cidades do interior do Ceará (Beberibe, Cascavel e Pindoretama) recebiam uma iniciativa-piloto voltada para a difusão da Educação Financeira e Educação Fiscal na sala de aula. Por meio de jogos de tabuleiro e de cartas, crianças e adolescentes foram apresentados a conceitos de poupança, empreendedorismo e investimento - e tudo que faz parte desse universo, como impostos.
Um dos jogos que contribui para a difusão dos temas é o "Bons Negócios", que em 2024 ganhou uma versão contemplando ainda mais a Educação Fiscal: a brincadeira simula uma loja, na qual o jogador vende, lucra e arca com as obrigações tributárias.
“Neste ano, nós trouxemos essa revitalização, mostrando as questões tributárias de uma empresa. Temos a roleta das obrigações, ensinamos que, se houve lucro, o jogador paga um imposto sobre esse lucro (CSLL); se há funcionários, paga contribuição previdenciária e por aí vai”, explica Luis Salvatore, presidente do Instituto Brasil Solidário (IBS), responsável pelas ações.
Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), o IBS conta com uma aliança de financiadores privados interessados em desenvolver a Educação Financeira e Fiscal no País. Entre os nomes que viabilizam a iniciativa estão Bank of America, BTG Pactual, Instituto XP, B3 Social e Nubank, além de pessoas físicas.
Se trata da pauta do desenvolvimento social, do papel das empresas, que ganham futuramente com estudantes e profissionais mais qualificados
Para Salvatore, agregar as obrigações fiscais ao jogo fornecem ao aluno “um espelho muito melhor da operação para se alcançar o resultado”.
“Nós não contávamos com isso (da Educação Fiscal nesse jogo) de forma tão intensa assim. Foi observando as necessidades da sociedade e as oportunidades que trouxemos isso”, explica Salvatore, destacando ainda que estão sendo lançados outros jogos que trazem de forma mais enfática outros temas como alimentação saudável e educação ambiental.
Mais de 100 mil alunos impactados no Estado
No Ceará, as iniciativas já atingiram 34 municípios desde 2017 e impactaram 152,7 mil alunos da rede pública. Ultrapassando as fronteiras do Estado e do Nordeste, os projetos chegaram a 416 municípios brasileiros, para mais de 1,4 milhão de estudantes. Além disso, Chile, Colômbia, México, Uruguai, Argentina e El Salvador também receberam os projetos.
A brincadeira de aprender acontece por meio de parcerias do IBS com as escolas públicas e conta com a capacitação dos educadores. De acordo com o Instituto, a plataforma para auxiliar na qualificação dos professores possui cerca de 320 habilidades alinhadas a BNCC com o objetivo de contribuir na elaboração dos planos de aula e incluindo as atividades de forma transversal e interdisciplinar.
Educação Fiscal em escolas particulares: uma lacuna reconhecida
Depois dos passos percorridos pelo projeto, municípios, estados e países alcançados, Salvatore revela que o instituto deve trilhar novos passos em 2024, levando os jogos de Educação Financeira e Educação Fiscal para as escolas particulares.
A reportagem procurou o Sindicato dos Estabelecimentos de Educação e Ensino na Livre Iniciativa do Estado do Ceará (Sinepe-CE) para entender quais iniciativas o sistema privado têm adotado para difundir o tema nas salas de aula e de que forma, bem como quantas escolas particulares contam com a temática em seus projetos pedagógicos.
A instituição afirmou apenas que, por se tratar de um tema transversal e não de uma disciplina obrigatória, é mais difícil ter esse panorama.
O coordenador do Sindicato dos Fazendários do Estado do Ceará (Sintaf-CE), Luiz Carlos Diógenes, corrobora que a chegada da Educação Fiscal de forma eletiva ajuda a explicar o motivo de ainda não haver tanta aderência da rede privada à abordagem do tema. Ele lamenta que o assunto ainda seja timidamente trabalhado nessa esfera.
“A Educação Fiscal é uma matéria muito oriunda das secretarias fazendárias, inclusive para ela estar hoje como disciplina eletiva é porque o assunto foi muito trabalhado nas conferências há dez anos, vinte anos. Ela estar ou não nas escolas particulares é algo que vai depender muito do projeto político-pedagógico e dos próprios interesses da escola”, destaca Diógenes.
Ele defende a importância não apenas da difusão do tema nesses espaços, mas também a abordagem da Educação Fiscal com um hiato menor entre o que é discutido em sala de aula e o que vem sendo abordado mundo afora, nas conferências sobre o tema.
“Precisamos de uma política educacional com foco na Educação Fiscal com sustentabilidade, com um olhar ecológico para termos uma consciência cidadã instaurada desde o público infantil. Consciência crítica cidadã desde cedo”, exemplifica.