Fisioterapeuta de formação, Lauana Crysney teve o seu primeiro contato com a confecção de doces ainda no colégio, em um projeto sobre empreendedorismo. Desde então, ela nunca abandonou a cozinha, mas foi perto da festa de formatura em Fisioterapia que ela teve a ideia: fazer os doces para vender e pagar a festa.
Hoje, ela trabalha como fisioterapeuta e, no tempo livre, produz em casa os doces por encomenda e também para venda no condomínio em que mora. A divulgação é feita pelo WhatsApp, em um grupo de vendas do prédio.
Além de gerar uma renda extra, o trabalho permite flexibilidade e a comodidade de trabalhar no conforto do lar, perto da família. Mas Lauana pontua que trabalhar de casa exige uma excelente organização. "Preciso saber exatamente o valor gasto com gás, água, energia e tempo para poder conseguir uma renda com os doces", diz.
Além da organização, para não confundir os custos do negócio com os custos pessoais, do lar, é preciso ter disciplina ao estabelecer a rotina de trabalho, conforme aponta a articuladora da Unidade de Competitividade dos Negócios do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas no Ceará (Sebrae/CE).
"Esse empreendedor precisa estabelecer uma rotina de trabalho dentro de casa, para não confundir o horário de trabalho com as tarefas domésticas. É preciso definir qual é o horário do trabalho e qual é o horário da família", pontua Alice.
Ela avalia que um dos ramos que apresentou elevado crescimento ao longo dos últimos dois anos foi o da alimentação. "É um ramo que já existia, mas avançou muito na pandemia, com doces, cookies, produtos salgados. E essas pessoas se utilizam da internet para vender esses itens.
Perfil de negócios no lar
Além do perfil de empreendedores do ramo alimentício, que produzem em casa e vendem por meio da internet, em aplicativos de delivery ou por meio das redes sociais, há os negócios que possuem o que Alice chama de "cunho tecnológico".
"São pessoas que trabalham com desenvolvimento de softwares, plataformas, estratégia. Essa é uma categoria composta por jovens, entrando agora no mercado de trabalho, sendo que muitos trabalham até para empresas de fora do País.
Alice também destaca o ramo de vestuário, especialmente os brechós, como negócio no lar que teve um crescimento nos últimos anos. "São os brechós que funcionam via internet. Toda a operação deles é online, onde são ofertados os produtos, acontece a venda e os entregadores de app levam até o comprador".
Quem empreende em casa
- Jovens da área de tecnologia;
- Mulheres, mães, que veem no empreendedorismo no lar uma oportunidade de estarem perto da família.
A maquiadora Sarah Letícia também empreende no lar, mas foge desse perfil. Ela divide o próprio quarto com o seu ateliê de maquiagem, onde atende às clientes e divulga seu trabalho nas redes sociais.
A atividade começou quando Sarah cursava o terceiro ano do ensino médio. "Comecei a maquiar minhas amigas para aniversários, festas e casamentos. Não cobrava nada, davam o valor que queriam, R$ 15, R$ 20. Fui juntando esse dinheiro e comprando alguns produtos".
Para ela, uma das principais vantagens de empreender em casa é não ter que se deslocar. "É estar pronta a qualquer horário, sem precisar me deslocar até ou endereço onde fica o ponto", diz ela, que também atende em domicílio quando solicitado pela cliente.
"As pessoas podem me procurar às 4h da manhã ou às 23h, eu vou atender sem dúvida. Fica bem mais prático e confortável. E considerando a situação atual do País, os gastos são bem menores, pago somente um aluguel, uma conta de energia, uma conta de água. Bem mais econômico e o meu lucro é maior", avalia a maquiadora.
O ônus de empreender no lar, para Sarah, é que, ao receber clientes em casa, o ambiente deixa de ser mais íntimo. "Para muitos, casa é algo para se relaxar, algo mais íntimo, para amigos. Isso se perde muito quando a gente empreende em casa, com o fluxo grande de clientes a casa não é mais tão íntima assim".
Empreendedorismo no lar
Utilizar o espaço doméstico para empreender não se trata de uma novidade, porém a prática ganhou novos contornos após a transformação de mercado provocada pela pandemia de coronavírus.
"Durante a pandemia, isso se mostrou muito forte por causa da questão de não poder se deslocar para desenvolver a atividade pretendida", diz Alice Mesquita.
Além disso, a elevação de custos como energia elétrica, aluguel comercial e outros custos necessários à manutenção de um negócio não só propiciaram o nascimento de negócios no lar, mas também levou negócios antes situados em estabelecimentos comerciais para dentro das casas.
Organização com os custos e disciplina são fatores importantíssimos para o sucesso de um negócio que começa dentro de casa, mas eles obviamente não são os únicos necessários o crescimento da empresa.
De acordo com Alice Mesquita, primeiramente é preciso um planejamento de negócio. O empreendedor deve entender sobre a dinâmica da atividade na qual deseja empreender e também precisa definir qual nicho de mercado pretende atingir.
Veja as dicas
- Tenha um planejamento do negócio: o empreendedor deve saber o que ele quer do seu negócio e entender a dinâmica da atividade;
- Entenda qual nicho de mercado você deseja atingir: estude canais de distribuição dos produtos, meios de pagamento e o caminho entre a produção e a chegada do produto até o cliente;
- Saiba do quê você precisa para trabalhar: há atividades que exigem uma cadeira, mesa e computador com acesso à internet. Outras, como o ramo da alimentação, exigem materiais adequados como formas, panelas, material de proteção e etc.;
- Busque sempre se atualizar: pessoas que empreendem em casa acabam não tendo a troca de experiências que teriam em uma atividade presencial, então é fundamental se manter atualizado.
- Verifique se existe a legislação específica que rege a sua atividade: quando se trabalha pela internet, há leis que o empreendedor precisa conhecer. Estudar essa legislação é fundamental.
Empreendedorismo por necessidade
Há quem veja no empreendedorismo no lar como algo que dê prazer, gerando uma renda extra, mas o economista Alex Araújo avalia que essa atividade ainda está, em geral, muito ligada ao empreendedorismo por necessidade.
"O mercado de trabalho não consegue absorver grande parte da população e uma alternativa usada por essas pessoas é iniciar a atividade empreendedora na residência, sendo essa uma forma de reduzir custos".
Ele corrobora que a internet facilita o empreendedorismo no lar, já que as pessoas podem divulgar produtos, serviços e efetuar vendas virtualmente.
"O crescimento do empreendedorismo está muito relacionado a um mercado de trabalho mais fraco, apesar da visão positiva que se tem, então reflete uma fragilidade econômica mais do que uma potência", pondera Alex Araújo.
Futuro da economia para quem empreende
Questionado sobre o que é possível esperar da conjuntura econômica no próximo ano para quem empreende no lar e, de certa forma, também fora dele, Alex Araújo ressalta que o futuro está atrelado ao resultado das eleições.
"Vai depender de qual será a plataforma econômica escolhida para tentar reanimar a economia, de qual será o papel da política pública. Uma eventual retomada está ligada às medidas econômicas que serão adotadas", afirma o economista.
Nesse sentido, ele espera a consolidação do Sistema Nacional de Garantias de Crédito, regulamentado em agosto do ano passado pelo Governo Federal por meio do Decreto nº 10.780. "Permite que grande parte desse público tenha acesso ao crédito. Com o novo governo, vamos saber qual será a ênfase dada a esse sistema. Sem dúvidas, a falta de crédito é uma enorme restrição para quem empreende".