A praticidade experimentada pelo consumidor nas compras pela internet - impulsionadas pelo isolamento social - traz a reboque os riscos das transações realizadas no meio online.
Visualizado como uma tendência no pós-pandemia, esse comportamento, na avaliação de especialistas da área do Direito do Consumidor, acende um alerta para os cuidados que devem ser tomados nessas operações. Thiago Fujita, presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil no Ceará (OAB-CE), lembra que no e-commerce normalmente os produtos são mais baratos em relação ao varejo físico, mas destaca que o consumidor não pode deixar de desconfiar das ofertas "com preços baixíssimos".
"A orientação é não acreditar em ofertas milagrosas, com preços muito abaixo do mercado. Consulte informações sobre a empresa", orienta. Ele também destaca que o consumidor não deve se deixar levar pelo layout da página. "Às vezes o site parece com o de uma loja conhecida, com as mesmas cores, o mesmo nome. Quando você olha o link, na parte de cima do site, vê que se trata de uma página falsa", detalha Fujita.
Além disso, o presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB-CE também faz um alerta para as compras por redes sociais, onde também são muitas vezes propagadas ofertas falsas de sites fraudulentos.
"Muito cuidado com mensagens oferecendo produtos nas redes sociais ou com telefonemas. Desconfie se você nunca negociou com aquela loja e ela está enviando spam. É importante estar sempre atento aos links enviados por Whats-App", pontua Fujita.
Com o avanço das compras online, ele avalia que os próprios órgãos de defesa do consumidor terão que se moldar à tendência, proporcionando um atendimento cada vez mais facilitado às pessoas que precisem reivindicar seus direitos como consumidores.
"Será necessário cada vez mais facilitar a forma de o consumidor exercer sua reclamação. Acredito que essa pandemia já tenha provocado muitas mudanças nesse sentido, ajudando esses órgãos a se digitalizarem cada vez mais. Assim, o consumidor evita pegar longas filas", destaca.
O Procon Fortaleza, por exemplo, disponibiliza para reclamações a Central de Atendimento 151, o (85) 98970-9101 e o aplicativo Procon Fortaleza. A diretora da entidade, Cláudia Santos, recomenda que antes de adquirir determinado produto ou serviço online, o consumidor deve verificar informações como o Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) da empresa, se ela possui endereço físico "e idoneidade junto aos órgãos de defesa do consumidor".
"Ele também deve perguntar a outras pessoas que já compraram naquele site e verificar se ele normalmente atende às reclamações feitas pelo consumidor", detalha Cláudia.
Além disso, ela também pontua que a melhor forma de pagamento é o cartão de crédito, já que isso facilita o estorno, se necessário. "Quando você deposita um dinheiro em conta, é mais difícil de reaver", diz, acrescentando que é interessante desconfiar de lojas online que não aceitam pagamento por cartão, apenas por depósito em conta.
Compras no exterior
O hábito de fazer compras pela internet faz parte da vida da microempresária Nyara Cavalcante há muitos anos. Durante o período de isolamento social, porém, ela acabou intensificando a prática.
"Compramos uma caixa de ferramentas, um filtro para o nosso purificador e roupas. Os produtos chegaram tranquilamente e eu até teria comprado mais se não fosse o frete tão alto", diz Nyara. O único problema nas aquisições online durante a quarentena, de acordo com ela, foi com algumas compras efetuadas em sites de ofertas de fora do Brasil. "Nós compramos alguns utensílios de cozinha em um site chinês há cerca de dois meses. Já deviam ter chegado, mas até agora 'nem sinal", lamenta a microempresária.
Apesar de ainda estar aguardando os produtos que não chegaram, ela pretende continuar fazendo compras online. "Eu já tenho esse hábito. Não sei se vou comprar mais do que eu já comprava, mas tem algumas coisas que eu considero que vale muito a pena continuar comprando online e a pandemia reforçou que existem vantagens de comprar e receber em casa", avalia.
A diretora do Procon Fortaleza explica que, no caso de compras realizadas fora do Brasil, o consumidor deve observar que normalmente há uma empresa brasileira fazendo a intermediação.
"Nesse caso, a intermediadora brasileira entra como responsável solidária. Se o próprio vendedor não resolver, a empresa que está intermediando a compra deve ser a responsável solidária pelo problema, porque ela também lucra com aquela relação de consumo", explica ela.
O Programa Estadual de Defesa do Consumidor do Ministério Público do Ceará (Decon) orienta aos consumidores optarem por sites brasileiros na hora de fazer compras online. "Além do prazo de entrega mais curto, os e-commerces brasileiros são regidos por leis nacionais criadas para amparar o consumidor no momento da compra", informa.
O Decon também reforça que o consumidor deve evitar fazer depósitos bancários em nome de pessoas físicas. "Isso pode ser um indício de que a empresa não trabalha corretamente", acrescenta.
Reclamações
O Procon Fortaleza fez 49 atendimentos relacionados a compras pela internet entre 1º de março e 30 de junho, 30% a menos que em igual período do ano passado, quando foram registradas 70 reclamações e o órgão podia contar com o atendimento para registro presencial.
No Decon - que também reforçou o atendimento virtual na pandemia -, entre o dia em que foi decretado pelo Governo do Estado o isolamento social, 20 de março, até ontem, foram registrados 373 atendimentos relacionados a compras de produtos, 44% a menos que em igual período de 2019, quando foram registradas 668 reclamações.
No País, o crescimento do e-commerce na pandemia se traduziu em avanço das reclamações de atraso na entrega dos produtos. Levantamento do site Reclame Aqui mostra que, entre março e abril deste ano, foram feitas na página mais de 192 mil queixas sobre atraso, sendo 118,4 mil só em abril, crescimento de 61% ante março (73,5 mil reclamações).
Empresas preparadas
Para o assessor jurídico do Decon, Ismael Braz, embora haja uma tendência de aumento das reclamações, as empresas têm se mostrado mais preparadas e sensíveis aos problemas dos consumidores.
"As empresas tiveram que se reinventar para oferecer seus produtos e serviços online. Para que ocorra essa venda, a empresa também precisa estar bem preparada para solucionar os problemas que podem acontecer", frisa.