Pioneiro nacional na produção de energia eólica, o Ceará poderá receber o primeiro parque eólico offshore (instalado no mar) do Brasil. Na última quarta-feira (11), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) realizou, em Fortaleza, a primeira audiência pública sobre esse tipo de empreendimento no País.
Na ocasião, foi apresentado o Relatório de Impacto Ambiental (Rima) do "Parque Eólico Offshore Caucaia", projeto da BI Energia, empresa que conta com capital brasileiro e italiano.
Segundo Lúcio Bonfim, sócio da companhia, a expectativa é de que até o mês de julho deste ano o Ibama emita seu parecer sobre o Rima e conceda a licença prévia para o empreendimento.
"Depois disso, vamos elaborar o projeto executivo, que deve levar cerca de doze meses. E, então, vamos solicitar a licença de instalação. A partir daí, com todas as licenças, serão dois anos de construção do empreendimento", estima Lúcio Bonfim.
Ao todo, o complexo prevê um investimento de 1,166 bilhão de euros, o equivalente a R$ 6,1 bilhões. Segundo Bonfim, os recursos sairão de empresas parceiras, investidores e fundos de investimentos.
"A nossa empresa, que atua na Itália, desenvolve projetos no Brasil há mais de 10 anos", ele diz. E embora o volume de investimento seja maior do que o de parques convencionais, a previsão é de que o retorno do investimento saia em sete anos, prazo similar ao dos projetos tradicionais onshore (em terra). De acordo com o relatório da BI Energia, o complexo poderá suprir até 30% da necessidade de consumo energético no Ceará. O projeto prevê a instalação de 59 aerogeradores, sendo 48 em mar aberto, capazes de gerar 576 megawatts (MW) de potência no total, e outros 11 com 2 MW de potência individual (22 MW no total) na extremidade de 11 molhes (estrutura costeira semelhante a um espigão) que serão construídos na ao longo da costa de Caucaia.
A potência prevista para o "Parque Eólico Offshore Caucaia" corresponde a cerca de 30% de toda potência eólica instalada hoje no Ceará.
Oportunidades
Como forma de compensação ambiental da instalação da usina, o projeto da BI Energia prevê a construção de quebra-mares. E a empresa responsável pelas obras poderá realizar, através de empresa subsidiária, a concessão plurianual das áreas marinhas dentro dos próprios quebra-mares, permitindo que essas áreas marinhas protegidas pelos quebra-mares sejam aproveitadas economicamente. Além do potencial econômico gerado pelo uso dos quebra-mares, Bonfim destaca que a intervenção deverá proteger as praias de Caucaia, do Icaraí, Tabuba e Cumbuco, do avanço do mar. "Esses 11 espigões vão resolver o problema da erosão em Caucaia, evitando que esse problema chegue a São Gonçalo do Amarante", ele diz.
Eficiência
Segundo Bonfim, por permitirem a construção de torres maiores, equipadas com grandes geradores, os parques eólicos offshore têm taxa de eficiência de produtividade acima de 60% do total da capacidade, enquanto usinas instaladas em terra não passam de 45% de aproveitamento.
"Além disso, no mar, você tem uma condição de vento muito superior à que se tem em terra. As grandes máquinas em operação em terra têm 4 MW de potência, enquanto no mar, você pode colocar uma máquina de 12 M", aponta o empresário.
Potencial do Ceará
O engenheiro Jurandir Picanço, presidente da Câmara Setorial de Energias Renováveis do Ceará (CS renováveis), avalia que o potencial offshore do Estado é "gigantesco". "No Ceará, foi avaliado em 117 GW. Maior que o onshore (94 MW). A qualidade do vento é melhor, os aerogeradores, por serem de maior porte, têm eficiência maior. Ocorre que o investimento é maior", aponta.
Quanto à viabilidade dos empreendimentos offshore, Picanço diz que depende de cada projeto. "No mundo, prevê-se que a energia eólica offshore deverá aumentar 15 vezes nas próximas duas décadas, transformando-a em US$ 1 trilhão em negócios. O mercado eólico offshore global cresceu quase 30% ao ano entre 2010 e 2018, beneficiando-se de rápidas melhorias tecnológicas. E os melhores locais para esses projetos poderiam fornecer mais do que a quantidade total de eletricidade consumida mundialmente hoje", diz.
O professor e consultor em energia João Mamede Filho avalia que, conforme os terrenos para a instalação de usinas no litoral fiquem mais escassos, a tendência é que o setor migre a geração para o mar e que, nesse contexto, o Ceará apresenta uma vantagem competitiva em relação a outros estados pela baixa profundidade do leito marinho a ser explorado.
"A energia offshore já é de uso comum na Europa pela falta de terras (para instalação dos equipamentos). Aqui, a questão ainda pesa pelo custo desses empreendimentos, que é bem mais elevado do que os do onshore", destaca o professor e consultor de energia.
"De todo modo, o Brasil deverá expandir sua produção para o mar e nós, no Ceará, temos essa vantagem da baixa profundidade, o que ajuda a viabilizar os projetos. Além disso, quanto à parte elétrica, no litoral nós não temos problemas de conexão".
Projeto
A construção de parques offshore ganhou forma com a aprovação pelo Senado, no final do ano passado, do projeto que regulamenta essa modalidade de geração. Os empreendimentos dependerão, agora, dos próximos leilões de energia lançados pelo Governo Federal.
Nas faixas de implantação determinadas pelo texto aprovado no Senado (entre 22 e 370 quilômetros da costa), a profundidade registrada no Ceará seria mais propícia a esse tipo de investimento, ficando em torno de 18 metros.