Brasília. A presidente Dilma Rousseff convidou Nelson Barbosa para o Ministério da Fazenda no lugar de Joaquim Levy, que deixou ontem (18) o cargo, depois de perder vários embates ao longo deste ano. A posse de Barbosa e de Valdir Simão, que assumirá o Ministério do Planejamento, está marcada para a segunda-feira (21).
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O mercado reagiu mal ao retorno de Barbosa, um dos criados da "nova matriz econômica", corrente que defende o Estado como indutor do crescimento, implantada no primeiro mandato de Dilma Rousseff, em contraposição à defesa ferrenha do tripé econômico: câmbio flutuante, metas de inflação e superávit primário, fundamentos seguidos nos dois governos de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010).
Ontem, Barbosa afirmou que não quer que sua nova gestão seja rotulada como "nova matriz econômica", nem "velha matriz". "Prefiro não ter debate sobre política macroeconômica com base em rótulos", disse ele, em entrevista coletiva no Palácio do Planalto. "É importante aprender com os erros e acertos do passado. Não estamos no governo para refutar teses, estamos preocupados em resolver problemas do presente para construir um futuro melhor", afirmou. O ministro disse que continuará mantendo o ajuste fiscal iniciado pelo antecessor.
"O foco continua sendo o reequilíbrio fiscal. Somente com estabilidade fiscal vamos ter um crescimento sustentável", afirmou. Segundo ele, aumentar a economia feita pelo setor público para pagar os juros da dívida é condição essencial para o controle da inflação e a retomada do crescimento. Barbosa e Valdir Simão devem definir a equipe de cada ministério ainda neste fim de semana.
Reformas importantes
Na sua primeira entrevista, Barbosa, ex-secretário executivo da Fazenda, rebateu o ex-ministro Joaquim Levy ao dizer que neste ano foram feitas importantes reformas na economia. Como exemplos, ele citou o endurecimento das regras para ter acesso aos benefícios trabalhistas e previdenciários, o Plano de Proteção ao Emprego (PPE) e a possibilidade de acordos de leniência com empresas investigadas em esquemas de corrupção, esta última medida foi anunciada hoje.
Pouco antes de deixar o cargo, Levy afirmou que "o governo parece ter medo de reformas". Para Barbosa, porém, "há várias iniciativas em andamento".
Barbosa admitiu que é preciso avançar mais nas reformas estruturais de longo prazo, a partir do controle dos gastos obrigatórios para aumentar a economia feita pelo setor público para pagar juros da dívida. Ele citou que a principal dessas reformas é a da Previdência, cujos gastos consomem 47% do orçamento.
Segundo Barbosa, o governo está construindo uma reforma da Previdência a partir da chamada fórmula 85/95 pontos (que permite aposentadoria integral quando a soma da idade mais o tempo de contribuição é de 85 pontos para mulheres e 95 para homens).
"A economia brasileira tem expertise para superar os desafios. Se cada um fizer sua parte, vamos conseguir superar os desafios de hoje mais rapidamente que as pessoas esperam", completou. Barbosa disse que o grau de investimento do Brasil voltará como "consequência" das medidas que estão sendo tomadas atualmente para a estabilidade fiscal. "Hoje, nosso principal desafio é fiscal", afirmou.
Dívida pública
Como consequência do ajuste fiscal, segundo o ministro, virão o controle da dívida pública, o recuo da inflação e a volta do crescimento. Ele afirmou que o principal desafio para o equilíbrio fiscal é o controle das despesas obrigatórias. O governo, de acordo com Barbosa, enviará medidas para controlar esses gastos, mas elas precisam de autorização do Congresso Nacional. "Há um tempo político para aprovação dessas medidas. Essas propostas vão promover uma melhora fiscal, contribuir para o crescimento, melhorar inflação e trazer de volta o grau de investimento".
Meta do superávit
Sobre a meta de superávit primário de 2016, Barbosa disse que ela está dada (0,5% do PIB) e que vai trabalhar para persegui-la. Ele afirmou que o desafio deste ano será pagar os passivos apontados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) das pedaladas fiscais. Questionado se adotaria o regime de bandas para o cumprimento do superávit primário nos anos seguintes, Barbosa disse que vai "discutir no tempo adequado".
Cotado
Barbosa já havia sido cotado para a Fazenda, quando Joaquim Levy assumiu. O seu nome estava na lista entregue por Lula a Dilma Rousseff com sugestões para substituir Guido Mantega.
Apesar das suas posições desenvolvimentistas e de apoio da expansão fiscal, Barbosa fez críticas, em 2014, ao que considerava gastos excessivos do governo. Ele não afirmava que havia um descontrole, mas defendia que o Orçamento engessado limitava a liberdade do governo para cortar gastos.
Saiba mais
Nelson Barbosa
Desde o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Nelson Barbosa vem ocupando diferentes cargos do poder. Entrou no governo em 2003, no Ministério do Planejamento, permanecendo até 2013, quando deixou a Secretaria-Executiva do
Ministério da Fazenda após rusgas com Mantega e o ex-secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin.
Na Fazenda, Barbosa já ocupou as secretarias de Acompanhamento Econômico (2007 e 08) e de Política Econômica (2008 e 10), antes de ser levado por Mantega ao posto de
Secretário-executivo, sucedendo Nelson Machado, em 2011.
Antes disso, também ocupou cargos no Ministério do Planejamento e no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Barbosa é bacharel e mestre em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e PhD pela New School for Social Research.
Valdir Simão
Valdir Simão é auditor de carreira da Receita Federal, mas nos últimos anos ocupou posições estratégicas em ministérios, secretarias e na Previdência Social. Conhecido por ser um "gestor eficiente", ocupou o cargo de secretário-executivo da Casa Civil. Simão também foi secretário-executivo do Ministério do Turismo entre 2011 e 2013, quando a pasta era comandada por
Gastão Vieira. Nesse período, atuou em projetos destinados a dar maior transparência e aumentar o controle de contratos e gastos previstos no orçamento da pasta, como a criação do Sistema de Acompanhamento dos Contratos de Repasse (Siacor), que monitora a execução dos convênios de obras de infraestrutura. Possui Master em Direção e Gestão de Sistemas de Seguridade Social pela Universidade de Alcalá (Espanha) e graduação em Direito pela Instituição Toledo de Ensino (SP).
O que eles pensam
Impasse não será resolvido
"Não mudou muita coisa. O Nelson Barbosa não vai alterar o problema que é de força política. Sem dúvida, o Levy tinha maior aceitação, esse não, mas ele vem sem nenhum rótulo, as pessoas vão ter que esperar para ver o desempenho. O nome atual que poderia ter comportamento diferente seria o Henrique Meirelles. O Nelson Barbosa se mostra com uma personalidade mais forte, mas o problema é como fazer as medidas serem aprovadas no Congresso. Apesar de tudo, é uma mudança correta do ponto de vista de não alterar muito as metas de uma área tão sensível em época de crise".
Célio Fernando
Economista
"O Levy demorou menos de um ano para entender que toda a receita ortodoxa de ajuste não ia funcionar porque a Dilma não tem governabilidade suficiente para emplacar, no Congresso, esse remédio amargo a ser prescrito. Talvez fosse a hora de mudar mesmo. O Barbosa é mais governista no sentido de acreditar nas mesmas coisas que o governo acredita, ele é um desenvolvimentista, enquanto o Levy é um cara mais ortodoxo. Ele não é um nome político que vai resolver a governabilidade e tecnicamente é um retrocesso. O mercado financeiro não vai gostar e a bolsa vai sofrer".
Paulo Matos
Professor de Economia do Caen