O Ceará perdeu 2,47 mil postos de trabalho em fábricas calçadistas, entre janeiro e novembro de 2023, segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados). O dado reflete a perda da competitividade e também alerta sobre a necessidade de políticas industriais para o setor.
Apenas em novembro, foram 1,62 mil vagas perdidas. Com isso, a indústria calçadista cearense encerrou o penúltimo mês do ano passado empregando 65,9 mil pessoas, 6,2% menos ante igual período em 2022.
Para se ter ideia, recentemente, o fechamento da Paquetá deixou centenas de desempregados.
O Ceará é o segundo maior empregador da atividade no País, mas a baixa nesse mercado de trabalho ocorre em toda a indústria nacional.
Em todo o Brasil, foram fechados 7,67 mil postos de trabalho. Para o economista e professor da Universidade de Fortaleza (Unifor), Ricardo Coimbra, o aumento das importações no comércio asiático prejudica o polo calçadista brasileiro.
“Os produtos produzidos na Ásia chegam no mercado nacional com preços mais baratos, gerando um excesso de competitividade que, muitas vezes, tem um impacto na incapacidade de manutenção dessas cadeias produtivas”, analisa.
Com a perda da lucratividade, as fábricas são obrigadas a fechar parte das operações. Coimbra observa haver necessidade de interferência na área do comércio exterior para proteger a indústria nacional ou criar ações de aumento de produtividade e de benefício fiscal.
“Processos de isenções e de defesas comerciais podem ser feitos por meio do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços para avaliar quais são os mecanismos de contenção contra esse crescimento da participação do produto asiático no mercado nacional”, frisa.
O professor universitário e conselheiro regional de economia (Corecon), Wandemberg Almeida, acrescenta que a taxa de juros também tornou o crédito mais caro e dificultou o acesso a empréstimos para as empresas investirem.
“É importante que os bancos, principalmente os públicos, possam com as nossas instituições, empresas, governo do Estado, municipais e governo federal possam criar mecanismos para manter esses empregos dentro dessas localidades”, diz, lembrando também ser importante a desoneração da folha de pagamento.
“Se não houver incentivos, investimentos e redução da taxa de juros, infelizmente, a situação vai se tornar ruim para o empresário dessa indústria. Neste momento, é importante a união de forças para continuar gerando emprego”, destaca.
O presidente-executivo da Abicalçados, Haroldo Ferreira, aponta que, ao longo do ano, até novembro, o mercado doméstico encolheu 6%, e o internacional mais de 14%, em volume. “É um período ainda muito complicado para o setor calçadista e, claro, o fato é refletido no emprego”, ressalta.
“Desde agosto, os calçados estrangeiros vendidos via essas grandes plataformas passaram a não pagar tributos de importação. É uma concorrência desleal diante de uma indústria nacional que paga seus impostos em cascata, como a nossa”, afirma.
Para repercutir o tema, o Diário do Nordeste também procurou a Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), mas não obteve retorno até a publicação desta matéria.
Otimista, Sobral diz estar na contramão
O presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Calçados de Sobral, Bartolomeu Monteiro de Moura, destacou que as taxas de juros, inovação tecnológica e a guerra da Rússia contra a Ucrânia afetaram o saldo de postos de trabalho do segmento em todo o País. Todavia, ponderou, no município, o cenário foi diferente, e o setor se manteve aquecido.
“Sobral tem um dos maiores polos calçadistas do Ceará e, em 2023, contou com a abertura da filial de outra grande indústria de calçados, contribuindo com os números positivos do ano, gerando outras centenas de empregos diretos e indiretos”, diz.
Dessa forma, acrescentou, “o sentimento para 2024 é de otimismo”. “Porém, com os pés no chão, pois sabemos que o mundo ainda continua em conflito. No entanto, é fato que a economia do Brasil apresenta índices de crescimento importantes e tem conseguido reconquistar a confiança dos investidores, aquecendo assim o setor produtivo do País”, avalia.