Ao passar pela catraca, os corredores, antes ocupados por vozes de quem está no caminho até o diploma, estão silenciosos há mais de 600 dias no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), em Fortaleza. Lá, há seis anos Eliete Vasconcelos, 40, integra a equipe de vigilância onde agora torce pelo retorno de estudantes e professores com quem trocava conversas e mantinha laços de confiança no processo de formação profissional.
No IFCE, Campus Fortaleza, estão matriculados 6.423 estudantes neste semestre letivo e, desde 18 de março de 2020, o instituto não tem aulas presenciais. A instituição oferece vagas no ensino médio, técnico e formações no ensino superior.
Desde de julho do ano passado, as aulas acontecem de forma virtual, mas um grupo de 26 concludentes deve voltar a frequentar o local para terminar as atividades em laboratórios.
“Eu saí de férias e a escola estava funcionando plenamente, mas quando eu retornei estava parada. Encontrei só a equipe de vigilância e foi um vazio muito grande, porque acabou aquele fluxo de gente”, lembra sobre março de 2020, quando as unidades de ensino fecharam.
Eliete observa o pátio central vazio - bem diferente de quando a fila para o lanche ia de uma ponta à outra. Na piscina antes agitada por quem aprendia a nadar ou treinava para competições, agora há calmaria.
“Estamos na expectativa pelo retorno porque a gente sente falta. Apesar da gente trabalhar bastante quando os alunos estão aqui, é um trabalho satisfatório”, pondera.
Entre as demandas da rotina anterior, a profissional da segurança também atuava como abrigo de vivências. “A gente guarda as histórias dos alunos, porque às vezes eles chegam para conversar, a gente acaba virando amigos deles”.
A vivacidade do local acontece porque “tem muito rodízio, a gente pega turmas dos três turnos, é muita gente”.
O olhar tímido de Eliete contrasta com a voz firme e a disposição para lidar com as demandas da instituição no que, nesse processo, tornou-se líder da equipe composta por 12 guardas. “Para mim é tranquilo, porque eu já conheço bem o sistema, as normas, e todo mundo é comprometido com o trabalho”, frisa.
Da recepção aos departamentos estudantis, a vigilante forma vínculos também com os demais profissionais da educação. “Quando a gente fica um tempo em um setor, a gente meio que cria uma intimidade com os professores, estamos sempre abrindo salas e resolvendo coisas”.
Essa proximidade fica evidente quando, durante a entrevista, um membro da gestão escolar descobre sobre a reportagem enquanto passa no corredor e deixa um elogio. “Se eu tivesse 10 Elietes aqui eu não teria problema nenhum. Apesar de que ela vale por 10”.
Rotina ainda afetada pela pandemia
Entre a casa no bairro José Walter e a Avenida 13 de Maio, onde trabalha, são cerca de 15 km percorridos de ônibus na semana e de moto nos plantões. Eliete vive com o marido e a filha de 19 anos, estudante de Psicologia.
No cotidiano de 12h trabalhadas para 36h de intervalo, a vigilante ouve as conversas sobre engenharias, química, eletrônica, mas a área da informática é que desperta o desejo de dar continuidade à formação.
Eu deixei de estudar quando minha filha nasceu, já são praticamente 20 anos e retornar fica muito difícil, sempre fico adiando e acabo não fazendo
Eliete atualmente acompanha a realização de fotos de formatura no Campus, mas já presenciou colações de grau e celebrações anteriores à pandemia. Durante as conclusões de curso, ela também percebe a participação da formação estudantil.
“Os alunos mesmo falam com a gente nesse sentido, a gente vira ‘tia’ de todo mundo, às vezes na rua eles reconhecem a gente e conversam. Ficamos com uma família”, reflete. Na sua análise, a instituição já está adequada para o retorno, pelo qual anseia, com segurança.