A tão falada curva de disseminação do novo coronavírus continua a subir no Ceará, em números absolutos, mas a taxa de evolução vem se mantendo estável há sete dias, de acordo com o levantamento estatístico do Instituto Ampla Pesquisa, divulgado ontem (31). A estabilidade ocorre desde o dia 23 de março e atingiu, na última segunda, a menor taxa de evolução. Para o estudo, que é voluntário, as medidas de isolamento social adotadas pelo Governo do Estado e gestões municipais começam a ser refletidas.
A análise do Instituto se baseia nos dados disponibilizados pelos informes e boletins epidemiológicos da Secretaria Estadual da Saúde (Sesa). Em números absolutos, o crescimento vem sendo de 21 a 44 casos por dia. No entanto, entre os dias 23 e 26 de março, o aumento médio variou de 12% a 14%. Entre 27 e 28, houve um ponto fora do patamar e o aumento foi de 18%. Nos dias seguintes, a taxa apresentou novas quedas de 14% e 11%, até chegar aos 6% registrados no início da semana, entre o domingo e segunda-feira.
"É um número a ser comemorado. Sabemos que ainda há muitas pessoas que precisam fazer o teste, mas trabalhamos com amostras e acreditamos que os números dos boletins são reais", explica Agliberto Ribeiro, diretor do Instituto. A análise considera que, se o Estado mantiver essa velocidade, "a curva chegará ao pico sem a temida sobrecarga no sistema de saúde público".
A principal medida apontada pelo Instituto para a estabilização dos números é o isolamento social em todo o território cearense, que completa 13 dias hoje. O primeiro decreto estadual estabelecendo a medida em vigor no dia 20 de março tinha validade por 10 dias, mas, no último sábado (28), o governador Camilo Santana anunciou a prorrogação da decisão até o dia 5 de abril.
"A decisão é baseada a partir de dados técnicos, científicos, que nossos especialistas em saúde e a Organização Mundial da Saúde estão orientando, e nas experiências que o mundo inteiro está vivendo", disse o chefe do Executivo estadual, ressaltando que as atividades essenciais continuam funcionando.
Agliberto Ribeiro lembra que o estudo não se posiciona a favor ou contra o isolamento, mas municia a população e as autoridades com dados técnicos para auxiliar na tomada de decisão. O diretor do Instituto afirma que a curva de confirmações, por natureza, vai continuar crescendo, mas ainda não se sabe por quantos dias. A equipe estatística aguarda outros boletins para ter um número "mais robusto" e, ainda nesta semana, elaborar novo exame que pode conter a probabilidade de quando o Ceará enfrentará o pico de casos.
A reportagem do Sistema Verdes Mares entrou em contato com a Secretaria da Saúde para saber se essa estabilização também vem sendo observada pela equipe de vigilância epidemiológica, mas não obteve retorno da Pasta até o fechamento desta edição.
Sistema Nervoso
Doutora em Neurofarmacologia e pesquisadora do Núcleo de Pesquisa e Desenvolvimento de Medicamentos da Universidade Federal do Ceará (UFC), Bruna Ribeiro Teles endossa que o isolamento social é um método importante para diminuir a curva de infectados pelo coronavírus. "Países que o ignoraram estão extremamente arrependidos diante do colapso do sistema de saúde, porque a demanda é bem maior que a capacidade hospitalar", diz, em alusão à Itália e à Espanha, onde vêm ocorrendo mais de 800 mortes diariamente.
No Brasil, o objetivo é evitar o colapso principalmente pela entrada de pacientes com problemas respiratórios mais graves, que demanda melhor atendimento. "Hoje, o número de assistências a esses pacientes, como respiração artificial e Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs), não é compatível com o número de pessoas que chegarem a ser infectadas e necessitarem de atendimento hospitalar se não for obedecido o isolamento social", garante.
A neurocientista demonstra apreensão com a competência que o coronavírus tem de provocar insuficiência respiratória, cujo sintoma assusta: "a sensação de estar morrendo no seco". "O coronavírus tem essa rápida capacidade de chegar ao Sistema Nervoso Central, atingindo os neurônios motores responsáveis pelos movimentos respiratórios", explica. Por isso, Bruna faz coro à campanha para que as pessoas permaneçam nas próprias residências.
Distanciamento
Nesta terça, o Diário do Nordeste revelou que 97% da população cearense aprova o isolamento social como medida de prevenção contra o vírus, e 96% estão saindo de casa apenas em caso de necessidade. As informações são de uma pesquisa do Instituto Opnus em parceria com o Sistema Verdes Mares.
Segundo Agliberto Ribeiro, da Ampla Pesquisa, não é possível traçar um cenário em que a população cearense não tivesse aderido ao isolamento. Para isso, seria necessário que as atividades cotidianas tivessem permanecido de 10 a 15 dias sem alterações após os primeiros casos, anunciados no dia 15 de março. "O Governo foi muito rápido em tomar essa decisão, e um dos primeiros do País", diz, notando que em outros estados "há picos assustadores" de contágio.
Até o momento, no Ceará, sete pessoas morreram em decorrência da Covid-19, segundo a Sesa. A evolução da doença, ou seja, o intervalo entre a identificação dos primeiros sintomas e o óbito, se deu entre quatro e 11 dias.
A Pasta destaca que, no distanciamento social - uma medida de prevenção não farmacológica -, todas as pessoas com mais de 60 anos que não exerçam serviços essenciais devem evitar comparecimento ao trabalho ou demais ambientes fechados, e que as idas a mercados e farmácias possam ser realizadas por outra pessoa do domicílio ou cuidador. A orientação do Governo do Estado do Ceará, do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde (OMS) é de continuidade da estratégia.