Trabalhadores denunciam falta de insumos, cirurgias canceladas e UTIs fechadas no Hospital da Mulher

Secretaria de Saúde de Fortaleza garante que "a unidade segue em pleno funcionamento"

Da falta de medicamentos e insumos básicos ao atraso nos pagamentos de profissionais, o Hospital e Maternidade Dra. Zilda Arns Neumann, no bairro Demócrito Rocha, mais conhecido como Hospital da Mulher de Fortaleza, tem acumulado diversos problemas. Os relatos são de trabalhadores e usuários da unidade.

O hospital, que atende todos os gêneros, é um dos 10 da rede pública municipal de saúde. Ao todo, possui 16 especialidades médicas (incluindo ginecologia e obstetrícia, cirurgia geral, traumatologia e cirurgia vascular), além de fornecer exames e serviços como banco de leite, leitos neonatais, salas para pré-parto e parto natural.

Uma das situações mais complicadas ocorre justamente na área neonatal. A falta de cateter de infusão, equipamento necessário para injetar medicações em bebês recém-nascidos, levou ao bloqueio de quatro leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal, desde a última sexta-feira (22). 

A denúncia foi checada pelo secretário-geral do Sindicato dos Médicos do Ceará, Leonardo Alcântara, nessa segunda (25), e a situação se mantinha. “Tem lá uma UTI neonatal com dez leitos, e a falta deste material fez com que quatro fossem bloqueados”, inicia. 

“Ou seja, num sistema de saúde em que já é difícil conseguir leito de UTI, ter quatro leitos bloqueados pela falta de um material que não chega a custar R$100 mostra uma ineficiência na gestão”, observa o médico.

Uma fonte ligada ao hospital, ouvida pelo Diário do Nordeste, afirma que cirurgias eletivas gerais têm sido “canceladas por falta de material”, registros que se repetiram até essa terça-feira (26). “Escalas de médicos também foram reduzidas”, disse.

A redução é sentida na ponta da assistência. A feirante Valéria Ribeiro, 42, precisou esperar “mais de um ano na fila” para conseguir uma consulta especializada com ginecologista no Hospital da Mulher. Na unidade, aguardou cerca de 3 horas pela chegada do médico – e, no fim, não conseguiu o que precisava.

“Vim pra reiniciar o tratamento de endometriose, que parei na pandemia. Mas aqui, hospital pra mulher, não tem. O médico disse que nem o exame de mapeamento faz aqui. Vou voltar pra fila de espera do posto de saúde e ver se consigo em outro canto”, queixa-se a mulher, que aguarda ainda na fila há 3 anos para uma ultrassom mamária.

O Hospital da Mulher atua como um equipamento de retaguarda, ou seja, não recebe casos de urgência e emergência, segundo a Prefeitura. Há duas formas de acesso: via referência, quando o usuário do Sistema Único de Saúde (SUS) é encaminhado por outra unidade hospitalar; ou por procedimentos eletivos, mediados por profissionais do posto de saúde. 

Atraso salarial

Nos bastidores da assistência, profissionais da unidade também acumulam queixas. Reclamam, sobretudo, de atraso no pagamento dos salários, reflexo semelhante ao que tem acontecido no Instituto Dr. José Frota (IJF), maior hospital municipal da cidade.

Ainda segundo Leonardo Alcântara, o Sindicato dos Médicos já oficiou o Hospital da Mulher e a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) sobre os problemas encontrados. Porém, a entidade não tem tido retornos recentes sobre quando serão dadas soluções práticas.

A fonte do hospital ouvida pela reportagem reitera a reclamação, apontando que alguns profissionais médicos “não receberam ainda os salários de setembro nem de outubro”.

O que diz a Prefeitura

Em entrevista ao Diário do Nordeste após audiência de conciliação sobre a crise no IJF, Galeno Taumaturgo, secretário municipal de Saúde, afirmou que a Pasta está “acompanhando também de perto e vendo as soluções que são possíveis” para o Hospital da Mulher.

O gestor justificou que as faltas de materiais e insumos têm a ver com a “mudança de gestão”. “De certo modo, o fornecedor fica receoso em fazer entregas e não receber, mas nós estamos tentando resolver essas situações para que nós possamos amenizar a situação de todos os hospitais”, pontuou.

Em nota, a SMS negou que as escalas de médicos tenham sido reduzidas, e reforçou que “a unidade segue em pleno funcionamento com atuação de cerca de 1.400 profissionais, entre médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos, nutricionistas, farmacêuticos, técnicos, administrativo, dentre outros”.

Quanto ao cateter que seria a causa do fechamento dos leitos de UTI neonatal, a secretaria informou que “as medidas para adquirir o insumo indicado estão em andamento, com previsão de regularização até a próxima semana”. 

Sobre os atrasos salariais, a Pasta afirma que “o processo de atualização dos pagamentos às cooperativas já foi iniciado, sendo que o equipamento é composto por servidores, terceirizados e cooperados”.

Em relação ao tratamento para endometriose, a SMS frisou que “a unidade hospitalar não é referência para o tratamento da patologia”, e que “os casos complexos desta doença ginecológica são encaminhados, via Central de Regulação do Município, para a unidade Maternidade Escola Assis Chateaubriand (MEAC), de gestão federal”.

Por fim, sobre o fluxo para consultas, exames e cirurgias com especialistas, a secretaria reiterou que “o período para o atendimento depende de fatores como classificação de risco, ordem cronológica e disponibilidade de vagas”, mediados pela Central de Regulação.