O governador do Ceará, Elmano de Freitas (PT), discorda da proibição completa do uso de celulares nas escolas brasileiras, como propõe o Projeto de Lei 104/2015, aprovado na Comissão da Educação da Câmara, no último mês. A medida avança sob articulação do ministro da Educação, Camilo Santana, aliado do gestor cearense, e impede o acesso mesmo durante os intervalos escolares.
“Pensamos diferente, eu acho que não resolve, é mais fácil o aluno se concentrar na hora da aula e, no intervalo, soltar um pouco. Eles queriam ficar (com o celular) nos dois (momentos), e vamos proibir tudo? Nunca conversei com profundidade sobre isso com o ministro Camilo, mas, se ele me ouvir, eu acho que na hora do intervalo (o aluno) deveria ter a possibilidade de usar”, defende.
A declaração de Elmano de Freitas foi dada ao Diário do Nordeste em entrevista exclusiva aos editores de DN Ceará, Dahiana Araújo; do PontoPoder, Wagner Mendes; e de Negócios, Hugo Nascimento, durante a tarde dessa segunda-feira (11). O conteúdo completo dos assuntos tratados com o chefe do Executivo estadual será publicado na quinta-feira (14).
Eu acho que a proibição para aluno criança é uma coisa, mas proibir um jovem de 16 anos, (dizer) que no intervalo não pode ficar com celular para fazer o que quer... Eu tenho a impressão de que não dá certo. Ele pode querer ficar conversando com eu e você aqui
O governador diz que sua experiência secretário de Educação de Fortaleza entre 2011 e 2012, na gestão da prefeita Luizianne Lins, mostrou que não se resolve as coisas com imposição. Por isso, discorda da regra durante os recreios escolares, principalmente, para os jovens. “Ele pode querer conversar com um amigo dele pelo ‘zap’, e ‘não pode, tá proibido’”, reforça. Apesar disso, Elmano endossa o impedimento do uso dos dispositivos durante a aula, para que não haja prejuízos de aprendizagem.
“Na sala de aula tem de ter o regramento para aproveitar o máximo de concentração de movimento do ensino-aprendizagem. O aluno está lá para estudar e, naquele momento, a concentração deve ser com professor””, completa o governador.
Elmano avalia que a situação deve ser discutida entre os jovens e os pais, e cita exemplos internacionais que funcionam. “Isso é tão forte que os países que passaram a usar muito o aspecto tecnológico, como a Finlândia e Suécia, estão reduzindo o uso de aparelhos para aumentar o relacionamento professor-aluno”, destaca.
Isso favorece o aprendizado e é bom que deixem o aluno fazer o que as máquinas fazem para desenvolver a habilidade e o raciocínio dele. Agora você dizer no intervalo que o jovem não tem o direito?
Início da movimentação
A articulação do Ministério da Educação para proibir o uso de celulares nas escolas brasileiras foi informada com exclusividade ao Diário do Nordeste em setembro deste ano. Na ocasião, o ministro Camilo Santana afirmou que discutiu a proposta com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Camilo, inclusive, indicou que a proposta proibiria o uso dos dispositivos até nos recreios escolares. Nesse processo, foi criado um grupo de trabalho para reunir opiniões de especialistas, professores, estudantes e familiares sobre a medida.
“A ideia é que possamos encaminhar um projeto que precisa uniformizar (a medida) em todo o Brasil. Tem estados com lei, mas queremos uniformizar para todo o Brasil, a partir de uma construção, ouvindo cada segmento, cada setor”, refletiu Camilo Santana na ocasião.
A regulamentação do uso de celular nas escolas é motivo de discussão há cerca de 20 anos e pelo menos 18 projetos de lei sobre o tema já foram apresentados na Câmara dos Deputados, desde 2007. As iniciativas também defendem o uso pedagógico da ferramenta e, entre as justificativas, há relatos de professores e pesquisas sobre o assunto.
Os textos citam ainda situações favorecidas pelo uso do celular, como troca de mensagens, jogos, uso de redes sociais e acesso a pornografia e a cenas de violência por meio dos aparelhos.
Debate na Câmara dos Deputados
Em outubro deste ano, os deputados da comissão de Educação da Câmara Federal retomaram a tramitação do Projeto de Lei 104/2015, de autoria do deputado Alceu Moreira (PMDB/RS), que tramita há 9 anos.
O relator da proposta, o deputado Diego Garcia (Republicanos/PR), apresentou um texto que substitui o original, no último mês. Foram incorporados mais 12 projetos que tratam da mesma temática na Câmara Federal ao projeto atual.
Entre os itens modificados está a aplicação da medida somente à educação básica (infantil, fundamental e médio) e não ao ensino superior, como previa o projeto inicial.
No dia 30 de outubro, os deputados federais, reunidos na Comissão da Educação da Câmara, votaram e aprovaram o projeto que proíbe o uso de celulares nas escolas brasileiras.
Com a aprovação no colegiado, o PL não precisa passar pelo plenário do legislativo e agora deve ser apreciado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e depois seguir para o Senado. O PL ainda não avançou para essa etapa.