Entenda a diferença entre as escolas cívico-militares, os colégios militares e os regulares

Modelo descontinuado pelo Ministério da Educação funcionava em 202 unidades públicas do Brasil

O encerramento do Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim) pelo Ministério da Educação (MEC) acendeu a discussão sobre o que são essas instituições e quais as diferenças entre elas, as regulares e os colégios militares.

O Diário do Nordeste reúne, então, especialistas e autoridades da educação para responder as principais dúvidas e explicar detalhes de como as escolas cívico-militares operam.

O que são escolas cívico-militares

São escolas públicas comuns, mas com aplicação de um modelo distinto de gestão. As instituições que aderiram ao Pecim contam com a presença de militares trabalhando na área administrativa, e com verba para adequações de estrutura.

A atuação na área educacional é “mais expressiva em atividades extraclasses, sob a liderança da direção da escola”, como pontuava a gestão anterior do MEC.

“Os militares não atuam em sala de aula, são apoio no acolhimento e preparo dos alunos na entrada dos turnos, no intervalo de aulas e nos períodos de encerramento dos turnos”, complementava o órgão.

Qual a diferença dessas escolas para as comuns?

As escolas cívico-militares são instituições de ensino regular, com basicamente o mesmo funcionamento das regulares, mas têm militares auxiliando a gestão em funções administrativas.

Ivan Gontijo, gerente de Políticas Educacionais do Todos pela Educação, explica que essas unidades são diferentes dos Colégios Militares – como os federais, os do Corpo de Bombeiros e os das Polícias Estaduais, por exemplo.

Os Colégios Militares, em geral geridos pelo Exército, são escolas onde os professores são civis, mas a gestão é militar. Elas trabalham com processos de seleção para ingresso e um percentual de vagas destinado a filhos de oficiais.
Ger. de Políticas Educacionais do Todos Pela Educação

Já as cívico-militares não têm processo seletivo, são para público em geral e são geridas por civis. “O Pecim, lançado em 2019, pegou escolas que tinham desempenho ruim no Ideb, não tem viés de seleção e a gestão das escolas não é feita por um militar”, reforça Ivan.

Gregório Grisa, diretor de Programa da Secretaria-Executiva do MEC, também destaca as principais singularidades das instituições de educação que envolvem atuação de militares:

  • Colégios militares federais: são de responsabilidade do Ministério da Defesa e regidos por lei própria;
  • Colégios das polícias estaduais: são regidos por leis locais, de cada um dos estados.

Já o Pecim, frisa o gestor, “se resumiu a alguns repasses para obras que, em grande medida, não foram executados” e “não tem respaldo legal”. “Foi tentada a aprovação de um Projeto de Lei, rejeitado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara”, lembra.

De acordo com o ministro da Educação, Camilo Santana, apenas 0,24% dos recursos repassados para estados e municípios para melhorar a infraestrutura das escolas foi gasto. "Está nas contas dos estados e prefeituras algo em torno de R$ 250 milhões", pontuou, em coletiva de imprensa.

As escolas cívico-militares têm melhores resultados?

Na análise de Ivan Gontijo, essa conclusão não tem comprovação. “Na literatura educacional, não tem nada que diga que colocar militares em escolas aumenta o aprendizado”, diz.

O especialista destaca ainda que os resultados de desempenho de colégios militares “não são comparáveis” ou aplicáveis às escolas cívico-militares, já que aqueles têm funcionamento distinto.

Os colégios têm resultados educacionais muito bons, mas não se explicam por serem militares, e sim porque têm um mecanismo de seleção para ingresso e alunos de nível socioeconômico maior que a média. No Pecim é diferente.
Ivan Gontijo
Ger. de Políticas Educacionais do Todos pela Educação

“Outra premissa que defende o Pecim é que ‘tendo militares no recreio evita violência, roubos e furtos e até tráfico de drogas’. É um argumento forte, mas ainda temos visto uma série de ataques, inclusive numa escola cívico-militar”, pontua Ivan.

O especialista do Todos Pela Educação elege os três pontos que, na análise de profissionais da área, são os que devem ser fortalecidos para garantir acesso, permanência, segurança e avanço no aprendizado em escolas públicas brasileiras:

  • Promover alfabetização em regime de colaboração, como no Programa Alfabetização na Idade Certa (PAIC), que o Ceará lançou em 2007; 
  • Ampliar escolas de tempo integral, com mais tempo na escola e proposta de aprendizagem diferente; 
  • Melhorar a carreira dos professores, para que seja mais atrativa e se garanta formação continuada de excelência; e 
  • Fortalecer a gestão das escolas.

“Outras agendas, como as cívico-militares, tiram força e atenção do que importa. Sabemos que existem problemas nas escolas. Desde 2002, tivemos 32 ataques – 19 aconteceram após fevereiro de 2022. Isso tem muito mais a ver com questões fora da educação”, avalia Ivan.

“Melhorar a convivência escolar é o melhor remédio. Só o estabelecimento da ordem não faz com que os alunos aprendam mais”, finaliza.

As escolas cívico-militares vão fechar?

O ministro da Educação, Camilo Santana, garantiu a estudantes e familiares “que não haverá fechamento de unidades e tampouco prejuízo aos alunos”. Em publicação nas redes sociais, ele afirmou que o encerramento do modelo se dará de forma gradual.

“A descontinuidade do modelo atenderá a uma política de transição, com acompanhamento e apoio do MEC junto a estados e municípios. Nossa prioridade é garantir os direitos dos estudantes e da comunidade escolar nesse grupo”, pontuou Camilo.

202
das 138 mil escolas públicas do Brasil são cívico-militares – um percentual de 0,15%, de acordo com o MEC.

O gestor destacou, ainda, que os esforços do Governo Federal devem se concentrar na ampliação das Escolas de Tempo Integral e conectividade nas escolas, “que irão beneficiar toda a rede pública brasileira”.