Theatro José de Alencar é palco de temporada gratuita de três espetáculos nordestinos

Projeto Série Cênica Especial do TJA começa neste fim de semana com a peça “1877” e segue até novembro

Fortalecer a circulação teatral, a formação de público e a agenda cultural de Fortaleza são alguns dos movimentos frutos da Série Cênica Especial, que traz espetáculos do Ceará, Nordeste e Brasil aos palcos de equipamentos públicos do Governo do Estado.

Na proposta — realizada pelo Instituto Dragão do Mar em parceria com a Secretaria da Cultura do Ceará por meio de patrocínio do Itaú via Lei Federal de Incentivo à Cultura —, o Theatro José de Alencar acolhe uma temporada totalmente gratuita de três espetáculos nordestinos.

Neste sábado (21) e domingo (22), será apresentada a peça “1877”, da Trapiá Cia Teatral, de Caicó (RN). Depois, em novembro, o equipamento recebe os espetáculos “E.L.A.” e “Monga”, da cearense Jéssica Teixeira.

Grande seca de 1877 em perspectiva

Após dois anos de pesquisa em diferentes fontes para “entender profundamente” a Grande Seca — fenômeno ocorrida no sertão nordestino durante o período imperial, considerado o mais devastador da região —, a Cia Trapiá de Teatro (RN) montou o espetáculo “1877”.

A produção, que tem pesquisa, direção e texto de Lourival Andrade, aborda os impactos ambientais, financeiros e sociais da histórica da seca, baseando-se em fatos reais e registros de nomes como Rodolfo Téofilo, José do Patrocínio, Josué de Castro e Silvino Pirauá de Lima. 

“Como também sou professor de História da UFRN e docente do Mestrado que tem como área de concentração a História dos Sertões, estes textos foram se encaixando para montar os discursos e as ações daquele momento”, explica Lourival.

O artista salienta “que muitos dos fatos narrados no espetáculo realmente ocorreram e deram impulso para pensar outros desdobramentos ficcionais”. 

“Como diretor, busquei construir uma teatralidade que dialogasse com o passado, mas que conectasse com um teatro contemporâneo, em que os atores e atrizes participam da encenação, não somente interpretando personagens, mas atuando como cidadãos”, segue.

A base histórica e a criação a partir dela agem em prol de reflexões que traçam paralelos entre as problemáticas de outrora, ligadas à seca, e diferentes questões contemporâneas, dos impactos da pandemia aos da crise climática e ambiental no País.

“Aí está o ponto chave. A História nunca se repete, mas conseguimos traçar eventos que se assemelham em potencialidade no passado e no presente. Estamos vivendo ciclos de secas cada vez mais prolongadas que dificultam a vida de milhões de brasileiros”, reflete Lourival.

O diretor aponta que, da mesma forma que o governo imperial à época “não estava preparado e por vezes preocupado com a calamidade da seca, atualmente também os governos não se deram conta do impacto dos efeitos climáticos em nossas vidas”. 

Ele interliga, ainda, o contexto da epidemia de varíola que assolou o sertão com a pandemia da covid-19.

“Vivemos uma pandemia recentemente e novamente o governo foi titubeante na distribuição de vacinas, os discursos negacionistas se espalharam, os cemitérios lotados de corpos sem enterro digno, os médicos tendo que decidir quem deveria viver ou morrer. Ou seja, os dilemas continuam os mesmos. O teatro tem o poder de levar esta reflexão e amplificar os eventos para que nós possamos nos posicionar e atuar”
Lourival Andrade
diretor

Fortalecimento de agenda e acesso à cultura

A circulação da peça de forma acessível a partir do apoio da Lei Federal de Incentivo à Cultura é celebrada por Lourival, que cita políticas públicas do tipo como “fundamentais”.

“Sem elas é quase impossível fazer circulações pelo país de espetáculos cênicos. Ainda mais com a possibilidade de gratuidade, democratizando as políticas públicas de cultura”, ressalta.

“Esperamos que estas ações se multipliquem e que mais e mais espetáculos tenham a oportunidade, que nós estamos tendo, de apresentarem suas obras num espaço como o Theatro José de Alencar, um dos mais importantes do País”, avança o diretor.

Gestora-executiva do TJA, Natália Escóssia define as obras que chegam a partir da Série Cênica Especial como "importantes espetáculos da cena artística nordestina" e destaca a relevância de projetos como esse para o equipamento.

“Desempenhando significativos papeis na vida cultural cearense, através do Contrato de Gestão, o TJA estrutura-se para garantir a realização de programas, serviços e atividades permanentes, executando políticas públicas para as artes, por meio do programa Teatro Difusão”, inicia.

A diretora segue ressaltando que, "de forma democrática, o Theatro realiza atividades de programação artístico-culturais de múltiplas linguagens, que acontecem via Convocatória, convites diretos e pautas espontâneas". Neste sentido, a realização do atual projeto traz "fôlego e potência" ao equipamento.

“A verba já existente para a realização das ações, nesse equipamento simbólico de referência artística e turística, ganha fôlego e potência com a iniciativa Série Cênica, que promove acesso à cultura, enquanto direito fundamental”, elabora Natália.

Diretor de ação cultural do Instituto Dragão do Mar, Lenildo Gomes partilha que o foco do pensamento do projeto foi “nas políticas públicas de circulação e promoção de intercâmbio entre as diversas áreas das artes cênicas”. 

Esta intenção se concretiza, por exemplo, na priorização de espetáculos nordestinos para o projeto e na busca por expandir a circulação de obras como as cinco que compõem a Série Cênica para além do circuito de festivais de teatro. 

Assim, a ação fortalece os dois equipamentos cearenses “como espaços abertos para intercâmbios e processos criativos distintos”. Lenildo ainda credita o TJA e o Cineteatro, a partir do acolhimento dos espetáculos, como “pontos de circulação e encontro de diferentes estéticas”.

O diretor ressalta, também, o diálogo da realização do projeto com iniciativas e curadorias próprias dos dois equipamentos. “Tanto o Cineteatro São Luiz quanto o Theatro José de Alencar seguem diretrizes curatoriais alinhadas às políticas públicas, orientando suas programações conforme essas diretrizes”, aponta.

“Na seleção dos espetáculos, além de valorizar a qualidade estética e a relevância artística, a curadoria priorizou a diversidade temática, escolhendo obras que dialogam com questões contemporâneas, como a diversidade e o território nordestino, incluindo discussões sobre a seca. Essa curadoria reflete um compromisso em atender a uma demanda artística atual, conectando as produções aos contextos culturais e sociais do Nordeste”
Lenildo Gomes
diretor de ação cultural do Instituto Dragão do Ma

No Cineteatro

A proposta do projeto inclui ainda o palco do Cineteatro São Luiz. Foi nele que o projeto começou, em agosto, com sessões do monólogo “Pequeno Monstro”, do cearense Silvero Pereira. Também será nele o encerramento da Série Cênica, com “Macacos” (RJ), de Clayton Nascimento.

A premiada obra carioca será apresentada no equipamento no próximo dia 23 de novembro. A produção levou os troféus de Melhor Ator em importantes prêmios teatrais do Brasil, incluindo o Prêmio Shell e o Prêmio APCA - Associação Paulista de Críticos de Arte.

Detalhes como horário e valor da entrada serão posteriormente divulgados pelo equipamento público.

Série Cênica Especial no Theatro José de Alencar

Espetáculo "1877", da Trapiá Cia Teatral (Caicó-RN)

  • Quando: sábado, 21, e domingo, 22, às 19 horas
  • Classificação indicativa: 12 anos

Espetáculo "E.L.A.", de Jéssica Teixeira (CE)

  • Quando: 7 de novembro

Espetáculo "Monga", de Jéssica Teixeira (CE)

  • Quando: 9 e 10 de novembro

Série Cênica Especial no Cineteatro São Luiz

Espetáculo "Macacos", de Clayton Nascimento (RJ)

  • Onde: rua Major Facundo, 500, Centro
  • Quando: 23 de novembro
  • Mais informações: @cineteatrosaoluiz