Primeiro a paralisar as atividades com a emergência da pandemia de Covid-19, o setor cultural amarga perspectivas de trabalho e sobrevivência de projetos e grupos, sobretudo neste momento de lockdown em Fortaleza.
É o caso, por exemplo, dos profissionais ligados a circos. Presidente da Associação dos Proprietários, Artistas e Escolas de Circo do Ceará (Apaece), Reginaldo Aparecido diz que este está sendo o momento mais difícil da vida do circense na Capital.
“A gente já vinha de 10 meses parados, alguns até com 11. Quando começamos a funcionar de novo, com todas as restrições (redução de público, distanciamento social, uso de máscara), trabalhamos uma ou duas semanas e aí veio de novo o lockdown. Tá todo mundo agoniado, ‘com a faca no pescoço’”, dimensiona o representante.
Ele conta que cada profissional está se movimentando como pode para driblar os efeitos da pausa compulsória. “Um faz serviço de solda ali, outro pega um carro pra fazer frete… É aleatório. As doações pararam porque o circo começou a trabalhar, aí veio o lockdown e acabaram as doações”, diz.
“Tá todo mundo imprensado. A associação faz o que pode, mas são 47 circos no Ceará, e aí fica bastante difícil”, completa. Apenas Fortaleza e Região Metropolitana concentram seis circos, todos fechados por conta das medidas restritivas mais intensas.
Diálogo com o poder público
Neste momento, Reginaldo afirma que os profissionais da cadeia do circo aguardam auxílio dos órgãos públicos. Ele lamenta a falta de diálogo por parte da Prefeitura de Fortaleza frente àqueles que vivem dessa arte na cidade.
“Foi recebido um auxílio por parte da Lei Aldir Blanc e depois teve o Edital das Artes, mas foi só. Essa questão de ajuda, de chegar com uma cesta básica, com algo mais consistente, não houve. Porque, como o edital é uma licitação pública, muitos ficaram de fora. Não tem como contemplar todos com o edital”, considera.
“Espero que eles pelo menos venham dialogar com a gente, perguntar como a gente está, se estamos precisando de algo. Não fizeram isso ainda – e olha que o povo do circo é bem consistente, bastante atuante na periferia de Fortaleza. A gente chegou a ter 500 lonas armadas na cidade. E muitas fecharam por falta de terreno. As que estão perdurando é por realmente vontade de fazer com que a cultura prevaleça. Mas cada vez o circo está sendo mais empurrado para fora. E principalmente neste momento, que não somos olhados pela prefeitura”, situa.
Reginaldo disse ainda que já entrou em contato com a Secretaria da Cultura de Fortaleza (Secultfor) solicitando uma reunião a fim de prover encaminhamentos para os circos da Capital. “Porque senão todos vão fechar e não abrirão mais. Se os artistas debandarem, pra juntar tudo de novo é muito complicado”, avalia.
Pendências do Carnaval
Por sua vez, o Presidente da Associação Cultural das Entidades Carnavalescas do Estado do Ceará (Acecce), Raimundo Praxedes, afirma que o secretário da cultura de Fortaleza, Elpídio Nogueira, informou durante uma reunião presencial, no início de fevereiro, que o edital de auxílio aos grupos dessa categoria já está pronto.
“Mas o documento só deverá ser lançado após toda essa situação envolvendo os servidores públicos municipais”, explica, referenciando a movimentação de profissionais com o intuito de frear o andamento de alterações na lei que abrem caminho para a reforma da Previdência na cidade.
Enquanto aguarda as resoluções, o representante da Acecce dimensiona a situação das entidades no momento agravante da pandemia do novo coronavírus. De acordo com Praxedes, a própria associação tem custeado a compra de cestas básicas para aqueles que sobrevivem diretamente do Carnaval.
“A cada dia tudo vai piorando mais porque tem gente que vive só desse período carnavalesco. E ainda temos todas as perdas de pessoas ligadas às entidades, idosos que integravam os grupos. Então continuamos aí, ligando diariamente para a Secultfor e perguntando sobre os novos passos”, diz.
Ele recorda ainda que, no dia 25 de março, é comemorado na Capital o Dia do Maracatu. A data foi oficializada em 2013 integrando um projeto da Prefeitura Municipal, por meio da Secultfor com apoio da Acecce. Apesar da relevância da efeméride, Praxedes diz que ainda não houve nenhuma resolução por parte do poder público quanto à comemoração.
“Não foi feito um edital, não foi dada uma ajuda. O maracatu é patrimônio imaterial da cidade. Quando ele passa a ser um patrimônio, a agremiação tem os seus deveres e o município tem o dever dele de manter os grupos. Então, tem tudo isso aí e nada foi feito”, lamenta, não sem antes sublinhar: “O que nós esperamos é celeridade nesses processos”.
Panorama
Em matéria publicada no dia 12 de fevereiro pelo Verso, Raimundo Praxedes manifestava o sentimento de otimismo com relação ao auxílio do poder público em um momento de paralisação das atividades culturais frente à pandemia. “Temos esperança”, destacou.
À época, o representante também já havia sublinhado a sinalização, por parte da gestão municipal, de criar um edital de manutenção dos blocos e maracatus. A ideia é que, logo após o fim da pandemia, seja realizado um “Carnaval fora de época” com os artistas apoiados.
Procurada, a Secultor informou que não havia nenhuma informação nova sobre as negociações relacionadas aos dois assuntos – tanto a situação dos artistas durante o lockdown quanto a respeito das agremiações carnavalescas.