Um homem foi decretado pela própria facção criminosa, em um "tribunal do crime", e assassinado a tiros, em Itaitinga, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), por suspeita de roubar 1 kg de maconha do grupo. Um amigo dele, que o acompanhava, também foi morto. A dupla foi enterrada pelos criminosos em um terreno baldio.
O caso aconteceu em março de 2017. Quase cinco anos depois, no último dia 15 de fevereiro, o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) manteve a prisão de José Flávio de Souza, suspeito de ser o líder da facção carioca na região e de ter participado do "tribunal do crime". Ele e mais oito réus esperam o julgamento pelos crimes.
A decisão da 1ª Câmara Criminal do TJCE citou a denúncia do Ministério Público do Ceará (MPCE) sobre o caso, que narra que Heverson dos Santos Rodrigues e Benedito Ramon da Silva Sousa sumiram no dia 6 de março de 2017, após deixarem o bairro Jardim União, em Fortaleza. A quebra de sigilo telefônico de Heverson apontou para a presença do mesmo em Itaitinga.
A partir de então iniciou-se uma complexa investigação e ficou apurado que Heverson dos Santos Rodrigues e Benedito Ramon da Silva Sousa foram atraídos de Fortaleza para Itaitinga sob o pretexto de venderem uma descarga de motocicleta, contudo jamais retornaram aos seus lares, uma vez que foram friamente assassinados por disparos de arma de fogo e em seguida tiveram seus corpos enterrados e ocultados em um terreno baldio na Vila do Trem, Itaitinga/CE."
As investigações policiais descobriram que Heverson Rodrigues e mais dois integrantes de facção carioca foram encarregados da missão de esconder 4 kg de maconha em uma caixa d'água, em uma residência em Itaitinga.
Quando o grupo criminoso foi rever a droga, havia sumido cerca de 1 kg, e a culpa recaiu sobre Heverson. "Quem rouba droga morre", explicou um suspeito às autoridades.
Heverson Rodrigues e o amigo, Benedito Ramon, foram atraídos até Itaitinga pelo grupo criminoso com a promessa de comprar uma descarga de motocicleta da dupla. Heverson, primeiro, foi levado a um local onde estavam mais quatro homens, que simularam a compra, sacaram as armas e começaram a atirar contra a vítima.
Depois foi a vez de Ramon ser levado para ser executado. Os criminosos disseram que Heverson queria apresentar uma mulher a ele. Ao se deslocar para o outro ponto, Ramon também foi alvejado. Os dois homens tiveram os corpos arrastados para um matagal e foram enterrados.
Líder de facção é mantido preso
A 1ª Câmara Criminal do TJCE negou por unanimidade um pedido de habeas corpus da defesa de José Flávio de Sousa. Os desembargadores concordaram que não há excesso de prazo na formação da culpa, já que há uma pluralidade de réus (nove ao total) e de crimes em apuração, e a prisão é necessária para a garantia da ordem pública.
José Flávio foi pronunciado (isto é, a Primeira Instância da Justiça decidiu levá-lo a julgamento) pelos crimes de homicídios qualificados, ocultação de cadáver, furto qualificado, extorsão e coação no curso do processo homicídio. O julgamento, entretanto, ainda não foi marcado.
Observa-se que, ainda que de forma concisa, a parte da sentença que decidiu pelamanutenção da prisão preventiva do paciente não se ressente de fundamentação, pois estárespaldada em elementos concretos, extraídos da situação fática dos autos, aptos a revelar a necessidade da medida."
A defesa do réu pediu pela sua liberdade ao alegar excesso de prazo na formação da culpa e ausência de requisitos da manutenção da prisão preventiva. José Flávio está preso desde 3 de abril de 2018, há três anos e 11 meses.
Na área criminal, em verdade, todos os acusados têm direito à finalização de seu processo dentro de um prazo razoável, pelo que não nos parece justo, por mais grave que tenha sido o delito cometido, permaneçam presos aguardando o final de uma instrução que se arrasta injustificadamente no tempo."
Processo pode ser transferido após ameaças
O TJCE detalhou também que "há indícios de que ele, paciente, ameaçou testemunhas e corréus do processoa fim de que garantir sua impunidade e evitar a sua prisão, circunstâncias que revelampericulosidade concreta e a imperiosidade de manutenção da medida extrema ante a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa,no intuito de impedir a reiteração delitiva, bem como para conveniência da instrução criminal".
Com isso, o Ministério Público do Ceará pediu à Justiça Estadual pelo desaforamento (ou seja, transferência) do processo para Fortaleza, em 17 de setembro do ano passado, com o objetivo que a ação penal - que tramita na Comarca de Itaitinga - não sofra influência. As defesas de dois réus já se manifestaram sobre o pedido, e o juiz aguarda pela manifestação dos demais - inclusive de José Flávio - nos autos para dar prosseguimento ao processo.