Os desembargadores da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) não aceitaram o recurso do Ministério Público do Ceará (MPCE), que questionou a decisão, em caráter liminar, de soltar o piloto Felipe Ramos Morais. Ele é acusado de participar das mortes dos líderes de uma facção criminosa paulista Rogério Jeremias de Simone, o 'Gegê do Mangue', e Fabiano Alves de Sousa, o 'Paca'. Por unanimidade, em sessão realizada na tarde desta quarta-feira (30), os membros do Colegiado não conheceram o agravo regimental impetrado pelo MPCE.
Na decisão que não recebeu o recurso do MPCE, o desembargador relator Antônio Pádua Silva explicou "não ser cabível a interposição de agravo regimental contra decisão de Relator que defere ou indefere, motivadamente, a liminar em habeas corpus".
O magistrado pontuou que está determinado ao piloto apresentar-se periodicamente ao Juízo de primeiro grau relatórios médicos sobre sua atual situação de saúde, "com a possibilidade daquela instância de, inclusive, reapreciar a questão e revogar a medida então deferida no caso de não comprovação das condições alegadas".
Felipe está em liberdade desde abril deste ano. Quando o Tribunal de Justiça decidiu pela soltura do piloto considerou o quadro de saúde debilitado do acusado - que utilizava um balão intragástrico que já havia explodido. Felipe perdeu mais de 30 kg enquanto esteve preso, fez greve de fome e tentou suicídio por duas vezes.
No agravo regimental negado pelo TJCE, o MP considerou que o Judiciário cedeu a um capricho do denunciado, causou enorme prejuízo ao andamento do processo e pôs em risco a sociedade. Inconformado com a decisão, o órgão ministerial destacou que não ficou comprovada ineficiência do tratamento de saúde oferecido ao acusado no cárcere, e disse que Felipe contava com amplo acompanhamento multidisciplinar.
A decisão estimula a prática reiteradamente utilizada pelo Primeiro Comando da Capital, que há décadas utiliza greves de fome com o propósito de forçar o Estado a agir de determinada maneira, preferencialmente para atender aos seus interesses"
Já o relator do recurso, desembargador Antônio Pádua Silva, afirmou que foram esclarecidos todos os cuidados necessários para garantir a ordem pública e para assegurar a aplicação da lei penal. "Este Juízo é conhecedor das inúmeras artimanhas engendradas, principalmente por membros de facções criminosas, para alcançar a liberdade, sendo uma delas, claramente, as greves de fome. Fato! Porém, não se curvou esta Relatoria a chantagens de cunho emocional, consoante já explicitado, e não se descuidou da imersão reflexiva acerca das consequências advindas desta decisão".
Defesa
Em suas considerações no processo, a advogada do piloto, Mariza Almeida Ramos Morais, entendeu não caber pedido do restabelecimento da prisão preventiva de Felipe nesse momento. Ela destacou ainda no documento que ele não representa risco à sociedade.
Para a defesa, o MP "esqueceu" que o piloto esteve preso durante três anos em presídio de segurança máxima, "sem culpa formada, e nem sem sequer as reuniões de instrução terminadas, com base unicamente em subjetivos indícios questionados até pelos próprios que o denunciaram, com várias contradições".
O MPCE/Nucrim parece querer alegar que o estabelecimento prisional onde estava o agravado possui a possibilidade de cuidar da saúde do interno, em suas especificidades, do que não concordamos absolutamente, com respeito, prova mais uma vez, que não foi feita a leitura atenta do prontuário médico do agravado, pois lá, embora privados de entrar, constatamos, que ao estar por perto e “ouvindo” sobre outros casos, a realidade do que lá ocorre é bem diferente do que se imagina"
Delação
Felipe firmou delação premiada com a Polícia Federal (PF), que auxiliou em outras investigações contra a mesma facção criminosa paulista. O piloto ingressou com pedido de liberdade à Justiça várias vezes e pediu a anulação dos atos processuais, com a alegação de que também firmou delação premiada com o Ministério Público do Ceará no dia 10 de agosto de 2018, mas que o acordo não foi cumprido, o que vem sendo negado pelo órgão ministerial.
Duplo homicídio
'Gegê do Mangue' e 'Paca' foram assassinados em uma reserva indígena, na Região Metropolitana de Fortaleza, em fevereiro de 2018. Um helicóptero foi utilizado no atentado. Conforme a investigação, Felipe Ramos Morais era quem pilotava a aeronave no dia do crime. Ao todo, 10 pessoas são acusadas pelo duplo homicídio:
- Gilberto Aparecido dos Santos, o 'Fuminho' (preso);
- André Luís da Costa Lopes, o 'Andrezinho da Baixada' (preso);
- Jefte Ferreira Santos (preso);
- Carlenilto Pereira Maltas (preso);
- Felipe Ramos Morais;
- Erick Machado Santos;
- Ronaldo Pereira Costa;
- Tiago Lourenço de Sá Lima;
- Renato Oliveira Mota;
- Maria Jussara da Conceição Ferreira Santos.