Dois policiais militares, condenados em um processo criminal por ligação com uma organização criminosa que promovia jogos de azar em Fortaleza, foram demitidos da Polícia Militar do Ceará (PMCE), por decisão da Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário do Ceará (CGD). Em contrapartida, outros dois PMs foram absolvidos no processo administrativo.
A demissão do subtenente Francisco Flávio Cosme Campos e do sargento Roberto Paulo da Silva (que estava na Reserva Remunerada da PMCE), por violação aos valores militares e por cometer transgressões disciplinares, foi publicada pela CGD no Diário Oficial do Estado (DOE) da última quarta-feira (11).
No mesmo documento, foi publicada a absolvição dos sargentos Antônio Marcos Moura de Oliveira e João Bosco da Costa Filho, "com fundamento na inexistência de provas suficientes para a condenação, em relação às acusações constantes na Portaria inicial", justificou a CGD, que ponderou "a possibilidade de instauração de novo feito, caso surjam novos fatos ou evidências posteriormente à conclusão dos trabalhos deste procedimento".
A Controladoria de Disciplina ainda extinguiu a punibilidade do cabo Geldson Coelho de Araújo, que foi morto a tiros em uma hamburgueria, no bairro Jardim América, em Fortaleza, em março deste ano. Um suspeito de participar do crime foi preso pela Polícia e denunciado pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) por latrocínio (roubo seguido de morte).
A defesa do subtenente Francisco Flávio Cosme Campos não quis se manifestar sobre a demissão, pois ainda não foi intimada pela Justiça. Já a defesa do sargento Roberto Paulo da Silva, representada pela Associação de Praças da Polícia Militar e Corpo de Bombeiros Militar do Ceará (Aspramece), enviou a seguinte nota assinada pelo diretor presidente, o advogado Pedro Queiroz:
"Quando a defesa for intimada pessoalmente da decisão e, caso haja suposta sanção disciplinar que venhamos a entender ser desproporcional ao caso concreto e, ouvido a parte interessada, por certo, será apresentado recurso ao Conselho de Disciplina e Correição - CODISP, no prazo legal, previsto na Art. 30 da Lei Complementar 98/2011."
Condenação na esfera criminal
O subtenente Francisco Flávio Cosme Campos e o sargento Roberto Paulo da Silva foram condenados pela Justiça Estadual, por crimes cometidos em ligação com uma organização criminosa que promovia jogos de azar, como jogo do bicho, bingo e caça-níqueis, em Fortaleza.
Em sentença assinada no dia 25 de agosto de 2023, a Vara da Auditoria Militar do Ceará condenou Francisco Flávio a 2 anos e 8 meses de reclusão, pelo crime de corrupção passiva, e o absolveu da acusação de integrar organização criminosa. Já Roberto Paulo foi sentenciado a 3 anos de reclusão, por integrar organização criminosa.
Porém, como as penas foram inferiores a 4 anos e os réus tinham bons antecedentes criminais, a Justiça substituiu as penas privativas de liberdade dos dois PMs por restrições de direitos. O subtenente teve que pagar 8 salários-mínimos e o sargento, 6 salários-mínimos, a entidades públicas ou privadas com destinação social.
Na mesma sentença, a Auditoria Militar condenou outros quatro policiais militares por corrupção passiva; e absolveu seis PMs da acusação de integrar organização criminosa e dois militares, de corrupção passiva. Os policiais recorreram da condenação.
Como os PMs participavam da quadrilha
Oito policiais militares (três tenentes, um subtenente, três sargentos e um cabo) foram alvos da Operação Jericó, deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), do MPCE, em parceria com a Coordenadoria de Inteligência (Coin), da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS), em dezembro de 2020.
Uma organização criminosa teria explorado jogos de azar - como máquinas caça-níqueis, vídeo bingos e jogo do bicho - em Fortaleza, pelo menos entre os meses de novembro de 2018 e julho de 2019.
As investigações descobriram que a quadrilha possuía uma rede de colaboradores, "composta por técnicos e programadores de máquinas, cambistas, gerentes, motoqueiros, seguranças, informantes, caixas, além de policiais civis e militares que mediante recebimento de propinas, mantinham a atividade ilegal fora de qualquer fiscalização ou embaraçamento por parte das autoridades competentes", segundo a sentença judicial.
O sargento Roberto Paulo da Silva, que estava na Reserva Remunerada da Polícia Militar, foi apontado pelo MPCE como o líder da célula formada por PMs, dentro da organização criminosa. A Justiça detalhou que o militar era "responsável pelo forte aparato de segurança que envolvia a organização criminosa, e por vezes, o encarregado da distribuição da propina aos policiais envolvidos no esquema delituoso".
Os agentes públicos, conforme a Justiça, ainda "traziam informações ao grupo sobre futuras operações policiais, agindo de encontro com suas prerrogativas funcionais", complementou a Auditoria Militar do Ceará.