Um homem que morreu em um presídio no Ceará foi morto por asfixia mecânica do tipo estrangulamento, segundo laudo cadavérico elaborado pela Perícia Forense do Ceará (Pefoce). A família do detento, que junto ao advogado somente soube da morte seis dias depois, acredita em homicídio.
A Secretaria da Administração Penitenciária do Ceará (SAP) chegou a informar que, na noite de 12 de junho deste ano, o interno Osmar Bezerra de Oliveira sentiu "indisposição e mau estar" no Centro de Triagem e Observação Criminológica (CTOC), em Aquiraz, recebeu os primeiros socorros no Posto de Enfermagem da Unidade Penitenciária e morreu antes da chegada da ambulância.
Questionada sobre o resultado do laudo pericial, a Secretaria respondeu, por nota, que "a ocorrência questionada possui inquérito policial por parte da Polícia Civil e investigação administrativa da própria pasta. A SAP ainda reforça que todo óbito ocorrido dentro do sistema prisional cearense passa por apuração e verificação dos órgãos periciais".
A Polícia Civil, por sua vez, informou, também em nota, que a Delegacia Metropolitana de Aquiraz investiga as circunstâncias da morte do detento. "Testemunhas – tanto detentos que dividiam cela com a vítima, quanto funcionários da unidade prisional – já foram ouvidas e diligências estão em andamento".
Contudo, o órgão afirmou que não pode dar mais detalhes do caso "para não comprometer o trabalho policial, que está em andamento, e devido o inquérito está em segredo de Justiça".
Perícia identificou lesões na cabeça e pescoço
O laudo cadavérico de Osmar Bezerra de Oliveira, de 36 anos, foi anexado ao processo judicial no último dia 29 de setembro. Segundo o documento assinado pelo médico perito legista Igor Gurgel Ponte Ramos, o exame interno da cabeça identificou "edema cerebral; congestão venosa encefálica; ausência de fraturas da calota craniana; ausência de hemorragias ou dematomas encefálicos".
Enquanto o exame do pescoço permitiu verificar "infiltrado hemorrágico em musculatura cervival e retro faríngea frequentemente observado nos casos de estrangulamento". "Diante do exposto, inferimos tratar-se de morte real causada por asfixia mecânica do tipo estrangulamento", conclui a perícia.
O advogado Alexandre Sales, que representa a família de Osmar, afirma que recebe o laudo cadavérico "com muita tristeza". "Nenhuma providência foi tomada para resguardar a vida do Osmar. Pelo contrário, a família só soube do óbito depois de seis dias. E a justificativa que deram foi que ele passou mal e foi levado ao hospital".
A expectativa é que as autoridades "apurem com isenção esse fato e punam todo e qualquer responsável, seja ele servidor público ou seja ele algum preso que estava com o Osmar. Tem que ser punido com os rigores da lei", segundo Sales. O advogado Diego Henrique do Nascimento, que também representa a família de Osmar, corrobora que "a defesa aguarda a conclusão do Inquérito e espera que o caso não seja esquecido".
"Me sinto revoltada", diz esposa de Osmar
A dona de casa Ana Cristina Ribeiro, esposa de Osmar de Oliveira, afirma que, ao ser chamada para reconhecer o corpo do marido na Coordenadoria de Medicina Legal (Comel), da Pefoce, já duvidou da versão contada pela SAP no dia 18 de junho (seis dias após a morte) de que o marido faleceu após um mal estar.
Eu olhei para o pescoço do meu marido e falei 'ele não passou mal, não'. Meu marido foi morto enforcado. Tanto que, depois que saiu o exame, confirmou o que eu já desconfiava."
A Secretaria da Administração Penitenciária informou à reportagem que, após a morte de Osmar, "tentou o contato reiteradas vezes no telefone fornecido pelo interno no dia de sua entrada no sistema, mas as ligações não foram atendidas e nem retornadas. Paralelo a isso, a unidade prisional fez atualização imediata sobre o óbito do interno nos autos do processo a qual ele responde junto ao Poder Judiciário".
Ana Cristina diz que se sente "revoltada" com a morte do marido sob custódia do Estado. "Até então, (eu pensava) meu marido tá lá guardado, vou fazer o possível para tirá-lo de lá. Meu marido era educado, não era 'valentão'. Ele tinha se reintegrado à sociedade, era trabalhador, honesto e pai de família".
Defesa tentou extinção da punibilidade do preso
Osmar Bezerra de Oliveira respondia a um crime de roubo ocorrido em 2006, no regime semiaberto, mas deixou de cumprir as obrigações processuais, segundo o advogado Diego Henrique.
Então, foi aberto um mandado de prisão contra ele, que terminou cumprido no dia 25 de maio deste ano, em uma abordagem policial no bairro Antônio Bezerra, em Fortaleza. De acordo com o advogado e a esposa, Osmar não cometeu novos crimes nesse período, trabalhava em obras da construção civil e atuava também como pastor evangélico.
O advogado Diego Henrique pediu a extinção da punibilidade do crime cometido por Osmar, em 24 de julho de 2020, na Justiça Estadual. Quase 13 meses depois, o pedido não foi julgado pela 1ª Vara de Execuções Penais de Fortaleza. "A morte dele poderia ter sido evitada", afirma o defensor.
Diego Henrique também ingressou com pedido de habeas corpus no Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE). O magistrado não concedeu a ordem, mas determinou que o juiz da Execução Penal julgasse o pedido de extinção de punibilidade, no dia 3 de março deste ano.
Segundo o TJCE, Osmar Bezerra de Oliveira foi condenado em três processos criminais, que somaram, ao todo, 12 anos de reclusão. Em 11 de janeiro de 2008, ele foi transferido para a Colônia do Amanarí, tendo fugido nove dias depois, quando havia cumprido 3 anos, 4 meses e 19 dias de sua pena - restando cumprir 08 anos, 7 meses e 11 dias de reclusão.
Por decisão do Juízo da 1ª Vara de Execuções Penais de Fortaleza o regime dele foi regredido para fechado e, com isso, expedido mandado de prisão em 17 de maio de 2017, com validade até 20 de janeiro 2024, data da prescrição da pena que seria em 16 anos.
O pedido da defesa dele seguiu procedimento na unidade, uma vez que são necessárias, muitas vezes, diversas movimentações antes da análise do mérito pelo magistrado, que, inclusive, logo no dia seguinte, expediu despacho para parecer do Mistério Público (MPCE), alega o TJCE.
"Neste caso específico, houve ainda, por exemplo, requerimento de pesquisa nos sistemas Sistema de Consulta de Antecedentes Criminais (CANCUN) e Banco Nacional de Mandados de Prisão (BNMP) por parte do MP; juntadas de informações e antecedentes criminais; entrega de documentos e vistas ao Órgão Ministerial", completa.