Festa de juízes no Ceará tem patrocínio de empresas com ações judiciais no TJCE

Representação de magistrados vê caso como “tendencioso” e diz adotar posicionamento ético e transparente

Empresas cearenses rés em ações no Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) patrocinaram uma festa da Associação Cearense de Magistrados (ACM), realizada na noite do último sábado (16), no Iate Clube Fortaleza, na região portuária da Capital. A representação de magistrados, contudo, alega que a participação das empresas ocorre de forma “legal e legítima”.

O episódio foi noticiado pela colunista Carolina Brígido, do portal UOL, na última sexta-feira (22). Intitulada "Sunset Confra 2023", a celebração contou com a presença dos juízes e de familiares, que se divertiram ao som de atrações musicais locais contratadas pela organização.

Ao que publicou a coluna e em imagens veiculadas nas redes sociais e de acesso ao Diário do Nordeste, ao menos dois empreendimentos patrocinaram a confraternização: a Carmais Seminovos e a BSPAR Incorporações. Ambas aparecem em dezenas de processos ingressados na Justiça estadual, julgados por alguns dos convidados. 

Uma estrutura com telões, espaços instagramáveis, iluminação cênica, bartenders e animadores foi montada no espaço. Carros da BYD, comercializados pela empresa de automóveis, foram expostos e um telão expôs a marca da incorporadora. 

Apesar de não se enquadrar em nenhum crime, a participação de empresas no patrocínio da festa poderia dar margem a uma interpretação de infração ao Código de Ética da Magistratura, que determina ser "fundamental para a magistratura brasileira cultivar princípios éticos, pois lhe cabe também função educativa e exemplar de cidadania em face dos demais grupos sociais", e que veta o recebimento, pela Magistratura, de "benefícios ou vantagens de ente público, de empresa privada ou de pessoa física que possam comprometer sua independência funcional". Trata-se do artigo 17, que integra o Capítulo V "Integridade Pessoal e Profissional".

Contudo, em nota enviada ao Diário do Nordeste, a ACM classificou as informações divulgadas como “tendenciosas”. Informou que, assim como outras instituições pelo Brasil, realiza a tradicional festa de final de ano paga “com recursos próprios da entidade, que é financiada pela contribuição mensal de magistrados ativos, aposentados e pensionistas”. 

“Em algumas ocasiões, há cotas de publicidade por empresas de forma legal e legítima”, defende.

Por fim, declarou que é uma entidade privada, não recebe recursos públicos, não integra o Poder Judiciário e presta contas sistematicamente aos seus associados, adotando um “posicionamento sempre ético e transparente”.

Também procurado pela reportagem, o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE) afirmou que a ACM é entidade privada e autônoma, “não cabendo ao TJCE emitir juízo de valor (prévio ou posterior) sobre modelos de financiamento de eventos associativos e escolhas de possíveis patrocinadores”.

Complementou ainda que as prescrições do Código de Ética da Magistratura são “de cunho e exigibilidade individuais, e sua observância é acompanhada pelos órgãos de controle interno”.

‘Clientes corporativos’

Uma ambulância da Unimed Fortaleza também foi disponibilizada no local. A operadora de planos de saúde, no entanto, salientou que a associação de magistrados é uma cliente dela há mais de três décadas. 

"Como acontece com outros clientes corporativos, a operadora disponibilizou uma ambulância para o evento da entidade realizado no dia 16/12. Não houve patrocínio financeiro", disse a cooperativa em nota enviada ao Diário do Nordeste.

A cessão do veículo teria ocorrido sem nenhum custo para a ACM, da mesma maneira como seria feita para outras empresas, associações ou instituições com quem possam ter uma relação comercial.

As equipes de comunicação do Grupo Carmais e da BSPar, empresas citadas na apuração, também foram acionadas, mas não enviaram retorno até a publicação desta matéria. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também foi procurado para se manifestar. O conteúdo será atualizado quando houver uma posição.