Cresce o julho das pretas no Brasil

Com diferentes formatos, as ações coletivas e políticas mostram o protagonismo das organizações e movimentos das mulheres negras no Brasil

As mulheres negras representam 27,8% da população brasileira. Pela via do trabalho, estruturaram econômica e culturalmente esse País como nação. No entanto, experimentam historicamente opressões interseccionadas de gênero, raça e classe traduzidas em padrão precário de vida.

Essas mulheres estão mais expostas às desigualdades sociais, raciais e territoriais em campos prioritários para inclusão e ascensão social. No mercado de trabalho, despontam entre as desempregadas, estão nas ocupações de baixa remuneração e informais. As negras compõem mais 60% dos empregados domésticos, trabalho este marcado pela desvalorização, precarização e desprestígio como resquício da naturalização da experiencia da escravidão. 

Acresce que têm como experiência em comum a violência. Segundo estudos da USP em 2020, 73% das vítimas de feminicídio são mulheres negras. Na educação, apenas 10% conseguiram concluir o nível superior em 2018. Na saúde, durante a pandemia da Covid-19 sofrem mais impacto da crise sanitária e econômica e quanto a participação política despontam com menor representação e poder político.

As desvantagens não se referem apenas ao âmbito público, presentificam-se na subjetividade e até nas dinâmicas familiares. Prevalece um imaginário social sobre a sexualidade da mulher negra como boa de cama, hiper erotizada e carente. Naturalizando que o corpo negro pode ser violado, com a certeza da impunidade, ingrediente central da cultura do estupro.

As mulheres negras entenderam que, para romper com essa situação de desvantagens, vale a organização com inventividade. E o Julho das Pretas caracteriza-se como forma de resistência. Durante o mês de julho, tecem homenagem à Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e à memória de Tereza de Benguela, liderança do Quilombo do Quariterê em Mato Grosso pela sua força política. 

Com diferentes formatos, as ações coletivas e políticas mostram o protagonismo das organizações e movimentos das mulheres negras no Brasil. É possível notar o crescimento desses eventos. Mesmo em cenário de pandemia da Covid-19, pululam as lives, webinar nas redes sociais, realizadas pelos movimentos sociais, universidades, coletivos, organização de classe e popular, todas denunciando a forma como são tratadas pelo sistema mundo, e a busca por justiça e igualdade.

No dizer de Lélia Gonzalez, é fundamental entender as mulheres negras na sua pluralidade e desconstruir as representações essencialistas, própria da historiografia colonial que as invisibiliza. Cabendo desnaturalizar imagens que reproduzem o sexismo, racismo e concepções das negras destituídas de valor e força.

Importa oportunizar que sejam ouvidas ao expressar seus saberes, ancorados no Feminismo Negro, por meio de processos de agenciamento que vêm de longe, com raiz na ancestralidade, resultante de acumulo de engajamentos, resistência, insurgências, todos mediados pela sororidade como arma poderosa rumo a novos pactos civilizatórios.

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora.