Quem foi o maior da tv: Chacrinha ou Silvio Santos?

Antes de qualquer olhar torto ou pantim de cancelamento, vos digo: Silvio Santos foi sim um gênio da comunicação popular, glória ao SS no altar da tv brasileira. Dito isto, lanço uma provocação decente à guisa de folguedo e brincadeira. Quem foi maior: o carioca Sílvio ou o pernambucano Chacrinha? Fico com o representante do Nordeste. Aqui trago a minha defesa, minha loa e homenagem.

Ele veio para confundir, não pra explicar. Abelardo Barbosa foi o apresentador mais escrachado da tv do planeta. Era bagunça demais até para o Tim Maia, que abandonou o palco depois de ter a bunda beliscada por uma chacrete. Conto esse episódio mais adiante.

— Vocês querem bacalhau??? — perguntava, aos gritos, o apresentador.

E tome toras de peixe lançados na plateia! Não havia escolha: quem estivesse naquele auditório poderia, a qualquer momento, ser atingido por uma tora do peixe salgado da Noruega.

Era guardar o presente para a bacalhoada e bater palmas para receber o desfile dos cães mais pulguentos do Brasil. Quem levará o grande prêmio?

Nunca houve um programa na telinha como o de Abelardo, que resistiu no ar de 1957 a 1988. Com o seu Cassino ou na Discoteca, ele inventou a ideia de escracho e é referência até hoje em qualquer emissora que deseja sair de um roteiro comportado e certinho.

“O Chacrinha foi um pioneiro da comunicação de massas que se inaugura naqueles inícios dos anos 60. Os grandes fundadores da cultura de massa foram os Beatles, Picasso, Kennedy, De Gaulle e Chacrinha”, definiu o jornalista e apresentador Pedro Bial, criador do espetáculo “Chacrinha, o Musical”.

Toda bagunça, porém, será remunerada. Essa era a lei do apresentador. Nada era de graça, embora tudo parecesse um grande improviso. O lance do bacalhau, por exemplo, começou como uma ação de marketing pioneira para as Casas da Banha, rede de supermercados populares do Rio que patrocinava o programa.

O produto havia encalhado, no final dos anos 1960, mas bastou o Chacrinha sacudir o peixe no auditório para que todo o estoque se esgotasse em poucas horas. Abelardo estava na TV Tupi nesse momento.

O documentário “Eu Vim Para Confundir e Não Para Explicar”, dos diretores Cláudio Manuel (ex-Casseta & Planeta) e Micael Langer, é a melhor fonte para entender o que foi e o que representou esse fenômeno. É uma viagem no tempo direto ao palco e também aos bastidores.

O músico Tony Belotto, dos Titãs — banda freguesa do Chacrinha nos anos 1980 — conta da fartura de uísque paraguaio nos camarins do programa – a bebida era então uma espécie de “commoditie” nacional, já que o original era caríssimo, por causa das barreiras de importação impostas pela Ditadura Militar.

No mesmo documentário, a ex-chacrete Rita Cadillac lembra que Chacrinha incentivava suas assistentes de palco a passarem a mão na bunda dos cantores que, em sua maioria, levavam numa boa. Um alvo delas, porém, não gostou nada da brincadeira e abandonou o palco depois de ser atingido.

— O que aconteceu? Vai chamar ele. O Tim Maia foi tomar banho? — Chacrinha ainda tentou contornar a situação, mas era tarde demais. O rei do soul brasileiro havia dado mesmo o fora.

Chacrinha não chacoalhava apenas com o seu auditório. Às vésperas da viagem da Seleção Brasileira para a Inglaterra, onde disputaria a Copa do Mundo de 1966, Abelardo provocou uma confusão danada ao anunciar que daria uma "bolada" em dinheiro vivo a quem conseguisse levar Pelé ao seu auditório.

A cidade ficou uma loucura, com o desespero das pessoas para tentar achar o craque. Na concentração da equipe, em Teresópolis, na região serrana, a segurança precisou ser reforçada para que o camisa 10 não sofresse, vai saber, um sequestro.

Chacrinha morreu em 1988, aos 70 anos, no Rio, de infarto do miocárdio e insuficiência respiratória, decorrentes de câncer de pulmão. Cerca de 30 mil pessoas passaram no velório do Velho Guerreiro na Câmara Municipal do Rio. As suas frases e bordões que marcaram a história da TV brasileira ecoavam na multidão:

"Eu vim pra confundir, não pra explicar."

"Na TV nada se cria, tudo se copia."

"Não sou psicanalista e nem analista. Sou vigarista."

“Alô Sarney, não perca de vista o pecuarista."

"Alô, Dona Maria, seu dinheiro vai dar cria."

"Quem não se comunica, se trumbica."

"Terezinha, ú, ú..."

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.