A gente, quando tem uma origem de “beradêro” (matuto), se espanta com as coisas novas e fica com receios ao se aproximarem.
Quando a imagem da televisão chegou ao Cariri, no final dos anos 1960, fui convidado por um companheiro de rádio que possuía aparelho de TV, para assistir, ao vivo, o jogo Paraguai e Brasil, direto de Assunção, pelas eliminatórias da Copa de 1970.
Como o sinal televisivo chegava por meio da CITELC (depois Teleceará e, posteriormente, Telemar), em caráter experimental, imaginei que se tratava de uma pegadinha, termo esse que não era usado naquela época.
Quando me deparei com a imagem do jogo, nítida, em preto e branco, da TV Ceará, pertencente aos Diários Associados e que retransmitia jogos da TV Tupi, foi como uma epifania.
Placar de 3 X 0 para o Brasil, sem maiores dificuldades, com a nossa seleção comandada por João Saldanha, que seria substituído por Zagalo para a Copa do Mundo de 1970, no México.
Em nossa ingenuidade de imberbes 22 anos, dizíamos, de bestas que éramos, o seguinte: “No México, por ser mais distante, a imagem da transmissão não será igual e, provavelmente, estará “chuviscada”.
Vê se pode, um negócio desse?
Quando Brasil x Tchecoslováquia se perfilaram para execução dos hinos nacionais, fiquei sem acreditar, diante das imagens ao vivo, tomado por uma emoção inexplicável.
Foi outro arrebatamento naquele instante glorioso. Já como profissional de rádio experimentado, muito tempo depois, jogos televisionados se apresentaram para mim, à princípio, como uma ameaça ao futebol Brasil afora.
Imaginava que os mais importantes jogos dos campeonatos, carioca e paulista, seriam páreos desleais, na preferência do torcedor, para os confrontos estaduais.
Como as transmissões de jogos ao vivo pela TV eram raras, essas coberturas mais freqüentes, imaginava preocupado que teríamos uma desmistificação de clubes e jogadores, num futebol mais acompanhado pelo rádio, até então.
Corríamos o perigo da banalização. O tempo e as mudanças extraordinárias das coisas, quando começamos a sair da era analógica das comunicações, dissiparam os meus receios.
Hoje, damos de cara com TV e futebol caminhando juntos, gerando receitas, sem as quais essa paixão mundial não teria como subsistir.
Em função dessa pandemia miserável, que atinge a tudo e a todos, com o barco do futebol fazendo água, federações e dirigentes de clubes se apressam em fazer a bola rolar, com televisamento de jogos realizados de portões fechados.
Recebem as cotas da televisão e perdem a renda das bilheterias. E claro, obedecendo às restrições sanitaristas impostas pela saúde pública.
São tempos em que a primazia da imagem aparece como solução para que a roda da economia volte a girar no futebol.