Polêmica sobre aumento do fundo eleitoral é mais barulho do que ação efetiva

Diante das repercussões, o tema vira palanque político e a discussão sobre suas complexidades não avança

No rol de projeções definidas na aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022 pelo Congresso Nacional, uma chamou atenção: o aumento do fundo eleitoral. Pauta que, sempre que vem à tona, abre um debate polêmico, mas superficial e, portanto, usado como palanque político, sem desdobramentos práticos.

Por meio de um dispositivo incluído no projeto pelo relator, o deputado federal Juscelino Filho (DEM-MA), o valor previsto para o custeio das campanhas nas eleições gerais do ano que vem chega a R$ 5,7 bilhões. Mais que o triplo do montante destinado ao fundo no último pleito geral, em 2018 (R$ 1,7 bilhão), e também superior aos valor gasto nas eleições municipais de 2020 (R$ 2 bilhões).

A aprovação da LDO nestas circustâncias não demorou a gerar reações, inclusive entre parlamentares cearenses: alguns dos que votaram contra a medida apontaram o contrassenso do Legislativo ao aumentar gastos eleitorais com dinheiro público diante da situação calamitosa vivida por milhares no País. 

Houve também os que, mesmo votando a favor da LDO, fizeram malabarismo para tentar se afastar das críticas, alegando serem contrários ao valor previsto para o fundo eleitoral.

Apenas uma dentre outras contradições expostas na votação, como a de congressistas de partidos que defendem menos gastos do Estado em uma lista extensa de áreas, mas votaram a favor do dispositivo que pode beneficiá-los - assim como aos seus - na tentativa de reeleição.

Cobrados nas redes sociais, porém, vários dos políticos que votaram a favor da LDO não comentaram o posicionamento.

Bancada cearense

Na Câmara dos Deputados, dentre 19 dos 22 parlamentares cearenses que participaram da votação, dez foram favoráveis à aprovação da LDO, enquanto outros nove rejeitaram a proposta. No Senado, dois dos três senadores do Ceará foram contra o aumento - Eduardo Girão (Podemos) e Tasso Jereissati (PSDB). Já Cid Gomes (PDT) votou a favor do projeto.

Em 2020, para as eleições municipais, o Congresso até tentou emplacar um montante de quase R$ 4 bilhões para o fundo, mas, depois de desgastes políticos, recuou. O valor ficou em R$ 2 bilhões. Neste ano, não voltou atrás.

Entre as declarações de repúdio, as incoerências entre o plenário e as redes sociais e o silêncio absoluto diante das repercussões, o que se vê é que um tema tão caro ao País acaba sendo tratado por alguns políticos com oportunismo, demagogia e pouca transparência.

No Parlamento, muitos querem sair "bem na foto", mas não ousam encarar a complexidade do debate. O financiamento público, que surgiu após a proibição de doações de empresas a candidatos, é necessário.

Debater o modelo

Necessário porque, mesmo com a proibição do financiamento de campanha por pessoas jurídicas, as doações de pessoas físicas - inclusive de donos de empresas proibidas de doar - ainda colocam postulantes em pé de desigualdade. A aposta nas "vaquinhas virtuais" - o "crowdfunding" -  também não se consolidou no Brasil.

O custeio das eleições com dinheiro público, portanto, tem justificavas razoáveis. A democracia tem um custo, afinal. O fundo eleitoral, idealmente, não deveria ser nenhum tabu.

Mas quando age como agiu na votação da LDO, o Congresso assinala os clichês da "votação na calada da noite", dos "políticos que não cortam da própria carne", e se afasta de um diálogo franco com a sociedade. Os questionamentos, legítimos, são nutridos por tal postura. A esta altura, cada parlamentar deveria explicar ao eleitorado os motivos do voto "sim" ou "não". Envolver quem o elegeu nos argumentos, prestar contas.

E, além disso, descer do palanque superficial do debate e colocar na mesa, com responsabilidade, a necessidade de discussão de melhorias ao atual modelo de financiamento de campanha, inclusive com alternativas à dependência massiva do dinheiro público.