Estrear algo novo sempre me dá frio na barriga. Já fiz teatro, cinema, novela, programas de TV, séries e a cada novo começo, o mesmo frio na barriga. Dessa vez, o palco é diferente, mas a sensação é a mesma. Estreio em palavras, empresto aqui meus sentimentos, confidencio opiniões e escrevo na tentativa de continuar a causar pequenas revoluções dentro de você.
Neste novo começo, onde me torno agora colunista, decidi dividir algo que quase me surpreendeu. Se não fosse meu já calejado jeito de ser “artista local”, daqueles que só conseguem valorização quando alcançam reconhecimento longe de sua cidade natal, confesso, eu teria me surpreendido, mas não.
Estava em uma rede social e fui fisgado por uma postagem que me chamou atenção. Era a divulgação de um livro que aborda processos criativos de coletivos teatrais de Fortaleza. Achei interessante e cliquei para ver mais sobre. Dos 15 comentários postados, 13 eram ofensivos, agressivos e gratuitamente violentos. Dentre eles, talvez, o mais delicado tenha sido “Diabo é isso?”.
Sei que a arte é um espaço coletivo - do artista e do espectador - e que redes sociais são terras de ninguém e de todos ao mesmo tempo, mas fiquei incomodado com isso. Sem precisar fazer muito esforço, percebi que a maioria dos autores desses comentários são pessoas que, provavelmente, nunca foram ao teatro, dificilmente devem ir a museus, muitos nunca devem ter comprado um ingresso para espetáculos de grupos locais e o que julgam saber sobre nós, artistas, é raso. Somos reduzidos a um único termo: “vagabundos”.
Digo isso, porque eu também já fui alguém que não enxerga a arte como POSSIBILIDADE DE VIDA. Na década de 90, a minha cabeça de menino nem pensava em arte. No interior do Ceará, eu só queria estudar e trabalhar para “ser alguém”. Arte não configurava espaço de educação e nem uma carreira profissional. Era mais uma pessoa vítima de um sistema que não nos incentiva a valorizar artistas, mas de fugir da arte.
Ao condenar a foto de uma exposição, um espetáculo de teatro, um livro a ser lançado, essas pessoas demonstram – apenas - violência. O artista não está perguntando o que você pensa sobre a obra dele. Postagens de divulgação são informativas. Se não interessa, basta não curtir, não comentar.
Vagabundo, segundo o dicionário, é “quem leva a vida no ócio”. Artista produz, trabalha, realiza e divulga também. Usar as redes sociais para agredir o trabalho de artistas locais é desrespeitoso. Se você desdenha, insulta ou desqualifica apenas pelo poder do anonimato da internet, isso não te faz melhor do que nós, apenas mais uma figura violenta e talvez até criminosa.
Ser artista é devoção! Em um país em que pouco se investe no respeito a nossa profissão e onde muitos teimam em nos taxar de vagabundos, eu fiz essa opção de fé. Pouco pela busca de um retorno financeiro e uma estabilidade, mas, especialmente, pelos caminhos de transformação individual e coletiva.
Meu ofício é questionar e provocar acontecimentos, conectar ideias criativas e ficcionais com realidade. Enquanto artista, o que pulsa aqui é uma enorme vontade de compartilhar percepções e, juntos, num diálogo entre criador e receptor, conseguirmos formular novas visões. Entretanto, nem sempre alcançamos esses objetivos. Fazer o quê? Ossos do ofício!
Este texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor