A constatação de que as mulheres ganham menos que os homens no Brasil, apresentada na última segunda-feira (25) por meio do 1º Relatório de Transparência Salarial do Ministério do Trabalho e Emprego, ganhou o noticiário. No Ceará, a diferença é de, em média, 13,4%. Em cargos de dirigentes e gerentes, a discrepância no Estado é ampliada para 29,4%.
Mulheres negras recebem, em média, 21,7% a menos que as não negras. Sobre as políticas de incentivo à contratação de mulheres vítimas de violência doméstica, apenas 4% das empresas cearenses possuem alguma iniciativa neste sentido.
As informações, por si (já sabidas e experienciadas pelas mulheres), elevam à garganta um desconforto que parece ser o mesmo sentido em cada situação de assédio moral. Em cada entrevista de trabalho onde mulheres são perguntadas com quem vai ficar o filho para que elas possam trabalhar. Em cada episódio de assédio sexual, sofrido no trabalho ou não.
O salário é um importantíssimo elemento para alcançarmos esse ideal, ou pelo menos para que nos aproximemos dele. Mas hoje, em tempos em que tanto se fala em salário emocional (incentivos que a empresa oferece que vão além do salário monetário), cabe trazer mais alguns dados do relatório do Ministério do Trabalho.
Esses dados mostram como as empresas no Ceará e no Brasil continuam distantes de oferecer um ambiente de trabalho que permita que as mulheres possam subir os degraus do sucesso profissional da mesma forma que os homens (não esqueçamos que a dificuldade para as mulheres pretas é ainda maior!).
Exemplo disso é que as políticas de promoção de mulheres a cargos de gerência e direção são realidade para apenas 35,9% das empresas no Ceará. Um número que pode e precisa melhorar. Mas como subir de cargo se elas sequer são contratadas? Só 26,7% das empresas no Estado contam com uma política de incentivo à contratação de mulheres.
Incentivo à contratação de vítimas de violência
Além disso, mesmo contando com elevados índices de violência contra a mulher (em 2023, o Ceará teve o ano com maior número de mulheres vítimas de violência doméstica em nove anos), apenas 4,3% das empresas contam com alguma política de incentivo à contratação de mulheres vítimas desse tipo de crime.
E quando a mulher tem filhos, sabemos que a situação é ainda mais complexa. Pois bem, o relatório também escancara isso: o Ceará é o quarto pior estado do País em política de licença paternidade/maternidade estendida. Apenas 10,3% dos negócios no Estado contam com esse tipo de iniciativa.
Um dos poucos indicadores que mostram o Ceará entre os dez melhores estados no relatório do MTE é o de política de auxílio-creche: 20,6% das empresas no Estado oferecem o benefício.
A advogada Mariana Deperon, especialista na área de diversidade e sócia do projeto Travessia e Inclusão, reforça que a igualdade de gênero possui diversas facetas e uma delas é a equidade salarial, mas que é importante olhar para essas outras políticas de incentivo.
“Outro ponto é a questão das políticas de inclusão relacionadas a gênero e aí falar de mulheres brancas e não-brancas, falar de oportunidades de desenvolvimento, falar de mulheres em liderança, então dentro dessa questão da equidade esses outros dados estão sendo levantados para efetivamente se verificar quais as empresas, qual a porcentagem que possui iniciativas que efetivamente promovam mais equidade”, pontua Mariana.
Evidências
A advogada também considerou louvável ter um relatório que dê transparência a esses números. “Acho que é uma grande inovação esses dados serem transmitidos para um órgão do governo para termos evidências e conhecer de fato qual é a desigualdade salarial e com uma visão interseccional; homens brancos, negros, indígenas, mulheres brancas e não-brancas, inclusive quais ações do ponto de vista das empresas devem ser tomadas”.
O que se espera, agora, é que de fato os negócios busquem mecanismos de minimizar essas diferenças e invistam em políticas que melhorem o ambiente para as mulheres. Mariana lembra que as empresas terão que elaborar um plano de ação para mitigar a desigualdade salarial e critérios remuneratórios, bem como tornar públicos em seus sites e redes sociais o Relatório de Transparência Salarial e Critérios Remuneratórios.
"As empresas que não tornarem públicas essas informações estão sujeitas à multa de 3% do valor da folha de pagamento, sendo essa multa limitada ao valor de três salários mínimos", lembra Mariana.
Se o "bolso é a parte mais sensível do corpo", como dizem popularmente, talvez possamos - torcemos por isso! - dar a notícia de que o relatório finalmente mostra que os salários estão se equiparando. Eu tenho fé! E você?