A madame da sacola de papel poderia ter saído de uma esquete de “A Vida de Tina” (personagem que ironiza a classe média), mas atravessou a rua de um dos bairros mais nobres de Fortaleza, no fim de tarde de uma sexta-feira. No punho, a coleira amarrada do cachorro de raça. Na língua, a fome por gente humilde.
A madame desceu de um dos ajuntamentos de arranha-céus do Dionísio Torres para passear com o cão, mas encontrou um vendedor ambulante no caminho. Inconformada com a poluição dos oceanos, como atestava o cenho franzido, decidiu questioná-lo sobre o porquê de ele ainda não ter trocado os sacos plásticos pelos de papel.
O vendedor teimou com o silêncio, enquanto fazia malabarismos para entregar lanches e passar trocos à dezena de clientes ao redor. Todos também silenciaram, inclusive eu. Mas a madame insistia: “olhe para mim enquanto falo”, disse e repetiu, até ser atendida com um breve olhar desconcertado.
Para a madame, o vendedor deveria parar de trabalhar para ouvi-la dizer como aquelas sacolas não são sustentáveis. Terminado o monólogo para uma plateia compulsória, ela se foi. Tinha uma urgência que acreditava ser obrigação daquele trabalhador informal não-branco compreender.
A madame não se atentou, porém, que o 1% mais rico da população mundial produziu tanta poluição quanto cerca de 5 bilhões de pessoas, segundo estudo da Oxfam Brasil. Há, sim, práticas individuais a serem adotadas, mas não podemos esquecer de reorientar a pressão sobre os gestores públicos e empresas responsáveis pela degradação ambiental.
Na coluna da semana passada, a doutora em Desenvolvimento Sustentável pela UnB e professora do Departamento de Estudos Interdisciplinares da Universidade Federal do Ceará (UFC), Suely Chacon, apontou que “podemos agir, mudando nossos hábitos”.
No entanto, destacou, “somente a mudança social poderá garantir a transformação das condições de vida na terra, considerando a atual emergência climática e as profundas desigualdades que marcam nosso tempo”.
No fim de abril, a quarta rodada de negociações da ONU para o Tratado Global Contra a Poluição Plástica (INC-4, na sigla em inglês), em Ottawa, no Canadá, reuniu 196 lobistas da indústria de combustível fóssil e química, conforme o Observatório do Clima. A reunião, todavia, terminou sem medidas para reduzir a produção e o consumo de plástico.
Ou seja, não está nas mãos de um vendedor ambulante provocar ou evitar as mudanças climáticas que empurraram o Rio Grande do Sul para debaixo da água, por exemplo.
Para se ter ideia, em 2015, um estudo produzido pelo Governo Federal já afirmava que o sul da América do Sul, em especial a bacia do Prata, poderia ter chuvas mais intensas e por mais tempo conforme o aquecimento global piorasse, de acordo o Observatório do Clima. Nada foi feito. Pelo contrário.
Conforme noticiado pelo site ECO em janeiro de 2020, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB-RS), alterou, em 2019, 500 pontos de um novo Código Ambiental, sem passar sequer pela Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa.
Refletir sobre nossos hábitos e atitudes não deve ser simplificado a substituir uma sacola, a um discurso seletivo. Culpabilizar grupos sociais da base da pirâmide não transforma e tampouco salva o mundo. Não sejamos a madame da sacola de papel.
4 pontos que você precisa saber
O que é ESG?
Por que o ESG é importante para o consumidor?
O que é a Agenda 2030?
O que é o Acordo de Paris?
Em tempo, as sacolas de papel também poluem e têm menor potencial de serem reutilizadas, sobretudo para colocar alimentos porque não podem ser molhadas. Portanto, todas geram impacto ambiental negativo. O ideal é optar pela sacola que demanda menos substituições para as idas aos supermercados, sejam as plásticas, de papel ou de algodão.
Mais de 80 comunidades indígenas foram atingidas no RS; veja como ajudar
Mais de 80 comunidades indígenas foram afetadas pelas enchentes no Rio Grande do Sul, segundo levantamento do Conselho Indigenista Missionário (Cimi Regional Sul). As famílias deixaram suas casas devido ao risco de alagamento e deslizamento de terra.
Para ajudá-los, as organizações pedem doação de alimentos, material de higiene e limpeza, lonas, telhas, colchões e cobertores para as comunidades.
O mapeamento é realizado de forma conjunta pelo Cimi Regional Sul, Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), Fundação Luterana de Diaconia, Conselho de Missão entre Povos Indígenas e Centro de Apoio e Promoção da Agroecologia (FLD/Comin/Capa), além do Conselho Estadual dos Povos Indígenas do Rio Grande do Sul (Cepi/RS).
As doações podem ser feitas para:
Banco do Brasil
Agência: 0321-2
Conta Corrente: 128891-1
Cimi Regional Sul
Chave Pix: 566601e8-72b1-4258-a354-aa9a510445d1