Urbicídios, as cidades destruídas por conflitos sociais no Mundo

A cidade romana de Pompeia foi destruída por uma forte erupção no primeiro século da nossa era. Já Londres foi transformada em cinzas por um dos grandes incêndios do século XVII. No século passado, mais especificamente durante a segunda guerra, dezenas de cidades europeias foram colocadas abaixo por combates aéreos e terrestres; e as japonesas, Hiroshima e Nagasaki, dizimadas pela bomba atômica. Estes casos ficaram na história, mas, infelizmente, outros atualizam o caos na vida urbana.

A destruição do espaço construído de cidades inteiras, longe de representar um colapso distópico, confirma as encruzilhadas com as quais nos defrontamos no século XXI. Numa era na qual as viagens à estratosfera podem se tornar tão comuns como qualquer atividade turística, somos levados a contar mais e mais casos de aniquilação da vida [urbana].

As catástrofes e os conflitos armados se espalham por várias cidades e as colocam em processo de destruição. Pessoas e patrimônios arquitetônicos são destroçados, ao passo que se estabelece uma cultura da ruína e dos escombros.

Bruscamente, a morte chega a milhares de lares e conduz ao aniquilamento das cidades. A esse processo monstruoso e, lamentavelmente, cada vez mais disseminado, podemos chamar urbicídio.

Porto Príncipe, no Haiti, é um claro exemplo de zona urbana em processo de arrasamento. A sequência de terremotos, furacões e, mais ainda, fragilidades institucionais e choques armados produziram uma grandiosa montanha de entulho, onde pessoas tentam sobreviver nas piores condições de vida social. A vida urbana como a entendemos foi impossibilitada.

Qusayr, Homs e Al Khalidieh, na Síria, são exemplos de urbicídio. A guerra civil, apoiada de um lado por russos e de outro por norte-americanos, criou nas cidades desse país paisagens desmanteladas e marcadas por sangue.

O leitor e a leitora curiosos são convidados a pesquisar na internet as imagens horrendas a materializar o deserto urbano e o sofrimento a ele associado. Por outro lado, as famílias, ao fugir desses conflitos, vão gerar “cidades de tendas”, campos de refugiados, a mercê da ajuda de países vizinhos e de instituições de ajuda humanitária.

Vinte anos após os bombardeiros norte-americanos na guerra ao terrorismo, as imagens televisivas de Cabul são representativas desse temor. Homens e mulheres tomaram um aeroporto a fim de escapar do governo talibã. Os civis urbanos que lá permanecem, sem opção de escapatória, sobretudo mulheres e meninas, estão assombrados pela violência e pela opressão dos detentores do poder no Afeganistão.

Mesmo distantes geométrica e socialmente dessas situações de guerra, somos convidados a pensar o presente de nossas cidades; de maneira especial, nas periferias sociais, nas zonas onde milícias e traficantes mantêm a “ordem” através da violência simbólica e da violência física. Nessas áreas, vale a lei do silêncio e os indesejados são expulsos de suas residências ou, pior, mortos.

Fiquemos bem atentos e cuidadosos para que, num futuro bem próximo, não sejamos nós a observar o processo de urbicídio lento e perverso em nossas cidades. Se o pior acontecer, não será por guerra ou catástrofe natural, e sim por omissão dos poderes republicanos.

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.