Sabe aquela lista de coisas que você precisa cumprir na vida? Tenho uma provocação para quem nos lê aqui no Diário do Nordeste: você precisa ter a experiência de percorrer uma trilha na Chapada do Araripe. O Cariri pode ser considerado um paraíso para os trilheiros de todo o Brasil. Você vai entender por quê.
Nesse relevo arenítico em forma de platô que divide o Ceará dos estados de Pernambuco e Piauí, as trilhas são tão grandes que atravessam municípios. A do Picoto, por exemplo, começa no Crato e termina em Barbalha. São cerca de 10 quilômetros de mata, um percurso sombreado e quase todo plano e ainda com aberturas para mirantes que permitem apreciar a beleza cênica do vale verde em plena Caatinga.
Belmonte, Pedra da Torre, Vale dos Buritis, Riacho do Meio, o Cariri tem muitos caminhos que permitem contato direto com a natureza e com o silêncio, algo raro nas nossas cidades. É um potencial que poucas áreas do Nordeste têm.
O turismo de trilha alavancou outras chapadas do interior do Brasil. A Diamantina, na Bahia, e das Mesas, no Maranhão, são dois destinos onde o turismo ecológico virou atração principal e sustenta a economia.
Para que o Cariri se torne um destino nacional do turismo ecológico, arrisco dizer que falta divulgação, campanha publicitária, a venda desse destino, inclusive dentro do próprio Ceará. A região conta com uma estrutura de hotelaria, estabelecimentos de gastronomia, além de um aeroporto com voos diários para Fortaleza, Recife e São Paulo e que fica a cerca de 20 km das principais trilhas.
O Instituto Chico Mendes da Biodiversidade percebe esse potencial e lançou edital para que as trilhas sejam adotadas. As instituições que adotarem as trilhas poderão explorar nelas espaço de publicidade, feito o que já acontece com praças adotadas nas cidades.
A essência do Cariri está nas matas
Mas fazer uma trilha é muito mais do que se refugiar num espaço verde, para se desestressar um pouco do cinza das cidades. As trilhas permitem contato com a água cristalina que brota na encosta da Chapada do Araripe e também a observação da flora e de animais endêmicos, como é o soldadinho-do-araripe, de asas alvinegras e a bela crista vermelha.
As trilhas do Cariri são um caminho também para descobrir uma região de culinária saborosa e uma história ancestral. O Cariri é o berço nordestino dos fósseis e, por causa do isolamento geográfico, mantém tradições na música, na dança, nas artes e até na forma de falar.
Este autor é um tardio apaixonado por trilhas. Após viver uma década no Cariri, comecei enfim a trilhar esses caminhos da natureza e posso garantir: uma trilha é também um encontro consigo mesmo. É uma oportunidade de se desafiar, de conversar sozinho (por que não?), de dividir um objetivo com os amigos, já que na trilha é comum que um trilheiro apoie o outro moral e fisicamente.
As trilhas do Cariri são um caminho para o próprio universo particular, diria um trilheiro que arrisca a filosofia entre as árvores e o próprio silêncio.