Uso de tecnologias no campo impulsiona produtividade de lavouras no Ceará

Produtores locais estão intensificando investimentos em soluções inovadoras em diversos pontos da produção, desde a qualidade das mudas até a análise de dados

A tecnologia e a automação já são boas conhecidas das plantas industriais, mas também largamente utilizadas pelo agronegócio para ampliar a eficiência e os resultados da produção. No Ceará, soluções locais conseguem elevar a produtividade das áreas plantadas em até 40%.

A 3V3 Tecnologia é uma empresa cearense que desenvolve sensores e sistemas para automatização e monitoramento da irrigação. Voltada para o mercado agro desde 2014, a empresa teve forte expansão com os anos de chuvas abaixo da média e já levou a tecnologia a seis estados.

O sócio-diretor da 3V3, Michel Freire, aponta que o mercado do agronegócio local possui produções que necessitam de irrigação, um desafio pelo clima do Estado, marcado por estiagens.

"Na agricultura, onde se investe mais é em água, por isso a 3V3 foca exatamente nisso, no uso eficiente dos recursos, com monitoramento desde a captação da água até a aplicação, tudo automatizado", afirma.

Ele detalha que, a partir do monitoramento, é possível identificar áreas que estão recebendo pouco ou muito volume de água, permitindo o ajuste da vazão e evitando perdas.

Sobre os resultados, Freire indica que, em alguns casos, a produtividade da área plantada aumentou em até 40% após a instalação dos sensores. "Cem por cento dos nossos clientes continuam usando nosso equipamento, mesmo quem comprou seis anos atrás. Isso significa que continua dando resultado", argumenta.

Além da economia de recursos e do aumento da produtividade, o sócio-diretor da 3V3 aponta que os equipamentos ainda permitem reduzir a mão de obra.

"Temos muitos clientes com foco em exportação, principalmente para a Europa. E o sistema é usado como ferramenta de venda. Nosso cliente usa o argumento de que faz uso eficiente da água, que é ecologicamente correto. Isso traz outro apelo", ressalta.

Ele acrescenta que os produtos podem ser usados nos mais diversos tamanhos de produção, de forma que a empresa atende pequenos produtores de uva em Petrolina (PE) até grandes produtoras de melão em Icapuí (CE).

Biotecnologia

Os cearenses também já estão se aventurando em melhorias genéticas na agricultura. A BioClone, empresa local, faz a análise genética da área de produção, as trata em laboratório para reduzir a vulnerabilidade a pragas e melhorar a qualidade do produto, que então é clonado.

"Ao final do processo, tenho um material já multiplicado, melhorado e limpo de doenças. Além de aumentar a produtividade e o padrão de qualidade, ainda reduz a quase zero o uso de defensivos", explica Roberto Caracas, presidente da BioClone.

Há 13 anos no mercado, a empresa está presente em diversas partes do País, mas tem no Ceará, Minas Gerais e Bahia os principais mercados. A tecnologia ainda pode ser utilizada em diversas produções de fruticultura, como abacaxi, banana e mamão, e de horticultura, com a batata-doce e cana-de-açúcar, principalmente.

O processo mantém os resultados no médio-longo prazo e só precisa ser refeito a cada dois anos, no caso da banana, e a cada 10 anos, para a cana-de-açúcar.

"Um produtor que planta muda convencional da batata, por exemplo, tira de 10 a 15 toneladas por safra. Se plantar a clonada, consegue de 40 a 60 toneladas. Ele mais que triplica a produtividade na mesma área, paga o investimento e ainda tem lavoura muito melhor e com menos doenças e pragas", destaca Caracas.

Ele também destaca a vantagem da produção mais coesa e homogênea para exportação e o ciclo de produção mais curto, garantindo receita antecipada.

Tecnologia própria

Além de investir em tecnologia pronta, as empresas locais estão desenvolvendo as próprias soluções, como é o caso da Itaueira, que possui áreas de melão e pimentão no Ceará. Conforme o diretor de tecnologia do grupo, Josias Cavalcanti, a Itaueira já possui tecnologia em todos os pontos da cadeia, desde o monitoramento das áreas através de satélite ou drones, até o transporte climatizado e rastreamento dos alimentos.

"Nos últimos dois anos, a Itaueira intensificou seus investimentos em mais de 300% na consolidação das centrais de tecnologia da informação e de automação. Para 2021, temos uma previsão de intensificarmos ainda mais os investimentos com um acréscimo de mais de 200% nestas centrais de serviços", revela.

Entre as soluções próprias já implementadas, está um dispositivo que permite distribuir sinal Wi-fi em área remotas, melhorando a comunicação das equipes e o monitoramento em tempo real. A empresa ainda criou um sistema de coleta e armazenamento de dados de produção e do mercado, gerando relatórios e aprimorando o aprendizado de máquinas.

"O diferencial desta estrutura é ela ser genérica e podermos fazer isso para qualquer informação coletada que seja relevante. Por exemplo, podemos armazenar dados de temperatura e umidade do ar do campo, assim como uma pesquisa de qualidade do alimento que chega em São Paulo. Os dados estão na mesma estrutura e podemos extrair indicadores e correlaciona-los de forma mais fácil por estarem padronizados", explica Cavalcanti.

Ele ainda detalha que o aprendizado de máquinas se beneficia pela busca de identificação de padrões de causa e efeito das informações coletadas, podendo gerar alertas ou novos valores de referência para que determinados parâmetros sejam controlados.

"É um assunto que estamos pesquisando e devemos fazer nossos primeiros testes práticos em breve, devendo iniciar na área de suprimento de insumos, já que seria mais fácil de observar alguma anormalidade", acrescenta.

Popularização da tecnologia

O secretário executivo do Agronegócio do Estado, Sílvio Carlos Ribeiro, revela que diversas áreas do setor no Ceará têm passado por transformações tecnológicas, como a pecuária, a aquicultura, a pesca marítima e a própria agricultura.

"Todos os produtos, para ganhar produtividade, têm que usar tecnologia. Ela garante uma maior competitividade, melhores preços, uma logística mais favorável. Desde a porteira da propriedade até chegar a um contêiner para exportação ou prateleira, todo esse processo envolve muita tecnologia", afirma.

Ele indica que os sensores de solo e clima, além da automação do bombeamento de água, colheita e embalagem, são as soluções mais presentes em produções do Estado.

"Temos acompanhado todo esse no know-how que vai sendo transferido de tecnologias próprias pelas universidades como também importação de tecnologias com grande velocidade de chegada", ressalta.

O presidente da Câmara Setorial do Agronegócio da Agência de Desenvolvimento Econômico do Ceará (Adece), Amílcar Silveira, lembra que a utilização de tecnologias está se tornando indispensável para a sustentação dos negócios, assim como na indústria e outros pontos da cadeia.

"Na agropecuária, temos dados passos largos com genoma, que é uma avaliação genética que antecipa resultados, fora os transgênicos. A tecnologia veio para ficar e precisamos nos adequar a essa nova realidade com inovação e pesquisa", pontua.

"A cada dia que passa, fica mais difícil encontrar mão de obra para o campo. A industrialização chegou nas cidades do Interior. Em Russas, tem uma indústria de calçados que emprega cerca de 6 mil pessoas, mão de obra que é proveniente do campo. Então, precisamos automatizar os processos", acrescenta.