De roupas a casa: por que os produtos virtuais ganham espaço no mercado

Consumo de produtos virtuais para uso na internet - como itens de jogos, roupas ou até casas - se diversifica e é reforçado por valores de marcas

A criação de produtos para consumo virtual, a exemplo do tênis Virtual 25 lançado pela marca Gucci, vem ganhando mais espaço no mercado. O tênis, por exemplo, não passa de um filtro que pode ser visto — ou “usado” — em algumas plataformas digitais. 

“Numa sociedade contemporânea de consumo, a relação do ter versus parecer promove uma identificação grande do indivíduo com aquilo que ele possa parecer, ainda que todos, inclusive ele, saibam que, de fato, ele não tem e não é daquele jeito”, aponta a pesquisadora em marketing Lígia Sales.

Em meio a essa cultura de egos e de tornar tudo “instagramável”, as empresas encontraram uma maneira de lançar produtos que não existem, analisa Gal Kury, consultora de marketing e professora da pós-graduação da Universidade de Fortaleza. 

“Isso acontece quando você tem o consumo da marca. Por exemplo, usar um tênis de realidade aumentada, virtual, comprar o tênis virtual só para postar nas redes sociais, como é o caso da Gucci, é uma coisa que só existe porque é uma marca a qual as pessoas conferem algum tipo de valor. Eas querem fazer parte de um contexto em que você é moderno, diferente, etc”, explica. 

Mercado em ascenção

Essa tendência para consumo de produtos digitais, já muito difundida no universo de jogos, ao se expandir cada vez para a moda também reflete a busca pela singularidade.

Enquanto nos games os jogadores consomem skins, produtos que personalizam cada jogador e seus itens pessoais, na moda é possível encontrar peças virtuais de roupas exclusivas para fotos. 

Em 2019, uma das primeiras peças virtuais - um vestido - foi leiloado por US$ 9,5 mil dólares, segundo o Techtudo, cerca de R$ 60 mil pela cotação atual. 

Kury acredita que no crescente mercado da moda, as peças digitais estão relacionadas ao fast fashion, modelo adotado por grandes fabricantes, com roupas de custo reduzido e menor tempo útil. 

“Você vai ter lançamentos semanais, quinzenais... se as marcas conseguirem trabalhar isso é uma mina de ouro, porque tem o custo de desenvolvimento do design, mas não tem o custo de produção. Se você vender pelo mesmo preço que vendia na loja, é um negócio fantástico”, expõe. 
Gal Kury
Analista de Marketing e professora da Universidade de Fortaleza

Para isso, as marcas buscam virar um objeto de desejo, o que é muito facilitado pelas redes sociais, ela explica.  

“Os filtros de Instagram viraram um fenômeno comum das pessoas brincarem de se vestirem virtualmente. Esse vestir virtualmente traz também um caráter lúdico, no estudo de neuromarketing é algo que desperta gatilhos mentais, que faz lembrar o prazer da brincadeira na infância, isso te torna mais relaxado e mais predisposto a consumir. Acredito que é um mercado em ascensão.”

Conheça alguns produtos virtuais já vendidos

  • Gucci Virtual 25 (modelo de tênis) - US$ 12 (R$ 63,61 em cotação atual)
  • Roupas e acessórios pela Dressx - de US$ 21 a US$ 350 (R$ 111 a R$ 1855)
  • A Mars House (primeira casa virtual vendida no mundo) - 288 Ether (criptomoeda), equivalente a mais de R$ 6 milhões na cotação atual

Diferentes aplicações

A realidade aumentada também já é utilizada para vendas no setor imobiliário. Segundo a analista de marketing, o comprador consegue ver como será o imóvel numa proporção mais aproximada do real dentro do próprio cômodo

Uma casa virtual projetada por uma artista canadense chamada Krista Kim com a ajuda de um arquiteto de software e games foi vendida por 288 Ether, uma espécie de criptomoeda semelhante ao Bitcoin, segundo publicação do Uol. Se convertido, o valor é da ordem de US$ 500 mil ou R$ 2,75 milhões, na cotação atual.

Ao adquirir a Mars House ou Casa de Marte, o comprador receberá um arquivo digital dela, com uma assinatura digital exclusiva que permite verificar a autenticidade do produto, segundo o Uol.

Kury pondera, entretanto, que o modelo pode incentivar a um consumo desenfreado. "A cultura da superficialidade é muito grande, e ainda num cenário de muita incerteza no qual o virtual vem tomando proporções na nossa vida muito intensas”, interpreta.