Com hubs, ‘o Ceará está no caminho certo’

Especialista em desenvolvimento regional comenta a situação atual do Nordeste e os planos do Estado para o futuro

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Qual a avaliação da situação econômica do Nordeste?

Nordeste vem de uma fase muito boa, que antes da crise, produziu mudanças muito interessantes. A Região muito beneficiada pela política de melhoria da renda das famílias e dinamizou e atraiu investimentos de empresas daqui e das que vieram de fora. Foi uma mudança para melhor, puxada pelo dinamismo do consumo e que está em crise porque a renda cresceu pouco e o desemprego está alto. Então, a situação das famílias é mais difícil agora, pois esse estímulo, por enquanto, não existe. Mas, independente do consumo, o Nordeste trouxe uma série de investimentos muito interessantes, atraídos por vantagens competitivas que a Região tem. 

A crise foi um desafio, porque também afetou o Nordeste, mas não afetou muito. Foi no padrão da queda nacional, com algumas variações, mas sem caos. Onde bateu mais forte foi a questão do emprego, mas nos dados do PIB é tudo muito próximo.

Olhando para frente, primeiro um alerta: o Nordeste tem que mudar o discurso. Nós temos ainda uma diferença grande em relação ao Sudeste, sobretudo, mas a região tem muito potencial. A elite empresarial, os governantes, os acadêmicos deviam ocupar a maior parte do seu discurso apresentando o potencial da sua região, contra a choradeira da desigualdade. Precisamos olhar o que temos de bom</CW>.

Quais as tendências da economia no período pós-recessão e o que deve se fazer mais presente? A industrialização ainda é o caminho mais acertado para o desenvolvimento da Região?

Sou daquelas que acha que indústria tem um papel muito relevante. Coisas que eram industriais viraram terciárias, mas veja que os EUA têm na pauta deles trazer a indústria que perderam para a China. Ou seja, se a indústria não fosse boa, não estava todo mundo atrás. Esse seja talvez o principal desafio do Brasil. Precisamos engatar nosso vagão no trem da quarta revolução industrial e o Nordeste precisa ir junto. Tem que ser um debate nacional e espero que haja nesse ano de eleição.

Na indústria também tivemos novidades em todos os Estados. Trouxemos um bloco de investimento muito interessante nesse setor, como automóvel em Pernambuco e siderurgia no Ceará, que eram empreendimentos que não tinham. Estamos partindo de um outro patamar, agora.

Para desenvolver o que tem de bom na Região, dois fatores são estratégicos: infraestrutura e inovação. Na infraestrutura, que continua sendo desvantagem competitiva do Nordeste, tende a piorar porque tudo indica que o modelo de financiamento do investimento vai passar com muito mais forte pelo setor privado, por conta da crise fiscal dos governos. Então, PPP, concessão, são a tendência e quando coloca protagonismo maior no setor privado tende a levar o investimento para onde tem maior retorno, e o Nordeste tende a ficar prejudicado porque não tem a maior densidade econômica do País.

Sobre a inovação, não temos uma energia colocada nisso. Educação melhorou com a educação superior, mas tem uma mudança em curso no mundo, onde determinadas profissões vão desaparecer e outras vão nascer e é preciso estar de olho no que vai nascer. Inovação, exatamente por causa dessas mudanças todo mundo vai ter que se reinventar, quem precisar sobreviver; Então, políticas de empresas e dos governos de inovação mais agressivas</CW>.

Qual o papel do Banco do Nordeste nesse cenário? E a Sudene, como a senhora avalia a instituição nesse momento? Ainda terá um papel relevante?

A Sudene foi recriada sem instrumentos de atuação e não dá para apostar nela como está. Já o Banco do Nordeste manuseia um recurso muito importante, o FNE, e saber para onde vão esses recursos é importante.

 Aqui no Ceará, o governo tem apostado na chamada trinca de hubs (aviação, portuária e tecnologia), além de um pacote de concessões. Como a senhora avalia esse projeto de desenvolvimento?

Acho que o Ceará está no caminho certo. A economia mundial recomenda isso: quem puder ser hub tem que ser e o Estado entrou nessa disputa e entrou corretamente, acho que é isso mesmo. Além disso, o turismo do Nordeste deu uma melhorada muito grande e o Ceará avançou no aéreo, no portuário. Fortaleza tem uma área de influência quando olhamos os mapas do IBGE muito interessante, que é maior até de Recife. Na minha leitura, que vai ser de Nordeste, isso tudo devia ser combinado. É preciso uma articulação mais forte entre os estados nordestinos porque, às vezes, essa competição entre nós faz com que todos tenhamos perdas, no fim das contas.

Saiba mais
 
Formação e experiência
 
Tânia Bacelar é economista e socióloga, doutora em Economia Pública e Organização do Território pela Universidade de Paris I Panthéon-Sorbonne. É especialista em desenvolvimento regional. Foi diretora de Planejamento da Sudene (1985/86) e do Departamento de Economia da Fundação Joaquim Nabuco (1990/95); secretária de Planejamento e secretária da Fazenda do Estado de Pernambuco (1987/1990); secretária de Planejamento do Recife (2001/02); e secretária Nacional de Políticas de Desenvolvimento Regional do Ministério da Integração Nacional (2003). Desenvolveu trabalhos de consultoria e pesquisa junto a organismos internacionais como IICA, PNUD, BID e OIT; nacionais como IPEA, CNI, CUT, Fundap/Iesp, BNB, Sebrae, Senac, MDA, Celpe Paranacidade, Senac/PE, e Chesf. 
 
Mais informações:
 
Tânia Bacelar participa de evento promovido pelo Centro Industrial do Ceará (CIC) na quarta-feira, na sede da Federação das Indústrias do Ceará (Av. Barão de Studart, 1980 - Aldeota), às 18h30
 
*Economista e Socióloga