O anúncio do fechamento do Mercado Extra Seis Bocas, na avenida Washington Soares, em Fortaleza, previsto para o próximo domingo (12), deixa a bandeira com somente uma loja no Ceará. A mudança pode indicar que a empresa deve adotar a descontinuidade total da marca no Estado ou a utilização da única unidade na Capital para testes, segundo especialista ouvido pela reportagem.
Será a segunda loja do Mercado Extra a encerrar as atividades em Fortaleza em um período de pouco mais de quatro meses. Em 31 de dezembro de 2023, a unidade localizada próximo à avenida Oliveira Paiva também fechou as portas.
Com os fechamentos, o Mercado Extra vai continuar com somente uma loja em todo o Ceará, localizada na avenida Deputado Oswaldo Studart, no Bairro de Fátima, quase em frente ao Terminal Rodoviário Engenheiro João Thomé.
A reportagem esteve na última unidade remanescente da bandeira nesta quarta-feira (8). De acordo com funcionários da loja, não há informações recentes sobre o fechamento do estabelecimento, que contava com funcionamento normal.
Questionado sobre o fim da unidade em Fátima, o que culminaria no encerramento definitivo do supermercado no Ceará, o Mercado Extra informou em nota que "a loja permanece aberta, inclusive como sugestão de ponto de compras físico com o fechamento da unidade Seis Bocas".
Encolhimento no Nordeste e expansão no Sudeste
A bandeira Extra ficou reconhecida na região pelos hipermercados. No auge da operação no Ceará, a marca chegou a ter cinco estabelecimentos, todos em Fortaleza. Entre os anos 2000 e 2010, houve a expansão, mas com a configuração de Extra Supermercados, focada em varejo alimentício.
Com o reposicionamento da marca, as lojas foram renomeadas para Mercado Extra, focada em proximidade. Em 2022, após a conversão dos cinco Hipermercados Extra para Assaí e Pão de Açúcar, o Mercado ficou sendo o único representante da bandeira no Estado.
A marca faz parte do Grupo Pão de Açúcar (GPA). Somente em Fortaleza, são 13 lojas do supermercado Pão de Açúcar, reconhecido pelo conceito de proximidade premium, voltado para o público A e B. Já o Mercado Extra é reconhecido pela competitividade com empresas regionais do setor.
Nos últimos anos, no entanto, a participação da bandeira no mercado nordestino vem encolhendo. Prova disso é a presença regional das lojas. Com o fechamento da unidade da Washington Soares, o Mercado Extra terá somente nove estabelecimentos no Nordeste:
- Ceará: 1;
- Paraíba: 1;
- Piauí: 1;
- Pernambuco: 6, sendo uma em Olinda, uma em Jaboatão dos Guararapes e quatro em Recife.
Na contramão da participação nos estados nordestinos, o Sudeste concentra mais de 90% das unidades da bandeira. São 111 lojas no estado de São Paulo e outras 36 no estado do Rio de Janeiro, segundo informações disponibilizadas no site do Mercado Extra.
De acordo com o balanço financeiro do 1º trimestre de 2024 do GPA, divulgado nesta quarta-feira (7), o Mercado Extra teve o melhor trimestre desde o 2º trimestre de 2022, com aumento de 7,2% nas vendas. Não foram abertas novas unidades da bandeira entre janeiro e março deste ano, que conta com 178 estabelecimentos pelo Brasil.
Além do Mercado, o Extra mantém outras duas bandeiras: a de postos de combustíveis e a do minimercado de proximidade. Com relação à primeira, a empresa "já anunciou que o negócio está à venda", enquanto a segunda, que compartilha público-alvo similar ao do supermercado de mesmo nome, segue em expansão, sobretudo em São Paulo.
"O foco da expansão do nosso negócio de proximidade, onde o Mini Extra está inserido, é a cidade de São Paulo e interior do Estado", destacou a companhia.
Descontinuidade da marca no Nordeste não é descartada, diz especialista
Pelos dados divulgados no balanço do 1º trimestre do GPA e com as informações trazidas pelo grupo, de priorizar a abertura lojas da bandeira Minuto Pão de Açúcar, no conceito de proximidade premium, Ulysses Reis, professor de varejo da Strong Business School (SBS), instituição conveniada à Fundação Getulio Vargas (FGV), afirma que o Mercado Extra pode estar com os dias contados na região.
Isso se deve ao fato da forte concorrência das bandeiras regionais, mas principalmente ao crescimento exponencial dos atacarejos e similares, que seguem em expansão no mercado nordestino, reduzindo o espaço para o modelo de proximidade adotado pelo Mercado Extra.
"O Extra está fechando, tirando a bandeira, mas deixando o Pão de Açúcar. Os atacarejos estão muito fortes, é um fenômeno que tá acontecendo. Está havendo uma migração muito para os atacarejos, é uma operação supermercadista que não para de ganhar força", pontua.
Está acontecendo o fortalecimento do atacarejo, ou seja, supermercadistas que têm uma exposição de produtos mais simples, mais barata, custos menores. O posicionamento que está acontecendo em Fortaleza é manter o supermercado Pão de Açúcar para a classe A e B, e a gente sabe que a classe A de Fortaleza é forte. Pega-se a marca Extra e vai descontinuando, provavelmente para fortalecer duas operações novas: a primeira é o atacarejo, e a segunda é o de mercado de proximidade.
Ainda de acordo com o professor, especialmente no Ceará, na Paraíba e no Piauí, que mantêm apenas uma unidade do Mercado Extra, deve ter desafios principalmente em termos logísticos: "É um problema sério. Acho difícil que isso se mantenha", reflete.
Mercado Extra em CE, PB e PI como 'flagship'
Outra possibilidade ressaltada por Ulysses Reis é que a unidade do Mercado Extra remanescente em Fortaleza pode ser usada como flagship ou lojas-conceito. Estas unidades buscam estreitar a relação entre a marca e o cliente.
Na definição de Ulysses Reis, as unidades solitárias do Mercado Extra nos três estados do Nordeste podem servir como flagship para testar inovações do GPA, além de indicar expansões com outras bandeiras do próprio grupo, principalmente Minuto Pão de Açúcar e Mini Extra, focos atuais da empresa.
"Qualquer operação varejista tem uma loja que fica testando o mercado, análises de produtos, de público, de tecnologia, enfim. Acredito que talvez essa loja em Fortaleza possa ser de perfil flagship, que seja voltada para analisar situações. Vão analisar a operação deles, mas também analisam novas possibilidades de mercado, em teste contínuo", argumenta.
Especialmente no caso de Fortaleza, pelo fato de a loja estar localizada em frente à principal rodoviária da capital, com um público consumidor mais diverso e com origem dos mais diferentes locais do Ceará e até mesmo do Brasil, Ulysses Reis acredita que o posicionamento do Mercado Extra possa ser estratégico, desde que sejam assumidos certos riscos operacionais.
"É uma loja que testa tanta informação, tanta descoberta, que eles podem estar usando até para criar novos tipos de operações. Pode ser que feche, pode ser até que feche, mas normalmente é uma loja que está fazendo muita pesquisa, agora mantém só uma unidade por ela mesma é um custo elevado e complexo, ou seja, logístico de compras e operação de tudo", alerta o professor.