Dias após a tragédia do Edifício Andrea, a preocupação com outros prédios de Fortaleza se intensificou. Segundo empresas que prestam serviços de avaliação dos possíveis problemas presentes, a procura pelos serviços nesta primeira semana mais que dobrou.
É o caso Jeab Engenharia e Arquitetura. O engenheiro José Emidio Alexandrino Bezerra, sócio-diretor do negócio, relata que recebia de 10 a 15 consultas por orçamento para inspeção. "Agora, isso mais do que dobrou. As pessoas ficaram apavoradas. Nesse primeiro momento, a demanda cresceu significativamente'', aponta. Ele ressalta, entretanto, que essa procura tende a diminuir ao longo dos dias.
Fábio Fihr, proprietário da Fihr Engenharia, revela que, ainda na terça-feira (15), dia da queda do Edifício Andrea, recebeu quatro ligações solicitando orçamento. "Até então, o mercado estava parado. Isso porque existe a lei com a obrigatoriedade, mas não tem fiscalização. Ninguém estava interessado em fazer. Agora, por conta do medo, há procura", relata o engenheiro. Ele ainda pontua que muitos clientes realizam a inspeção, mas não executam o que está previsto no laudo.
"Muitas vezes, a saúde financeira do condomínio é precária. Há uma dificuldade de arcar com contas do dia a dia por causa da inadimplência e até mesmo má gestão, o que impossibilita a criação de um fundo de reserva para arcar com essas despesas", ressalta.
Gestão
O vice-presidente de condomínios do Sindicato Das Empresas De Compra, Venda, Locação E Administração De Imóveis Do Ceará (Secovi-CE), Wilson Braga, revela que a inadimplência média dos condôminos chega à casa dos 10%. "As convenções obrigam os condomínios a destinarem uma parte da arrecadação ao fundo de reserva, que normalmente é de 5%. Mas esse fundo muitas vezes é usado para a inadimplência", explica.
"Quando se fala em cota extra, o povo já começa a se negar a fazer a prevenção, uma coisa que é óbvio que tem que fazer", alerta. "Quando acontece uma tragédia, o povo passa a ter esse cuidado. Já se olha com outros olhos. Ela é necessária, é gritante a necessidade para isso", diz Braga.
Responsabilidade
O vice-presidente na área imobiliária do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado do Ceará (Sinduscon-CE), José Carlos Gama, esclarece que a responsabilidade pela manutenção predial é dividida entre o fornecedor, no caso a construtora, e o usuário, os moradores.
"No momento da entrega das chaves, é obrigação das construtoras entregarem um manual de garantia contendo as manutenções obrigatórias que precisam ser realizadas, ficando a cargo dos moradores cumpri-las", afirma Gama.
Ele acrescenta que, independentemente da obrigatoriedade da legislação municipal, é preciso haver uma consciência da necessidade da inspeção e manutenção. "O que a lei prevê é a averiguação de problemas e a reparação dos mesmos, ou seja, uma manutenção corretiva. Mas é importante também que haja a manutenção preventiva, para que o edifício não chegue a apresentar problemas mais graves", destaca Gama.
"Infelizmente, são muitos os prédios antigos da Cidade que não deram nenhuma manutenção preventiva e exigem a corretiva sob risco de acontecer um colapso, como foi o caso do Edifício Andrea. Principalmente em áreas como a Praia do Futuro, que possui um dos maiores teores de salinidade maiores do mundo", acrescenta ainda o vice-presidente na área imobiliária do Sinduscon-CE.
Check-up
A sócia-diretora da Arqfor Arquitetura e Consultoria, Isabella Cantal, compara a inspeção predial a um check-up de rotina. "É como se a gente fosse fazer uma bateria de exames para saber se está tudo bem. É tão importante quanto para a saúde do prédio", alerta. Ela também acrescenta que também ocorre dos clientes realizarem apenas a inspeção, mas não realizarem o que está indicado no laudo.
"Não adianta. É como o médico diagnosticar que você precisa de uma ponte de safena e você pegar aquele exame, ir para casa e não fazer nada. A inspeção é o início da prevenção, mas é só a ponta do iceberg", dispara Isabella.
Valores
A sócia-diretora da Arqfor ressalta que os valores da inspeção predial não são absurdos. "Existem vários fatores que influenciam no valor da inspeção. Eu não costumo fazer orçamentos pelo telefone, porque posso ser injusta. Mas não é nada que comprometa o orçamento dos condomínios. As obras de reparação, de fato, é que podem pesar um pouco mais dependendo do que for constatado", esclarece.
Entre as principais variáveis, ela aponta o número de blocos do condomínio, o número de pavimentos, a quantidade de apartamentos, a idade do imóvel, a diversidade da área de lazer e o estado da edificação. "De qualquer forma, os condomínios precisam fazer essa reparação. E eles tem como se programar, porque indicamos no laudo quais as ações mais prioritárias e quais podem esperar um pouco mais, possibilitando essa organização", detalha Isabella Cantal.
Ela alerta, no entanto, para o valor não ser o fator decisivo na hora de escolher qual o profissional ou empresa a realizar a inspeção. "É preciso que as pessoas parem de tratar isso de uma forma leviana. Não dá para contratar profissionais que você não sabe de onde saíram. É necessário pesquisar o histórico dele, saber se tem experiência, se tem referência. Eu perco clientes para a concorrência que cobram valores muito abaixo dos meus. Se alguém cobra muito mais barato que a média, o risco é alto".
Ela aponta que a demanda por orçamentos cresceu cerca de 80% na última semana. "Infelizmente, foi preciso acontecer uma tragédia, que, inclusive, poderia ter sido evitada. Só espero, como cidadã, que o assunto não caia no esquecimento", dispara ainda Isabella Cantal.