A pandemia de Covid-19 tem impulsionado o agravamento de problemas oculares no Ceará. Segundo a Sociedade Cearense de Oftalmologia (SCO), muitas pessoas não estão buscando atendimentos oftalmológicos pelo receio de contaminação com a Sars-Cov-2, o que vem prejudicando a saúde de inúmeros pacientes, levando-os, inclusive, à cegueira em casos graves.
A presidente da SCO, Hissa Tavares, explica que tiveram muitos pacientes - residentes no interior do Estado - que apresentaram dores oculares, baixa visual súbita ou crises de glaucoma agudo e não procuraram assistência médica por medo de infecção. “Às vezes o paciente queria vir e o familiar não deixava também”.
A situação foi percebida ainda pelo diretor clínico do Instituto dos Cegos, em Fortaleza, Alexandre Teles, gerando preocupação, principalmente, a pessoas com doenças crônicas, como glaucoma e retinopatia diabética - complicação que ocorre a partir do excesso de glicose no sangue, prejudicando os vasos sanguíneos da retina.
A gente já tem mais de 1 ano de pandemia e 1 ano faz muita diferença no tratamento desses pacientes, porque às vezes você precisa modificar a medicação ou intervir com algum procedimento”
No âmbito nacional, a conjuntura não tem sido diferente. De acordo com levantamento do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), o Brasil contou com uma diminuição de 1,6 milhão de exames para detecção precoce do glaucoma no Sistema Único de Saúde (SUS) durante a pandemia. Além disso, em média 6,5 mil cirurgias nessa área não foram realizadas pelo SUS em 2020, apresentando queda de 22% se comparadas ao ano anterior.
Glaucoma e Covid-19
A oftalmologista Hissa Tavares destaca que alguns pacientes, que já tinham sido diagnosticados com glaucoma e adquiriram a Covid-19 em determinado momento, notaram o aumento da pressão intraocular, gerando problemas mais graves na visão.
Ninguém sabe se [o aumento] é pelo corticóide ou se é pela reação inflamatória da doença [coronavírus]. E aí junta isso ao fato de não usar a medicação corretamente e tivemos pacientes que evoluíram para a cegueira”
A especialista pontua também que, pelo fato de o glaucoma ser uma doença dinâmica, com interferência de fatores externos, é importante realizar o acompanhamento periódico a cada três ou quatro meses, a depender de cada caso.
“Se você foi ao oftalmologista e ele disse que você precisa voltar daqui a 1 ano, siga a orientação. Se ele passar uma medicação, se ele prescrever um colírio, se ele indicar uma cirurgia, siga a orientação do médico. O problema é que, com a pandemia, isso não aconteceu, muitos pacientes perderam o acompanhamento e podem ter uma progressão da doença”, esclarece Tavares.
Cuidados preventivos
O oftalmologista Alexandre Teles salienta que, além da importância das consultas periódicas ao médico, é interessante manter uma boa saúde em termos gerais. “Com uma dieta equilibrada; usando óculos de sol [caso as pessoas se exponham muito aos raios solares]; a higiene das mãos, não colocar a mão no rosto e nos olhos; o controle da glicemia; e o cuidado com o excesso do uso de telas”.
Excesso esse que é vivenciado de perto pelo estudante e escritor Zeca Lemos, que possui catarata congênita, miopia e hipermetropia.
Com o trabalho e o ensino remoto, eu tenho que passar muito tempo em frente ao computador e a minha vista fica cansada, prejudicada, então eu to precisando voltar ao oftalmologista”
Lemos costuma realizar consultas todos os anos com especialistas, justamente por enfrentar problemas sérios de visão, já tendo passado por duas cirurgias oculares e utilizando óculos de grau desde os seis meses de idade. No entanto, durante a pandemia, a busca pelo atendimento não foi realizada como costumeiramente era.
“Eu senti muitas dificuldades de buscar atendimento médico em oftalmologia nesse período, principalmente pela questão da pandemia, a gente tem medo, né? De sair, de se contaminar e contaminar as pessoas ao nosso redor. Com isso, tenho evitado bastante sair e fui postergando minha consulta”, comenta.
A presidente da SCO, Hissa Tavares, reitera que as consultas periódicas são imprescindíveis, mesmo na situação pandêmica, visto que a ausência delas podem gerar complicações, muitas vezes, sem solução. “Nós, oftalmologistas, trabalhamos em clínicas que não têm internação por Covid-19 na maioria dos casos. Então, não é que sejam locais 100% livres da doença, mas o risco é bem menor”.