Há pouco mais de 50 dias, diversos pontos do litoral dos nove estados nordestinos foram atingidos por uma mancha de petróleo cru cuja origem, até hoje, é desconhecida. No Ceará, pelo menos 15 praias já foram afetadas. Os registros mais recentes foram em Icapuí, no extremo leste do Estado. Na segunda-feira (21), o Instituto Municipal de Fiscalização e Licenciamento Ambiental (Imfla) confirmou a presença do resíduo na Praia de Barreiras. Ontem, outras duas praias também foram atingidas em escala menor: a de Redonda e Ponta Grossa. A Secretaria de Meio Ambiente do Estado (Sema), no entanto, só confirma a presença do óleo misterioso em Barreiras.
Nos dois primeiros dias desta semana, a Marinha recolheu, com o apoio de 60 militares e voluntários, 800 kg de óleo das areias do litoral icapuiense. Hoje, a Sema vai realizar um novo sobrevoo na região, com acompanhamento de navio da Marinha pelo mar, para identificar se as manchas podem atingir outras praias cearenses. "Estamos fiscalizando as áreas constantemente de forma a planejar ações de contenção ou limpeza", explicou Artur Bruno, secretário de Meio Ambiente do Estado.
De acordo com o coordenador do Sindicato dos Pescadores Artesanais de Icapuí, Tobias Soares, a mancha foi "detectada a 6 km da orla". "Os pescadores disseram, pelo rádio, que tem até tartaruga morta no mar", pontuou. O pescado que abastece restaurantes e mercantis da cidade, no entanto, ainda não foi afetado. "O que os pescadores trouxeram hoje está limpo. As gaiolas de pescas também não estavam manchadas", garantiu Tobias, que reside em frente à Praia de Redonda, fronteira com Ponta Grossa.
Corrente solidária
De acordo com o presidente do Imfla, João Paulo Rebouças, que também confirmou a presença das manchas de óleos nas praias de Icapuí, um comitê de gestão de crise foi formado para minimizar os impactos ambientais. Além dos oficiais da Marinhas e funcionários do Município, voluntários somaram força ao trabalho de limpeza da Praia de Barreiras, local onde concentrou a maior quantidade dos resíduos prejudiciais.
Cleiton Alcântara, 32, que mora no Centro do Município, a 7 Km da praia, participa desde o início da semana da retirada de óleo de Barreiras, a primeira a ser atingida. Ele relata que ficou sabendo da mobilização por meio das redes sociais de um amigo e decidiu ajudar. "Entrei em contato com ele, para combinar a ação. Já sou ligado a movimentos de ajuda à natureza, limpeza de praias, replantio de mangue", conta.
O pescador Francisco Edgar Junior também se juntou à corrente solidária formada no litoral de Icapuí. Ele conta que a preocupação com a preservação do meio ambiente é antiga. "Já fiz até um ecoponto para juntar o óleo descartado dos barcos", relata. A preocupação se acentuou, conforme explica, após a informação do vazamento ter sido divulgada. "Tenho uma base de rádio com os pescadores e estou sempre perguntando se eles estão vendo as manchas de óleo", afirma Cleiton.
O fotógrafo Gelton Duarte, 27, que mora em frente à Praia de Barreiras, explica que através de uma página de fotos sobre Icapuí - que mantém na internet - ajudou a mobilizar as pessoas para o trabalho de limpeza. "Os órgãos municipais também contribuíram e algumas ONGs. A Secretaria de Saúde nos forneceu os equipamentos de proteção individual".
Atualmente, a praia está aparentemente limpa, segundo o morador, mas o temor com o surgimento do óleo permanece, principalmente entre os pescadores, pela possível contaminação dos peixes e mariscos, o que prejudicaria a atividade local. "A economia do Município funciona da pesca. As pessoas ficaram bem assustadas, mas agora estamos preparados e se aparecer mais manchas de óleo, a gente se mobiliza rapidamente para conter", afirma.
Impactos
A gravidade da poluição ambiental na faixa praiana pode ser mensurada por números. Desde o dia 2 de setembro até ontem, dia 22, foram recolhidas mais de 600 toneladas de resíduos das praias do litoral nordestino, ao longo dos 2.250 quilômetros afetados pelo óleo, segundo relatórios da Marinha. As manchas de petróleo em praias do Nordeste já atingiram 200 localidades em 78 municípios de 9 estados desde o início de setembro. A substância é a mesma em todos os locais: petróleo cru. O fenômeno tem afetado a vida de animais marinhos e causado impactos nas cidades litorâneas. Pelo menos sete tartarugas já foram encontradas mortas em decorrência do petróleo, conforme a ONG Instituto Verdeluz. Há preocupação em relação ao período de desova de tartarugas, que está se aproximando, principalmente na Sabiaguaba e Praia do Futuro. A origem do material poluente está sob investigação.